O desafio de arrendar uma casa

Tive o prazer de recentemente poder contribuir para o livro “67 Vozes por Portugal”, promovido e dinamizado pelo ISCTE Executive Education, onde coordeno e leciono numa Pós-Graduação em Investimentos Imobiliários. Nele, debrucei-me sobre a urgência de se criar, em definitivo, um mercado de arrendamento residencial em Portugal.

Já desde há algum tempo que no nosso país se compram casas. Não se arrendam. E compram-se casas com recurso a crédito. Poucos são os portugueses com disponibilidade monetária para fazer face à compra de habitação própria e permanente, levando-os à necessidade de contrair dívida para o efeito. E perante a (quase) inexistência de um mercado de arrendamento, a alternativa é quase nenhuma.

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Oferta para arrendar escassa

A oferta de casas para arrendar é pequena. O mercado de arrendamento, do lado dos proprietários, encontra-se muito fragmentado e disperso em pequenos investidores/aforradores. Para mais, na conjuntura atual, de taxas de juro historicamente baixas, a opção de aquisição de uma habitação para arrendamento – buy-to-let – torna-se uma interessante alternativa de aforro para muito pequenos investidores.

No entanto, esse conjunto de pequenos investidores não é, de forma alguma, suficiente para se construir a prazo um mercado de arrendamento com dimensão, liquidez e oferta em número suficiente que permita que as rendas caiam no nosso mercado.

Tal como tive oportunidade de referir no livro “67 Vozes por Portugal”, o investimento privado em arrendamento residencial caracteriza-se, fundamentalmente, por ser:

Por estas razões, o investimento em buy-to-let ou se quisermos, num mercado do private rented sector, tem maior impacto – leia-se, mais oferta – quando e se dinamizado e liderado por investidores de maior porte financeiro.

Legislação e fiscalidade desincentivam proprietários

A realidade portuguesa não é convidativa a esse tipo de investimento. Uma legislação que protege fundamentalmente os direitos dos inquilinos e que força o proprietário a fazer o papel que o Estado Português deveria fazer, e uma fiscalidade muito pesada e pouco convidativa ao investimento. Adicionalmente, a instabilidade legislativa e fiscal são uma constante, algo que liga pouco ou quase nada com a tal perspetiva de longo prazo que tipicamente um investidor em arrendamento residencial tem.

Já aqui tive oportunidade de refletir sobre a questão do arrendamento, do ponto de vista do arrendatário. No final, a opção entre arrendar e compra é uma questão (também) financeira e é necessário fazer contas.

Claro está que o mercado residencial português tem outro tipo de necessidades no que respeita à acessibilidade na habitação. Nem todas passam pela criação de um mercado de arrendamento. A oferta pública de habitação para segmentos de mercado mais carenciados é também uma urgência.

No entanto, para todos os outros, sem uma ideia clara, estruturante e de longo prazo, sem um pacto legislativo e fiscal que criem estabilidade, mas sobretudo previsibilidade junto dos players de mercado, arrendar uma casa continuará a ser um desafio para muitos portugueses. A opção de compra com recurso a crédito continuará a ser (quase) a única que muitos terão.

Bons negócios (imobiliários)!

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