Porque é que os preços da habitação sobem e descem?

Penso que é de conhecimento geral que um preço sobe ou desce dependendo da sua escassez e também da procura existente. Se houver mais oferta de determinado produto e menos procura, o preço tendencialmente desce. Se, por outro lado, houver mais procura e menos oferta, o preço tendencialmente sobe.

Como estamos de oferta?

A partir dos dados dos Censos 2021, o INE calculou que, em Portugal, existiam mais de 3,5 milhões de edifícios clássicos habitacionais em Portugal (3.573.416), o que corresponde a quase 6 milhões de alojamentos (5.981.482).

A Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE) conduziu um estudo onde analisou o número de casas por habitante em 50 países e, sobre Portugal, concluiu que, com base na oferta total, é o país com mais casas por cada mil habitantes. Existem quase 6 milhões de alojamentos espalhados por território luso, mas cerca de 750 mil estão vazios.

Se olharmos para Portugal como um todo, há oferta a mais para o potencial de procura. O problema é muitos destes produtos disponíveis não são os produtos imobiliários que satisfazem a real procura de potenciais compradores ou utilizadores.

É por isso que nesta equação o fator “localização” corresponde ainda hoje ao fator mais relevante para a formação de um preço no imobiliário.

É na procura seletiva (principalmente de nova construção), e na escassez de oferta para esta necessidade, que reside o atual cenário de subida de preços. E é esta tendência que, de certa forma, tem impulsionado os preços nos últimos anos e limitado a sua queda, suportando desta forma o mercado imobiliário português, que se encontra num ponto crítico de demasiada sobrevalorização. Segundo a Moody's, hoje, o preço das casas é superior ao valor fundamental da habitação.

O que nos leva a outra convicção que muitas pessoas têm por falta de memória (inclusive alguns profissionais) de que o preço dos imóveis nunca baixa.

Se recuarmos ao período de 2009 até 2014, facilmente provamos o contrário. O mercado residencial verificou uma clara tendência de descida de valor provocada pelo excesso de oferta, mas não só. Aqui entra outra variável importante para construção de preço, que é a capacidade de compra/financiamento.

Neste espaço temporal, a procura tinha produto, interesse e necessidade de compra, mas não tinha nem dinheiro, nem acesso a crédito para o fazer, o que provocou uma reação de descida de preço por parte da oferta, para ser capaz de encontrar o ponto certo da procura.

O excesso de oferta neste período foi, em grande parte, influenciado pelo incumprimento hipotecário, o que levou a que o mercado fosse inundado de produto porque as pessoas, num período de crise nacional, simplesmente não conseguiam cumprir o pagamento das suas prestações porque o seu crédito era demasiado elevado para a sua capacidade financeira.

E hoje?

Segundo dados do INE, os portugueses pediram, em média, 133.792€ para compra de casa em 2022 (em março de 2021 os novos créditos habitação tinham um custo médio de 123.991€, o que significa um aumento de quase 8% em apenas um ano).

Já o Banco de Portugal revelou que em 2022:

- 169 mil pessoas contraíram um crédito à habitação (mais duas mil do que em 2021);

- O valor de crédito contratado foi de 16 mil milhões de euros, 14% superior face ao registado um ano antes;

- Cerca de 11% deste valor foi concedido a estrangeiros onde brasileiros lideraram entre angolanos, norte-americanos, britânicos e franceses;

- Embora a maioria do crédito continue a ser concedido a portugueses, a procura nacional contraiu durante o ano passado (153 mil cidadãos de nacionalidade portuguesa pediram crédito para compra de casa em 2022, menos duas mil pessoas do que em 2021), o que quer dizer que os estrangeiros foram os responsáveis pelo aumento em volume e valor;

- Duas em cada três pessoas que contraíram um crédito à habitação residiam na região Norte e na Área Metropolitana de Lisboa;

- 19% foi contratualizado por pessoas com idade até 30 anos, 61% até 40 anos e 1% foi obtido por pessoas reformadas;

- As pessoas que contraíram crédito habitação trabalhavam maioritariamente por conta de outrem e tinham um nível de escolaridade superior.

- Em 2023 as taxas Euribor continuam a subir para travar a alta inflação na Zona Euro

- A Euribor está em máximos de 2008 entre 3% e 3,6%, o que tem vindo a representar uma escalada do valor a pagar de prestação;

- É de prever que o BCE continue a subir as taxas de juro enquanto a inflação não se situe nos valores de referência (2%);

- A Euribor certamente refletirá estas subidas, o que vai afetar a taxa de esforço das famílias.

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Cenários?

Se a maioria dos portugueses compra a sua habitação através de crédito de taxa variável, com o contínuo aumento do custo das habitações, os portugueses vêem-se obrigados a pedir cada vez mais dinheiro para comprar casa, com um custo cada vez maior de juros.

Se a maioria trabalha por conta de outrem, e se as prestações continuarem a subir muito em relação aos seus rendimentos, simplesmente chegaremos à situação em que não vão conseguir pagar.

Para agravar, por normas de risco bancário, o banco ver-se-á impedido de emprestar, comprometendo o acesso à compra.

Já em relação à procura estrangeira que tem dinamizado este mercado, é notório que o mercado português ainda é barato em relação a outros países. Contudo, se continuar com esta escalada, sem oferecer diferenciação nos benefícios, produto e mesmo serviço, o mais provável é vermos estes players a decidir que não vão pagar (a) mais, o que naturalmente poderá provocar uma descida de preço para produtos que não se encaixem num conceito altamente diferenciador e de valor percebido.

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Haverá alternativas?

Tendo em conta que o produto não aumenta de um dia para o outro, ao dia de hoje só há um caminho possível, baixar preço.

Para além da necessidade de criação e disponibilização de mais produto imobiliário para TODOS os segmentos (e não apenas para um segmento em específico), temos a possibilidade de estimular de forma séria e a mais curto prazo a alternativa do mercado do arrendamento.

Afinal, nem todas as pessoas precisam ou querem ser proprietárias, diria até que a maior parte apenas pretende uma casa para viver e que, por isso, o arrendamento faz ou deveria fazer parte desta equação cumprindo a sua função de equilíbrio.

Contudo, num mercado como o português, que se caracteriza por ser essencialmente hipotecário, sempre que a prestação de um imóvel for inferior à renda de um outro comparável, a tendência será a de compra. Mantém-se a procura pela opção de compra e, consequentemente, continua a alimentar-se o aumento de preços.

O arrendamento é o ponto de equilíbrio que pode funcionar como uma espécie de termostato estabilizador de preços vs necessidades. Em Portugal, este termostato tem vindo a ser desregulado consecutivamente.

Para fazer funcionar esta alternativa, tem de se garantir, em primeiro lugar, maior estabilidade ao nível de leis, maior atratividade para investidores e mais democratização do arrendamento para pessoas que têm de ultrapassar a cultura da posse do bem, a tal ideia falaciosa de que quando compramos um imóvel somos proprietários, quando, na realidade, só o seremos em plenitude após eliminação de qualquer ónus.

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