Finanças pessoais

Nós e a crise

Com tanta celeuma sobre o clima económico que se vive nos últimos tempos, dedico o artigo de hoje a falar do impacto desta crise no dia-a-dia das famílias.

Finanças pessoais

Nós e a crise

Com tanta celeuma sobre o clima económico que se vive nos últimos tempos, dedico o artigo de hoje a falar do impacto desta crise no dia-a-dia das famílias.

Com tanta celeuma sobre o clima económico que se vive nos últimos tempos, dedico o artigo de hoje a falar do impacto desta crise no dia a dia das pessoas.

O que já se sente

Bem, os portugueses já sentiram diferenças.

Quem faz as compras de supermercado seguramente notou que, de há um ano para cá, houve vários preços, sobretudo alimentos, que subiram um pouco mais que o habitual.

Da mesma forma tem-se assistido a aumentos consecutivos nos preços dos combustíveis o que normalmente implica aumentos em tudo.

As bolsas têm caído. Só nos primeiros meses do ano o PSI20 chegou a perder quase 1/3 do seu valor.

À conta da subida dos preços o Banco Central Europeu aumentou as taxas de juro (é uma das formas de manter a inflação controlada e evitar que os preços disparem ainda mais) e, à semelhança do que se passou nos EUA, os níveis de incumprimento no pagamento de créditos têm vindo a aumentar.

O número de casas à venda em hasta pública aumentou e, estando o mercado imobiliário cheio de casas a preços baixos, o valor das propriedades tem diminuido também (quem quer vender vê-se forçado a baixar o preço para arranjar quem compre).

Mas não foi assim que tudo começou nos EUA?

Nada que se pareça. Começando pela crise do crédito:

  • O nível de incumprimento dos créditos, apesar de ter aumentado mantém-se em valores considerados normais e mesmo abaixo do habitual para tempos ditos de crise. Para além disso, o crédito habitação de alto risco, que foi o que despoletou toda esta situação nos EUA, não tem muita tradição em Portugal. Os bancos simplesmente não emprestam nestes casos, pelo menos a totalidade do valor do imóvel. Ou seja, mesmo quando emprestam, e mesmo que este desvalorize um bocado o banco consegue sempre ir buscar a maior parte do dinheiro de volta.
  • É verdade que no ano passado se chegou a falar de aumentos de 5%, 10% e mesmo 20% em alguns produtos básicos. Isto deveu-se ao reflexo das súbitas subidas no mercado internacional. No entanto, a inflação em Portugal está actualmente bem abaixo da média europeia, o que significa que não estamos assim tão mal como isso. (não me vou perder a falar sobre os combustíveis - esses davam direito a um artigo só por si e este já vai ser grande quanto baste)
  • Em Portugal ainda não há muita gente com perfil de investidor de alto risco. As "fugas" de dinheiro de uns produtos para outros não têm um impacto tão abrangente como noutros mercados ditos mais maduros. Claro que isso não impediu que a bolsa descesse e bem.
  • Esta crise é sobretudo financeira. Claro que abalos no sistema financeiro têm repercussões na vida de cada um, mas mesmo nos EUA quem está a sofrer, pelo menos para já, são sobretudo as instituições, não as pessoas (não quer dizer que não haja casos de americanos a perder muito da noite para o dia. Mas não é, para já, a situação geral)

Então e as falências dos bancos?

Bem, em primeiro lugar, os nossos bancos não têm grandes relações com os bancos americanos. Algumas perdas houve, sem dúvida, mas nada de muito significativo. Pelo que, para já, não estão em risco.

As nossas regras também são diferentes. As seguradoras, por exemplo, são obrigadas a ter os seus activos cá em Portugal para suportar os seus negócios cá. Ou seja, a falência de uma nos EUA não significa que a filial portuguesa fique comprometida - as seguradoras portuguesas não respondem pelos problemas de liquidez das americanas.

Mesmo que um banco não conseguisse pagar o dinheiro às pessoas que de repente o queiram levantar, poder-se-ia accionar o fundo de garantia de depósitos que foi criado justamente com esse fim e que cobre até 25 000€ por titular. Ou seja, a generalidade das pessoas que confiam as suas parcas economias aos bancos está relativamente segura.

O que importa é sobretudo afastar a ideia de que é melhor correr a tirar o dinheiro do banco. Quem quiser que o faça mas de cabeça fria e depois de achar que é a melhor decisão. A verdade é que, sendo uma crise que afecta sobretudo as instituições financeiras, é agora mais do que nunca que elas precisam do nosso dinheiro para continuar sem problemas. Não é à toa que as taxas dos depósitos a prazo está em alguns casos acima das taxas de referência; ou que os spreads voltaram a aumentar (há coisa de um ano havia por aí muitos spread "0%", mesmo que promocionais, lembram-se?)

Então vamos passar ao lado da crise?

Bem, não. Como já disse, há algumas consequências que já se fazem sentir.
E, se é verdade que Portugal não depende assim tanto dos EUA, depende de outros países mais próximos que, por sua vez, têm relações mais fortes com eles. Ou seja, se esses países começam a ter problemas (como já se ouve falar nas notícias), vamos acabar por apanhar por tabela.

Mesmo assim, e uma vez mais, não há neste momento motivos para pânico. Há muitos sinais que indicam que a nossa economia está melhor que muitas outras aqui ao lado. E, verdade seja dita, estamos a ter tempo para nos preparar para o pior, ou seja, quando o pior cá chegar, as consequências serão seguramente outras.

Aliás, há mesmo quem diga, que o facto de termos andado a resolver uma crise interna nestes últimos anos tem sido muito bom para robustecer a nossa economia e nos tornar mais resistentes a esta nova crise. Sinceramente não sei se sim nem se não mas é verdade que várias coisas melhoraram nos últimos anos (mas várias outras pioraram também).

Seja como for, a discussão do orçamento de Estado deste ano deve ser interessante - vamos ter um orçamento virado para a crise, como muitos dizem, ou um orçamento com medidas populistas destinadas a ganhar a próxima eleição?

Conclusão

Em resumo, acho que apesar de ainda não termos visto o pior desta crise, não há motivos para pânico e nem sequer para achar que vamos ficar tão mal como os EUA. Há mecanismos que protegem financeiramente os mais pequenos e "inocentes" digamos assim.

No entanto, é preciso estar atento. Haverá seguramente vários casos individuais de pessoas que vão perder muito sem contar com isso. Tentemos não ser apanhados desprevenidos. Por exemplo, é verdade que é boa altura para comprar casa por estarem baratas. Mas com as taxas ainda a subir, se calhar não é boa ideia endividar-se até à ponta dos cabelos para o conseguir fazer.

De resto, o que se pode fazer é o que já foi sugerido vezes sem conta - tentar reduzir o peso dos créditos no orçamento familiar, pagando-os assim que possível; poupar dinheiro evitando gastos desnecessários e amealhando uma reserva para dias menos felizes; planear antecipadamente o dinheiro que se vai gastar.

Uma nota final - alguns pontos deste artigo serão discutíveis ou estarão pouco claros (o artigo é demasiado abrangente e já vai longo, não quis entrar em demasiados detalhes). Cá estarei para tentar esclarecer melhor o meu ponto de vista sobre esses pontos se for caso disso.

Estes argumentos e conclusões são o resultado da leitura que tenho feito nos últimos tempos para tentar acompanhar o que se passa. Façam o mesmo: mantenham-se informados e julguem por vocês próprios, criem a vossa visão da crise. Se encontrarem contradições no meu texto agradeço que mas indiquem.

Se tiverem dúvidas genéricas sobre este assunto, talvez o melhor seja colocá-las no fórum para as podermos discutir todos em conjunto.
Entretanto, vou tentar voltar aos artigos mais simples durante uns tempos 😉

Autor: Paulo Aguiar

A informação que consta no artigo não é vinculativa e não invalida a leitura integral de documentos que suportem a matéria em causa.

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28 comentários em “Nós e a crise
  1. Caro Magma,

    Penso que estás a fazer confusão entre taxas euribor e taxa directora fixa pelo BCE.

    O BCE com vista a influenciar a liquidez do mercado e por consequência a inflação, fixa a taxa directora na qual se baseia p/ emprestar dinheiro aos bancos da zona euro.

    Por outro lado a euribor é a taxa de juro que os principais bancos da zona euro utilizam para emprestar dinheiro entre si (no fundo o risco que estão dispostos a correr) e por essa via se reflecte aos particulares mediante a aplicação de um spread negociado caso a caso, normalmente a euribor apresenta um diferencial positivo de 0.2 em relação à taxa directora do BCE.

    Penso que o meu entendimento não anda longe da verdade, mas fico à espera que quem esteja mais esclarecido aqui venha dar opinião.

    Já agora disponibiliza a fonte da informação que referes segundo a qual Portugal apresenta as taxas de juro mais elevadas da UE, fiquei curioso.

    Abraços e obrigado

  2. Agradeço as informações, Paulo.

    Já espreitei a listagem dos depósitos a prazo dos respectivos Bancos e embora sejam de Junho, vou tentar actualizar alguns e ver se descubro a melhor opção.

    Parabéns por todo este trabalho, que elucida os menos sabidos nesta área, tal como eu. Já tenho onde me entreter!
    Obrigadinho
    Zirta

  3. Pedro, viva!

    A crise com que ora estamos a lidar se por um lado nos afecta sob variadas formas consideradas negativas, não deixa contudo de nos suscitar um interesse crescentemente positivo, por forma a entendê-le e preveni-la.

    Vem isto a propósito de uma notícia sobre as famigeradas taxas de juro que acabei de ler e que gostava de perceber.

    É que fiquei a saber que Portugal é no seio da UE o país em que as taxas de juro aplicadas aos CHPP e às empresas mais tem subido…! Ora eu dei um salto na cadeira..! Então como é que é? Para que serve o BCE que fixou a EURIBOR nos 4,25%?

    Onde é que fica a EUROPA afinal? É ou não ela que fixa as taxas?

    Se sim, porque é aqui em Portugal não é?

    Se até sou capaz de fazer um esforço para entender a necessidade de os bancos anteciparem a subida da taxa por razões de mercado nacional, já me custa a aceitar que sejamos nós portugueses os mais prejudicados…!!!?Mais uma vez!!!

    E em que se baseiam os nossos queridos bancos para continuarem a subir, digo indiscriminadamente, as taxas de juro? Não haverá um qualquer meio para os travar?

    Já agora permita-se-me – e desculpem-me o desabafo – denunciar a imprensa, e particularmente os nossos canais televisivos que todos os dias nos torram a paciênca com dramatismos:

    Não é que no dia 26/9 a Euribor desceu de 5,296 (dia anterior) para 5,290 e no dia 3/10 desceu de 5.421(dia anterior) para 5.415 e nada foi assinalado nos jornais diários? Tal não seria importante, mas é que as Tvs falam sempre que ela sobe…! Não lhes interessa quando desce.

    É o quanto pior tanto melhor…!

    E não haverá quem ponha termo a isto?

    Obrigado!

  4. Em corolário ao meu texto, as previsões do FMI para o próximo ano:

    Zirta, sobre depósitos a prazo consulta este tópico do fórum:
    Quanto aos bancos, a maioria dos bancos a operar em território nacional têm boas classificações do ponto de vista de “risco” (ou melhor, imunidade a ele). Os bancos Online como o BIG não são excepção. Mas no fórum também podes encontrar mais sobre vários bancos, é só pesquisar…

  5. Sou leiga em Finanças e apenas por acaso descobri este cantinho, onde penso aprender várias coisas.
    Perante a situação actual, em que Banco devo fazer um depósito a prazo, de por exemplo 5000€, por um período de 6 meses?
    O Banco Bigonline é de confiança?
    Obrigado

  6. Tenho tentado acompanhar novos desenvolvimentos da actual crise financeira. Inicialmente entrei em pânico, pois estou a pagar um apartamento e tenho medo que o futuro não o permita fazê-lo. No entanto começo a aperceber-me que muitas das notícias não passam de mera especulação, ora no sentido de pressionar quem toma decisões, ora no sentido de tentar trazer algum consolo a quem está aflito.

    Note-se que quem toma decisões tem a responsabilidade de pelo menos não vir para os média especular seja lá do que for, pois não só cria inicialmente falsas esperanças como depois descrédito. Se pelo contrário trazem pessimismo as pessoas e mercados retraem-se e a economia nem tem oportunidade de arrancar.

    Gostei do seu comentário realista e consiso. Se a crise vai piorar…ninguém sabe!

  7. Muito bom.
    As suas opiniões coincidem com o que eu penso.

    Parafraseando uma apresentadora-jornalista da televisão :
    -3 países NACIONALIZARAM o Banco Fortis (não disse qual a nacionalidade escolhida), ficando CADA UM COM 49% (!)
    -E pronto, o Plano Paulson está para ser decidido na CAMA dos representantes!

  8. Se o que se passa actualmente nos EUA é uma simples “constipação” nem quero imaginar o que seria uma “pneumonia”

  9. Como o Paulo Aguiar já nos habituou, cá está mais artigo de excelente qualidade com todos os pontos “críticos” bem focados e devidamente explícitos.

    Esperemos que com a “constipação” dos EUA nós não apanhemos todos uma pneumonia.

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