Casal com filha feliz

O ranking da felicidade mundial baseia-se na já citada escala de Cantrill. Os participantes no estudo respondem a uma simples questão, que todos podemos colocar a nós mesmos: «Por favor imagine uma escada com degraus numerados, com o 0 em baixo e o 10 no cimo. O topo da escada representa a melhor vida possível para si e a parte inferior da escada representa a pior vida possível para si. Em que degrau da escada diria que, neste momento, sente que está?»

A opção por esta pergunta passou por ser «democrática e universal», pois a Escada de Cantrill acaba por possibilitar que sejam as pessoas a fazerem a avaliação do que é mais importante para elas, independentemente da sua cultura ou origem. Além disso, a pergunta acaba por ser facilmente traduzida e compreendida em diferentes línguas, uma vez que não menciona conceitos como felicidade, bem-estar ou satisfação.

Ranking Felicidade

O PIB sim, mas também a generosidade ou a liberdade

Ao longo dos anos, um conjunto de peritos independentes tem avaliado os dados recolhidos no âmbito do inquérito mundial realizado pela Gallup. A amostra costuma incluir, em média, mais de 100 mil respostas e mais de 140 países. A combinação dos dados dos três últimos anos serve para apresentar uma estimativa mais robusta e rigorosa para cada país.

Além do ranking, o relatório anual tem explorado a relação de vários temas associados à felicidade, como a idade, o género, as gerações, a migração ou a benevolência. Na edição publicada em 2025, o foco centrou-se «no impacto do cuidar e da partilha na felicidade das pessoas». Logo na introdução, dizem-nos que cuidar de alguém tem um benefício duplo, pois «abençoa aqueles que dão e aqueles que recebem».

Mas o que mais capta as atenções, claro, são os resultados do índice de felicidade dos vários países. O modelo económico usado pelo relatório, que recorre a equações que vêm sendo afinadas desde 2005, inclui seis variáveis:

– Ter alguém com quem se possa contar

– PIB per capita

– Esperança de vida com saúde

– Liberdade para fazer escolhas de vida

– Generosidade

– Ausência de corrupção

Distopia, um terrível país inventado

A escolha destes seis fatores passou por, tendo em conta o conhecimento acumulado até ao presente, serem estas as variáveis que melhor poderiam explicar as diferenças entre os países, em termos da avaliação que os seus habitantes fazem da vida que levam. Por vezes notam-se até correlações bidirecionais. Eis uma: «As pessoas saudáveis são geralmente mais felizes, mas as pessoas felizes são geralmente mais saudáveis.»

Curiosa é a utilização de um país imaginário como comparativo dos países reais. Na nação que se intitulou Distopia (por oposição à utopia), os rendimentos são os mais baixos, a esperança de vida é a mais curta, a generosidade é a mais baixa, a corrupção é a maior do mundo, a liberdade é quase inexistente e o apoio social quase nulo. Diga-se que nunca nenhum país verdadeiro registou piores resultados do que este estado onde, a existir, «a vida seria muito desagradável». O Afeganistão, especialmente para as mulheres, tem sido o país que mais se tem aproximado da tenebrosa vida no imaginado Distopia.

Mas como é que os nórdicos podem ser os mais felizes?

Entre os dados globais, salta à vista a tendência para que os países com menor população (menos de 15 milhões de habitantes) sejam mais felizes do que os países grandes. «Em média, as pessoas destas nações mais pequenas têm maior esperança de vida e um PIB per capita mais elevado. Também enfrentam menos corrupção e têm uma maior probabilidade de poderem contar com alguém nas alturas mais difíceis», explica-se na secção de perguntas mais frequentes. Mas, no sentido inverso, nota-se uma menor frequência de atos benevolentes nos países mais pequenos.

O website do World Happiness Report também aborda uma questão que costuma ser especialmente acarinhada pelos portugueses: o clima. Será que isso do sol e calor, afinal, tem impacto na sensação de felicidade? Para os especialistas envolvidos no estudo, os efeitos da meteorologia na felicidade são diminutos. Por exemplo, os países escandinavos não têm um clima tropical, mas aparecem de forma constante no topo do ranking. A explicação? «Embora os seus invernos sejam escuros e frios, isso acaba por ser em parte compensado pelos longos dias de verão.» Os investigadores referem igualmente que as pessoas que vivem nos trópicos costumam ser mais felizes no inverno, mas menos felizes durante a primavera, quando comparadas com as pessoas que vivem em zonas mais temperadas. No fundo, as pessoas costumam adaptar-se aos padrões sazonais do sítio em que vivem. E quem estiver bem-adaptado ao clima local, quem gerir melhor as expectativas em relação aos dias chuvosos ou ensolarados, não sentirá grandes efeitos da meteorologia em termos da satisfação com a sua vida.

A relação entre antidepressivos e índices de felicidade

Também importante é a desmistificação das taxas de suicídio nos países escandinavos, que aparentemente poderiam contrariar as posições cimeiras no ranking da felicidade. Segundo as informações no dito website, as taxas de suicídio nestes países eram relativamente altas na década de 1980. Mas, desde então, têm conhecido uma descida acentuada, mostrando-se agora próximas da média europeia e semelhantes às taxas de países como a França, a Alemanha ou os Estados Unidos. E quanto à subida acentuada do uso de antidepressivos em muitos países europeus, ao longo dos últimos 20 anos, os investigadores não associam essa tendência a mudanças nos níveis de satisfação com a vida. Entre as possíveis explicações para este aumento, apontam-se «a diminuição do estigma em relação às doenças mentais, o desenvolvimento de novos tratamentos e as alterações das normas clínicas».

Segundo estes princípios, o facto de Portugal ser um país com taxas elevadas de utilização de antidepressivos e ansiolíticos não deveria ser impeditivo de uma boa classificação no ranking da felicidade. Mas, tudo somado, seremos um país líder nisto de nos sentirmos satisfeitos com a nossa vida? Na classificação de 2024, a lista incluiu 147 países. Acham que temos alguma hipótese de sermos coroados campeões do mundo da felicidade?

A resposta no próximo e último capítulo desta incursão nos índices de felicidade do nosso planeta.

Leia ainda: Campeonato do mundo da felicidade – Parte I

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