Cultura e Lazer

As lições dos empresários gananciosos

Por cá, até existe belíssimo material para filmes (ficcionados, vá lá) sobre homens de negócio corruptos. Enquanto não os fazem, fiquemos entretidos com estes.

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As lições dos empresários gananciosos

Por cá, até existe belíssimo material para filmes (ficcionados, vá lá) sobre homens de negócio corruptos. Enquanto não os fazem, fiquemos entretidos com estes.

O ator Richard Gere foi um dos ícones do cinema dos anos 1980 e 1990. De certa forma, nalguns papéis, ele representava o típico macho-alfa, tão em voga nesses tempos, por quem as mulheres se apaixonavam perdidamente. Em Arbitrage (2012), já entrado no charme grisalho dos sessentas, continua a ser um sedutor (tem mulher e amante, é idolatrado pela filha), mas a vida já não lhe corre sempre de feição. O que ninguém diria, face à cena inicial, em que um bem-sucedido homem de negócios, no seu fato impecável, responde com uma confiança inabalável às perguntas de uma jornalista.

Por que razão apostou tão fortemente no aparecimento de uma crise no imobiliário, precisamente num período de franco crescimento do setor, pergunta ela. Robert Miller responde-lhe que ele é um produto da década de 1950; os pais tinham conhecido a Grande Depressão, tinham visto o ataque a Pearl Harbor, e depois a bomba atómica… «Eles não achavam que podiam acontecer coisas más. Eles sabiam que iam acontecer coisas más.» E era isso que estava novamente a acontecer?, questiona a repórter. Uma expressão de confiança e de ainda-bem-que-me-pergunta-isso brilha nos olhos do entrevistado. Ele tem uma história inspiradora de infância para partilhar connosco: «Quando eu era criança, o meu professor preferido era o Sr. James. O Professor James dizia que todos os acontecimentos mundiais giravam à volta de oito coisas: D – I – N – H – E – I – R – O.»

Embustes, mentiras, segredos… vale tudo para ganhar mais uns milhões

Pois é, na tradução acrescentamos mais uns eventos capitais para o mundo, pois na língua original são só cinco (M – O – N – E – Y). Seja como for, em inglês ou português, o resultado da palavra vai dar ao mesmo. No caso de Arbitrage, que por cá estreou com um subtítulo que já desvenda tudo (A Fraude), será a ganância a conduzir às atividades ilícitas. Robert está farto de ver o mesmo, repetidamente: até os mais bem-intencionados podem perder o tino, face à concorrência que existe entre os que querem amealhar dinheiro. Era o caso dele, claro, um homem tão digno que até se envolvia em causas filantrópicas. Mas, se havia mais milhões para ganhar, porquê prescindir deles?

Grande parte do filme centra-se nas implicações que as mentiras e os segredos terão nas pessoas que rodeiam Robert. Depois, resta assistir até onde é que o empresário está disposto a ir. Que princípios porá de lado, na tentativa de encobrir os seus crimes e escapar à justiça dos tribunais? Que máscaras usará, para não ser alvo do julgamento da sua família? A sucessão de acontecimentos vai aprofundando o buraco negro em que o pai de família e empresário modelo se meteu. Escavará ainda mais fundo, cada vez mais fundo, para tentar sair do outro lado, ou irá parar e tentar voltar à superfície, mesmo que com o fato todo conspurcado?

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Adoradores de dinheiro, uni-vos em redor de Larry

«Achas que o dinheiro vai resolver isto?», pergunta alguém, a certa altura, incrédulo com a proposta acabada de ouvir. E, sim, Robert Miller sempre pensou que o dinheiro resolveria tudo. «Que mais poderia ser?»

Regredimos no tempo umas duas décadas para aterrar no filme Other People’s Money (1991) e conhecermos Larry, o Liquidador. Interpretado pelo carismático Danny DeVito, este liquidador não é nenhum assassino contratado: a especialidade dele é dar cabo de empresas. Fechá-las e fazer-lhes o enterro. Porquê? Ora, porque ainda estamos em plena era do famoso personagem Gordon Gekko e da febre de Wall Street para fazer dinheiro seja de que forma for. (Hum, mas será que isso mudou desde então?) Embora a abordagem do realizador Norman Jewison abra espaço para a comédia, o assunto não deixa de ser sério. E não somos nós a dizê-lo; é o próprio Larry:

Adoro dinheiro. Adoro mais o dinheiro do que as coisas que posso comprar com ele. Isso surpreende-vos? Dinheiro… Ele não se importa se sou bom ou não. Não se importa se ressono ou não. Não se importa a que Deus é que eu rezo. Só existem três coisas neste mundo com este tipo de aceitação incondicional: cães, donuts e dinheiro. Só que o dinheiro é melhor. Sabem porquê? Porque não nos faz engordar e não faz cocó no chão da sala de estar. E só há uma coisa de que ainda gosto mais: o dinheiro das outras pessoas.

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A liquidação de empresas pode ter beleza, certo?

O dono da Garfield Investments está sempre de olho nas subidas e descidas do mercado de capitais. Sem tempo para delicadezas, aproveita as empresas em dificuldades para fazer bons negócios. Para ele, claro. Tudo parece muito simples. O computador de Garfield (a que ele chama Carmen) mostra-lhe que a empresa mãe de um grupo empresarial está a dar prejuízo. Ele, enquanto acionista, quer lucrar. Para isso acontecer, é preciso que Mr. Coles (interpretado pelo mítico Gregory Peck), um empresário adorado pelos seus trabalhadores, se livre da empresa que o pai criou 81 anos atrás.

O embate entre os dois protagonistas é um embate de filosofias. Garfield explica o seu plano a Coles, mas este resiste, agarrando-se aos valores de outrora, descrente ou ingénuo sobre o novo grande negócio de Wall Street: a liquidação de empresas. Não, não está disposto a sacrificar a empresa a que ele e o seu pai dedicaram uma vida. «Não veja isto como um suicídio», diz-lhe Garfield, «encare-o como uma eutanásia.» Nada feito. O velho empresário mostra-se irredutível; não está disposto a negociar com predadores e terroristas financeiros.

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O melhor jogo do mundo: Ganhar o mais que se puder

Será difícil armar uma resistência eficaz àquele homem pequeno que adora donuts e gosta de praticar o melhor jogo do mundo. As regras? «Vou ensinar-te, é fácil. Ganhas o mais que puderes, durante quanto tempo puderes. E depois, que acontece? Quem tiver mais [dinheiro] quando morrer, ganha!» É assim que se fazem as coisas na América, assegura-nos, numa espécie de sobrevivência dos mais fortes, e ele quer cumprir exemplarmente o seu papel. Nos bastidores, prepara-se um takeover hostil. Será preciso um milagre na sessão de acionistas que visa eleger o novo conselho de administração para que Coles possa manter a empresa do pai, salvaguardando, desse modo, os postos de trabalho e a economia local. E é nessa altura que o filme nos apresenta dois discursos memoráveis.

«Bolas! Um negócio vale mais do que o preço das suas ações», vocifera Mr. Coles, após apresentar o adversário como um homem que não cria nada, não constrói nada, não gere nada, um homem que apenas destrói aquilo que, num dado momento, vale mais morto do que vivo, num tipo de assassinato que Wall Street legalizou sob um nome bastante atrativo: maximizar o valor dos acionistas. Pois bem, para Mr. Coles, uma empresa tem dimensões além do negócio. «É o sítio onde ganhamos as nossas vidas, onde conhecemos os nossos amigos, onde sonhamos os nossos sonhos. É o tecido que mantém a nossa sociedade junta.»

Ficaram convencidos? Calma, que o discurso de Mr. Garfield também é capaz de mover montanhas. Porém, como este texto já vai longo e não queremos maçar, deixemos o resultado da eleição, da empresa – e do caso amoroso entre Larry, o Liquidador e a advogada/enteada de Coles –, para quem quiser espreitar o filme por motivos alheios a essas coisas da literacia financeira...

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