As estatísticas que deve conhecer para investir em ações

As bolsas tendem a registar desempenhos mais positivos em períodos de cortes de juros e antecipam em vários meses a inversão do ciclo económico.

Rendibilidades passadas não constituem garantia de rendibilidades futuras. É recomendável que o investimento em ações seja efetuado numa lógica de longo prazo e com base em indicadores fundamentais. Ainda assim, as estatísticas que mostram o desempenho histórico das ações face a determinados ciclos, eventos e padrões representam uma importante ferramenta para o investidor adotar as melhores decisões.

A análise à evolução histórica das ações é, por isso, um complemento relevante que deve ser tido em conta pelos investidores. Não é por acaso que muitos profissionais dos mercados (traders, gestores de ativos, analistas, economistas, etc.) são ávidos por informação estatística. Que utilizam para delinear estratégias de investimento e efetuar recomendações.

É em Wall Street que o foco nas estatísticas atinge o ponto mais alto. Nos Estados Unidos existem sites dedicados a estudar os padrões dos mercados, com estatísticas para todos os gostos. Das mais úteis, até às mais bizarras e que provam ter pouca (ou nenhuma) utilidade.

Existem diversos estudos que tentam encontrar um efeito dos dias comemorativos (como o Dia dos Namorados) ou eventos desportivos (Super Bowl ou campeonato do mundo de futebol) no rumo dos mercados. Mesmo que sirvam para produzir notícias com títulos apelativos, o impacto é muitas vezes efémero e irrelevante, pelo que o melhor é serem ignoradas pelos investidores.

Também são muito habituais as estatísticas relacionadas com o dia da semana, o mês ou o ano. As sextas-feiras são vistas como as mais arriscadas para investir (devido aos eventos que podem decorrer no fim-de-semana), mas as evidências estatísticas mostram que a diferença de resultados para os outros dias é insignificante.

Setembro é o pior mês

No que diz respeito ao desempenho mensal, as estatísticas são mais relevantes. Setembro é claramente o mês com pior desempenho no S&P500, com um retorno médio de -1,1% nos quase 100 anos de história deste índice norte-americano. Fevereiro e maio também são negativos, sendo que julho se destaca pela positiva (+1,7%), tal como abril e dezembro, igualmente com um desempenho favorável (+1,3%).

Há uma outra tendência estatística com bastante destaque em Wall Street, que é conhecida por Barómetro Janeiro e que mostra que há uma correlação muito forte entre o desempenho das ações em janeiro e no acumulado do ano. Tendo por base dados desde 1938, quando o S&P500 valoriza em janeiro, alcança ganhos médios de 11,6% nos 11 meses seguintes. Se desvaloriza no primeiro mês do ano, a variação média no acumulado dos 11 meses seguintes é de apenas 1,2%. A variação dos anos em que janeiro terminou em alta supera em 10,4% o desempenho dos anos em que o primeiro mês teve um saldo negativo.

Para muitos investidores, estas estatísticas não passam de curiosidades. Mas há outras que são muito relevantes, sobretudo por demonstrarem de forma bem clara que as ações são a classe de ativos mais atrativa para quem investe numa perspetiva de longo prazo.

Estudos com diferentes metodologias e amplitudes temporais coincidem na conclusão de que o S&P500 gerou um retorno médio anual (sem dividendos) em torno de 10% nas últimas décadas. Descontando a inflação, o ganho anual é superior a 6%. Tendo em conta apenas os últimos 20 anos, o retorno médio anual é de 10,2% e nos últimos 10 anos sobe para 13%. No caso do índice europeu Stoxx600 o desempenho é menos favorável, mas continua a ser atrativo: 7,7% desde a criação em 1986.

Para quem pretende investir em ações num prazo longo, são estas as estatísticas que interessam, por evidenciarem que é uma escolha acertada apostar no mercado acionista se aplica o dinheiro numa estratégia com um horizonte temporal a cinco ou mais anos. Não é garantido que obtenha resultados positivos, mas a probabilidade é muito elevada.

Existem mais estatísticas que os investidores de longo prazo devem conhecer, sobretudo as que estão relacionadas com os ciclos que mais influenciam o desempenho das ações: política monetária e atividade económica.

Descidas de juros favorecem ações

A Reserva Federal dos Estados Unidos (Fed), o Banco Central Europeu e outros bancos centrais deverão iniciar este ano um ciclo de descida das taxas de juro, invertendo o forte agravamento da política monetária implementado desde 2022 para combater a inflação elevada. Uma tendência que abre perspetivas positivas para o desempenho das ações.

Tendo em conta os últimos nove ciclos de alívio da política monetária que a Fed efetuou desde 1985, o S&P500 registou uma valorização média de 5,1% nos primeiros três meses após o corte de juros inicial. Um desempenho que duplica o retorno médio “normal” do índice a três meses (entre 2% a 2,5%). 

Alargando a análise aos 12 meses subsequentes, um estudo da gestora de ativos Schroders mostra que o S&P500 regista uma valorização média real (descontada de inflação) de 11%, o que se situa acima da média habitual (independente do ciclo da política monetária). Contudo, há uma nuance que faz toda a diferença nesta análise. Quando no ciclo de descida de juros não surge uma recessão, o retorno do índice norte-americano (+17%) duplica a variação positiva registada quando se verifica uma recessão nos 12 meses após o primeiro corte de juros (8%).

As descidas de juros são positivas para as ações pois representam custos de financiamento mais baixos para empresas e famílias, o que potencia o consumo, o investimento e os resultados das companhias. Além disso, também reduz o prémio de risco do investimento das ações, o que reforça a atratividade desta classe de ativos.

Contudo, é nos períodos de pausa após um ciclo de agravamento de juros que se verificam os ganhos mais acentuados. Tendo em conta os últimos seis ciclos, o S&P500 regista uma valorização média de 16,8% nos 12 meses após a última subida de juros, o que supera largamente o retorno médio anual em todo este período (12%).

O comportamento recente da bolsa norte-americana valida esta tendência, evidenciando que os mercados antecipam que depois de terminado o ciclo de subida de juros, virá um novo ciclo de alívio. A Fed subiu os juros pela última vez a 26 de julho de 2023, dia em que o S&P500 negociava nos 4.566 pontos. Desde então, registou uma valorização de 9%, tendo inclusive atingido máximos históricos. A tendência também se verifica no caso do BCE, que subiu os juros pela última vez a 20 de setembro. O Stoxx600 marca uma valorização de 5,5% desde então

Importa também mostrar o que acontece quando os bancos centrais sobem os juros. A principal conclusão é a de que a reação negativa surge sobretudo na fase inicial do ciclo, mas as ações tendem a recuperar posteriormente, à medida que os investidores começam a antever que o agravamento da política monetária está perto do fim.

Dados da corretora Evercore ISI mostram que o S&P500 regista uma desvalorização média de 4% no mês posterior à primeira subida de juros. Quando este ciclo chega aos seis meses o desempenho já é positivo (+3%), sendo ainda mais elevado ao fim de 12 meses (+5%). A velocidade com que é efetuada a subida das taxas de juro também faz toda a diferença. Em ciclos agressivos da Fed o S&P500 desvaloriza 2,7%, enquanto nos ciclos em que o banco central sobe os juros de forma lenta o índice valoriza 11%.

Leia ainda: Descida de juros do BCE: Qual o impacto para as famílias?

Mercados antecipam fim das recessões

O desempenho das ações consoante o ciclo da atividade económica também é muito relevante para os investidores e, como seria expectável, os dados estatísticos mostram que em períodos de recessão económica as bolsas tendem a apresentar um desempenho inferior aos ciclos de expansão económica. 

De acordo com a Bloomberg, em todas as recessões que se verificaram nos Estados Unidos desde 1929, as ações em Wall Street reagiram de forma negativa, levando os índices a atingirem mínimos após o início da contração económica. Segundo a CFRA Research, nas oito recessões que aconteceram desde 1990, o S&P500 registou uma desvalorização média de 8,8%. Contudo, os retornos foram positivos em metade dos 13 anos com recessão desde a II Guerra Mundial e a valorização média foi de 1%.   

Pode parecer surpreendente que as bolsas valorizem durante recessões, mas este comportamento é explicado pela tendência de os mercados anteciparem a evolução da economia, pelo que começam a recuperar bem antes do fim da evolução negativa. Tipicamente, o S&P500 atinge o ponto mais baixo nove meses depois do início da recessão e quatro meses antes desta terminar. E atinge o ponto mais alto sete meses antes de iniciar o período de contração.

Por outras palavras, o pior para os mercados já passou quando a economia ainda está a contrair. E o movimento negativo das bolsas inicia bem antes de começar a recessão. Daí que a evolução dos mercados financeiros seja um poderoso indicador avançado do que se passa na economia. 

Ajustar as estratégias de investimento a estes comportamentos habituais dos mercados mediante a fase do ciclo da política monetária e do ciclo económico pode ser um fator decisivo para alcançar resultados mais positivos. Tendo sempre em conta que cada momento dos mercados financeiros tem as suas especificidades e os preços dos ativos são influenciados por uma série de variados fatores.

Leia ainda: Estão os investidores demasiado otimistas para 2024?

Nasceu em 1977, sendo jornalista desde 1999. Iniciou a carreira no Jornal de Negócios, onde esteve mais de 20 anos, ocupando várias funções, sempre com foco no online. Atualmente é jornalista independente, assina a newsletter diária de mercados Morning Call e colabora de forma regular com o ECO. Formado em Gestão no ISEG, tem especial interesse por tudo o que está relacionado com os mercados financeiros.

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