Quer renegociar créditos? Saiba o que deve fazer

A rápida e acentuada subida das taxas de juro a que temos assistido tem, como é natural, um impacto negativo na saúde financeira das famílias. O maior impacto sente-se nos contratos de crédito habitação indexados à Euribor, nos quais as prestações aumentaram várias centenas de euros nos últimos meses. Assim, um dos caminhos a considerar para aliviar o peso da fatura mensal é renegociar o crédito.

Saiba para o que deve olhar e quais as opções que tem para conseguir baixar a taxa de esforço e dar uma nova vida ao seu orçamento.

Peça o seu mapa de responsabilidades de crédito

Será que sabe qual a real situação de todos os seus créditos? Quantos são? Quanto tempo falta para o final e quanto ainda tem de pagar? As respostas podem ser encontradas no Mapa de Responsabilidades de Crédito. Este documento, emitido pelo Banco de Portugal, pode ser acedido diretamente no site do regulador, usando os dados de acesso ao Portal das Finanças.

Este mapa é atualizado regularmente com base nas informações disponibilizadas pelas instituições financeiras nas quais tem contratos de crédito.

Analise o mapa

No momento em que pede o Mapa de Responsabilidades de Crédito obtém dois mapas:

Nota: o montante potencial não é um valor efetivamente em dívida, embora possa vir a sê-lo, no futuro, caso seja utilizado. Está, geralmente, associado aos cartões de crédito.

Ao pedir e analisar este mapa, conseguirá ter uma visão muito mais abrangente dos seus créditos e das suas responsabilidades financeiras. Desta forma, estará mais bem preparado para renegociar o crédito com o banco.

Leia ainda: Mapa de Responsabilidades de Crédito: O que é e para que serve?

Perceba quanto está a gastar

Depois de saber quanto está a gastar com os créditos, é hora de calcular a sua taxa de esforço. Estas são as contas que lhe vão permitir saber o peso que os créditos têm no seu orçamento. No caso dos créditos habitação, a taxa de esforço ideal não deve ultrapassar os 30%. Se tiver mais créditos, recomenda-se que a fatia destinada ao pagamento das prestações seja, no máximo, de 50%.

Mas como é que se fazem estes cálculos? Simples: basta dividir o valor total das prestações pelo rendimento mensal líquido do agregado familiar. Depois, é só multiplicar o resultado por 100 para obter o valor em percentagem.

Além de lhe permitir saber quanto está a gastar, o cálculo da taxa de esforço vai ajudar a perceber qual o valor máximo que pode dedicar ao pagamento das prestações. Vejamos o exemplo de um agregado familiar com um rendimento mensal líquido de 2.500 euros. Caso queira pedir apenas um crédito habitação, esta família sabe que a prestação não deve ultrapassar os 750 euros (30% de 2.500).

Quando quiser negociar outros créditos, como um crédito automóvel ou um crédito pessoal, o limite sobe para 1.250 euros (50% do rendimento líquido mensal).

Ainda assim, lembre-se de que estes são valores máximos. Ou seja, uma eventual subida dos juros e consequente aumento das prestações coloca a taxa de esforço acima dos valores recomendados.

Não se esqueça das outras despesas mensais

Embora não sejam usadas para calcular a taxa de esforço na concessão e renegociação de créditos, é importante que tenha uma ideia do peso de todas as suas despesas. Assim, faça também uma análise que inclua os outros gastos fixos mensais, como a eletricidade, a luz, a água, as telecomunicações, os combustíveis, a alimentação ou a educação dos filhos.

Quanto mais completo for o seu orçamento, mais preparado vai estar para renegociar o crédito e escolher a opção mais vantajosa.

Renegociar crédito: as suas opções

Depois de ter feito as contas relativas às suas despesas, deve falar com o seu banco para tentar renegociar o crédito e reduzir os encargos com as prestações. Entre as condições que pode tentar alterar encontram-se: 

Imagine que tenta negociar uma redução do spread de um crédito de 150 mil euros com uma taxa de juro (spread+indexante) de 2,5% e com 360 meses ainda em falta. Se conseguir baixar a taxa de juro para 2%, poupa cerca de 38 euros na prestação mensal.

Já se tentar renegociar o prazo do indexante, por exemplo, tenha em conta a média mensal da taxa Euribor. O indexante contratado a 12 meses garante-lhe mais estabilidade ao longo de um ano, mas pode sentir um aumento maior no momento da revisão. Por outro lado, com a Euribor a três e seis meses os aumentos vão ser mais suaves, embora mais frequentes.

Alargar o prazo do empréstimo é outra solução. Embora signifique um maior encargo com juros no período total do contrato, permite aliviar a prestação mensal no imediato e dar uma nova folga ao orçamento.

Existe ainda outra possibilidade: renegociar os produtos associados ao seu crédito habitação, tais como o seguro de vida ou o seguro multirriscos. A maioria dos bancos concede uma bonificação no spread quando os cliente contratam os seguros juntamente com o crédito. Ainda assim, pode mudar de seguradora a meio do contrato. Quem sabe se a poupança no seguro não compensa um eventual aumento no spread?

Leia ainda: Renegociar crédito habitação: 5 situações em que deve fazê-lo

Os documentos a apresentar para renegociar o crédito

Há um conjunto de documentos base que deve apresentar quando quiser renegociar o crédito habitação. São eles:

Tem vários créditos? Pondere consolidar

Se tem, pelo menos, dois créditos pessoais, além do crédito habitação, a renegociação pode passar pela consolidação. Neste cenário, junta todos os seus créditos num só e paga uma única prestação. Como, por norma, a taxa de juro num crédito consolidado é mais baixa do que a média das taxas que pagava nos outros créditos, o valor a pagar mensalmente é mais baixo.

Dependendo das condições que conseguir acordar com o seu banco, pode conseguir poupar até 60%.

Leia ainda: O que é uma consolidação de créditos?

Medidas extraordinárias

Até ao final de 2023, estão em vigor medidas extraordinárias para mitigar o efeito da subida das taxas de juro. Os bancos têm, agora, um conjunto de obrigações adicionais na implementação do Plano de Ação para o Risco de Incumprimento (PARI). Além disso, os clientes podem pedir a bonificação dos juros do crédito habitação.

Bancos com mais obrigações na implementação do PARI

O Plano de Ação para o Risco de Incumprimento (PARI) já não é uma novidade, mas até 31 de dezembro de 2023 as instituições de crédito têm mais obrigações na sua implementação. De acordo com o decreto-lei, os bancos devem avançar para a renegociação dos contratos de crédito habitação sempre que detetarem um “agravamento significativo da taxa de esforço” ou uma “taxa de esforço significativa” por parte dos clientes.

Estas medidas aplicam-se apenas aos contratos de crédito para compra ou construção de habitação própria permanente, associados a uma taxa de juro variável e com valor em dívida até 300 mil euros.

Assim, os bancos devem apresentar propostas de renegociação de crédito até 15 dias após o cliente ter facultado as informações e os documentos solicitados. As soluções apresentados podem passar por:

Os bancos têm a obrigação de acompanhar a situação dos clientes, mas se sentir que está prestes a entrar em incumprimento, deve alertar a instituição de crédito. Desta forma, a renegociação do crédito no âmbito do PARI começa mais cedo e evita consequências mais graves.

Leia ainda: Regras de renegociação do crédito habitação já estão em vigor

Bonificação dos juros

Os cliente que reúnam as condições necessárias podem aceder à bonificação dos juros do crédito habitação. Esta medida aplica-se aos contratos de crédito para aquisição, obras ou construção de habitação própria permanente:

O valor da bonificação depende dos rendimentos dos clientes, mas não pode ser superior a 720,64 euros por ano.

Leia ainda: Como ter acesso à bonificação dos juros no crédito habitação?

Está em incumprimento? Tem de renegociar através do PERSI

Quando os clientes deixam de conseguir pagar as prestações e entram em situação de incumprimento, ficam sujeitos ao pagamento de juros de mora, comissões e outros encargos. No limite, a instituição de crédito pode recorrer aos tribunais e iniciar uma ação judicial para recuperar o crédito. Este cenário pode até levar à penhora dos rendimentos e à venda dos bens do cliente com prestações em atraso.

Contudo, existe uma solução para evitar que se chegue a esta situação extrema: a integração no Procedimento Extrajudicial de Regularização de Situações de Incumprimento (PERSI). O objetivo é renegociar o crédito e encontrar soluções de pagamento que evitem o recurso aos tribunais.

As instituições de crédito têm a obrigação de integrar o clientes no PERSI nas seguintes situações:

O banco deve avisar o cliente no prazo máximo de cinco dias após a integração no PERSI. Se a instituição de crédito verificar que a pessoa reúne capacidade para resolver a situação de incumprimento, apresenta um conjunto de propostas. Estas podem ser as mesmas do PARI, tais como o alargamento do prazo de pagamento ou a redução da taxa de juro durante um determinado período.

Contudo, a integração no PERSI não é um dado adquirido, estando dependente da análise que o banco fizer da sua situação financeira. Ainda assim, se for integrado, saiba que a instituição de crédito não pode resolver o contrato de crédito com fundamento no incumprimento, agir judicialmente contra si ou ceder o crédito a terceiros.

Além disso, não lhe podem ser cobradas comissões e a taxa de juro do contrato não pode ser agravada em consequência de uma renegociação no âmbito do PERSI.

Leia ainda: Incumprimento: Novas regras reforçam prevenção e apoio ao consumidor