O enquadramento das pequenas empresas no regime especial de isenção de IVA tem vindo a evoluir no contexto da União Europeia, com o objetivo de simplificar obrigações fiscais e reduzir encargos administrativos para microempresas e empreendedores.
Em Portugal, esta evolução reflete-se no novo artigo 53.º do Código do IVA (CIVA), revisto pelo Decreto-Lei n.º 35/2025, de 24 de março, que entrou em vigor em 1 de julho de 2025.
Este diploma transpõe parcialmente a Diretiva (UE) 2020/285 e a Diretiva (UE) 2022/542, harmonizando a aplicação do regime de isenção em território nacional e no espaço europeu. O novo regime traz profundas alterações ao atual artigo 53.º do CIVA, tanto na elegibilidade como nas obrigações, abrangendo contribuintes nacionais e sujeitos passivos estabelecidos noutros Estados-membros.
Neste artigo, apresentamos uma análise das novas regras, as suas implicações práticas e disposições transitórias.
Regime especial de isenção de IVA: Quais os objetivos da reforma?
A transposição das diretivas europeias teve como principais objetivos:
- Uniformizar os regimes de isenção para pequenas empresas na UE;
- Reduzir os encargos administrativos suportados pelos pequenos operadores económicos;
- Estimular o crescimento e a competitividade das pequenas empresas, especialmente no comércio transfronteiriço;
- Garantir o cumprimento do princípio da neutralidade fiscal.
O novo artigo 53.º do CIVA representa um passo importante na construção de um sistema mais justo, simplificado e eficaz para os pequenos operadores, respeitando ao mesmo tempo os compromissos europeus em matéria de harmonização fiscal.
O que mudou?
O novo artigo 53.º altera de forma relevante os critérios de aplicação do regime especial de isenção no plano nacional, nomeadamente:
1. Eliminação de Restrições Anteriores
Passam a poder beneficiar do regime:
- Sujeitos passivos com contabilidade organizada (anteriormente excluídos);
- Sujeitos que realizem importações;
- Sujeitos que efetuem transmissões de bens ou prestações de serviços mencionados no Anexo E do CIVA.
Com estas alterações, o regime passa a abranger um universo mais amplo de operadores, incluindo empresas com maior complexidade contabilística.
2. Modificação dos limiares e obrigações
O novo limiar geral mantém-se em 15.000 euros de volume de negócios anual, mas com um novo mecanismo de controlo:
- Se, no decurso do ano civil, for ultrapassado 25% acima do limiar (ou seja, 18.750 euros), o sujeito passivo é obrigado a alterar o enquadramento para o regime normal de IVA, sendo que a fatura que ultrapassa esse valor já deverá incluir IVA.
Esta nova regra vem colmatar uma lacuna do regime anterior, evitando o prolongamento injustificado do enquadramento em isenção após o limiar de tributação ter sido significativamente ultrapassado.
Prazos de transição e declaração de alterações
Com a entrada em vigor do novo regime, prevê-se a seguinte transição:
- Sujeitos passivos atualmente no regime normal, mas que reúnam as condições do novo artigo 53.º, podem optar pela isenção a partir de 1 de julho de 2025;
- Sujeitos passivos no regime especial, mas que ultrapassem os 18.750 euros de volume de negócios no primeiro semestre de 2025, são obrigados a transitar para o regime normal a partir da mesma data.
A entrega da declaração de alterações em virtude de ultrapassagem do limiar de 15.000 euros (mas sem chegar aos 18.750 euros) passa a ter de ser efetuada no prazo de 15 dias úteis após o final do ano em que o volume de negócios foi ultrapassado. As operações deixam de estar isentas a partir de 1 de janeiro do ano seguinte.
Aplicação a sujeitos passivos de outros Estados-membros
Uma das mais importantes inovações introduzidas pelo novo regime é a possibilidade de sujeitos passivos com sede ou domicílio noutros Estados-membros poderem beneficiar da isenção em território nacional. Para tal, devem:
- Reunir os requisitos legais previstos para o regime especial de isenção aplicável em Portugal;
- Ter um volume de negócios anual na UE inferior a 100.000 euros;
- Proceder à notificação prévia junto da administração tributária do Estado-Membro da sede ou domicílio;
- Obter um número de identificação fiscal com o sufixo «EX».
Este mecanismo visa facilitar a atividade de pequenas empresas estrangeiras no mercado português sem que estas estejam sujeitas, à partida, às obrigações de liquidação e reporte de IVA.
Isenção noutros Estados-membros por sujeitos passivos portugueses
Em contrapartida, as pequenas empresas com sede em Portugal, desde que tenham um volume de negócios na UE inferior a 100.000 euros, passam a poder beneficiar do regime de isenção noutros Estados-membros, relativamente às operações aí realizadas. No entanto, devem:
- Cumprir os limiares nacionais estabelecidos pelos Estados-membros onde atuam;
- Solicitar a aplicação do regime junto das respetivas autoridades tributárias.
Esta alteração elimina um entrave importante ao comércio intra-UE por parte das microempresas nacionais e representa um ganho em termos de competitividade e simplificação.
Regime transitório: O que deve ser feito em 2025
O ano de 2025 será especialmente relevante para os sujeitos passivos que:
- Se encontram atualmente enquadrados no regime de isenção;
- Estão próximos dos novos limiares de volume de negócios;
- Pretendam beneficiar da isenção noutros Estados-membros ou vice-versa.
Para estes operadores, é essencial:
- Acompanhar com rigor o volume de negócios do primeiro semestre de 2025;
- Adaptar os sistemas de faturação e contabilidade à nova realidade legal;
- Consultar a AT e o Ofício Circulado n.º 25062/2025 para garantir conformidade.
Disposições que se mantêm inalteradas
Apesar das alterações, permanecem inalterados alguns aspetos fundamentais:
- A obrigação de não liquidar IVA nas operações abrangidas pelo regime;
- A menção obrigatória na fatura de que o regime de isenção é aplicável nos termos do artigo 53.º do CIVA;
- A exclusão do direito à dedução de IVA suportado nas aquisições;
- A não obrigatoriedade de submissão de declarações periódicas de IVA enquanto vigorar a isenção.
Considerações finais
A reformulação do artigo 53.º do CIVA a vigorar em 2025 representa uma modernização significativa do regime especial de isenção de IVA, alinhando-o com as diretivas europeias e proporcionando maior equidade e simplicidade fiscal às micro e pequenas empresas.
Contudo, as novas regras exigem atenção redobrada na gestão dos limiares de volume de negócios, na entrega de declarações de alterações e na eventual necessidade de aplicação simultânea de regimes em diferentes Estados-membros.
Recomenda-se que os empresários e contabilistas certificados:
- Analisem cuidadosamente o novo enquadramento legal;
- Atualizem os procedimentos internos e sistemas informáticos;
- Monitorizem a evolução das orientações técnicas da Autoridade Tributária.
