Numa altura em que a crise da habitação ganhou um justo protagonismo no seio da sociedade e passou a ser objeto de debates e discussões permanentes no parlamento, na comunicação social e em sociedade, a existência, necessidade e dinâmicas dos contratos de arrendamento passaram, também eles, a ser objeto de muitas considerações.
Existem diversos tipos de contrato de arrendamento que se diferenciam pelo fim a que se destinam e da natureza e destino do imóvel arrendado. Prevê a lei a existência de arrendamentos habitacionais, comerciais ou industriais e ainda os arrendamentos rurais. Olhemos, em particular, para os arrendamentos habitacionais de que tanto se tem falado.
Arrendamento, o que é?
Começando pelo princípio, aos olhos da lei, o que é um contrato de arrendamento? Estabelece o Código Civil, no seu artigo 1023.º, que o arrendamento é o contrato pelo qual uma das partes se obriga a proporcionar à outra o gozo temporário de um bem imóvel, mediante retribuição, ou seja, é um contrato através do qual o Senhorio, contra o recebimento de uma renda, faculta ao inquilino o uso e o gozo de um imóvel habitacional. O regime e a forma destes contratos, pela importância social que assumem, são regulados por diferentes diplomas legais destacando-se aqui as disposições do Código Civil que incorporaram o que ficou conhecido por NRAU (Novo Regime do Arrendamento Urbano).
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Forma e requisitos do Contrato de Arrendamento
O contrato de arrendamento deve ser formalizado através de documento escrito e assinado pelas partes contratantes devendo conter os seguintes elementos: (i) identificação das partes; (ii) identificação do imóvel objeto do arrendamento; (iii) identificação do fim a que se destina o arrendamento; (iv) o valor da renda e as formas e prazos de pagamento da mesma e ainda o regime de atualização daquela ao longo da vida do contrato; (v) a duração do contrato e eventuais formas de renovação. Deve ainda o contrato referir a existência e identificação da licença de utilização do imóvel ou, se aplicável, a circunstância que determina a isenção da obrigatoriedade de tal licença. Uma vez formalizado o contrato de arrendamento, caberá ao Senhorio (ainda que o Inquilino também o possa fazer) comunicar a sua existência e termos negociais ajustados à Autoridade Tributária, sendo devido o pagamento de imposto de selo por um valor correspondente a 10% do valor da renda mensal do contrato.
Duração e renovações
A legislação em vigor relativamente ao arrendamento para habitação faz a distinção entre contratos celebrados com prazo certo e contratos celebrados por duração indeterminada, estipulando, quanto aos primeiros, que o prazo não pode ser inferior a 1(um) ano, nem superior a 30 (trinta) anos. Contudo, o legislador entende que existem casos excecionais, relativamente aos quais não se deve aplicar esta regra.
Assim, este regime prevê a possibilidade da celebração de contratos de arrendamento para habitação não permanente ou para fins especiais transitórios, designadamente por motivos profissionais, de educação e formação ou turísticos, relativamente aos quais não se aplica o prazo mínimo de duração do arrendamento de 1 (um) ano, aplicável aos demais contratos de arrendamento para habitação.
Quanto às renovações, e salvaguardas as circunstâncias em que as mesmas são obrigatórias, as partes são livres de estabelecer se, e em que condições, podem as mesmas ocorrer. Sem prejuízo da liberdade contratual referida, importa salientar que nos contratos de arrendamento habitacional formalizados a partir do fevereiro de 2019, há uma renovação automática obrigatória por três anos se o prazo de duração inicialmente contratado for inferior àquele prazo.
Direitos e obrigações que decorrem do contrato de Arrendamento para Senhorios e Arrendatários
Do contrato de arrendamento resultam assim um conjunto de direitos e obrigações que impendem sobre Senhorio e Arrendatário daqui se destacando a obrigação do Senhorio em facultar ao Arrendatário o uso da habitação conferindo à mesma padrões mínimos de conforto, higiene e segurança, respeitando a privacidade do arrendatário e assegurando a devida manutenção do imóvel e a reparação de quaisquer defeitos ou problemas que, não sendo da responsabilidade do arrendatário, se verifiquem no imóvel durante o prazo de cumprimento do contrato. Por sua vez, ao Arrendatário cabem as obrigações de pagamento pontual da renda ajustada, de uma correta e diligente utilização do imóvel e a de manutenção e reparação dos problemas, danos e defeitos que a incorreta utilização for gerando. Fica ainda obrigado o arrendatário, e dentro de algumas circunstâncias, a permitir periodicamente ao Senhorio o direito que aquele tem de vistoriar o imóvel arrendado.
É Importante perceber que, durante a vigência do arrendamento, o Senhorio mantém a capacidade de dispor do imóvel arrendado, podendo vendê-lo ou transmiti-lo a terceiro, circunstância em que o arrendamento se mantém, nos mesmos termos que estiverem em vigor à data da transmissão do imóvel.
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Terminação do contrato: Revogação, Resolução e Denúncia
A exemplo de outros contratos, a cessação da vigência do Arrendamento pode resultar de três circunstâncias diferentes: (i) a revogação que consiste num acordo entre as partes para dar por terminados os efeitos do contratos em termos acordados entre si; (ii) a resolução é o mecanismo através do qual uma das partes no contrato, seja o Senhorio ou o Arrendatário, faz cessar os efeitos do contrato em virtude do incumprimento pela contraparte das obrigações que para aquela emergem do contrato resolvido e que, pela sua gravidade ou consequências, torne inexigível à outra parte a manutenção do arrendamento, sendo o melhor exemplo a circunstância em que, pela falta do cumprimento do pagamento de rendas, o Senhorio resolve o contrato de arrendamento o que, nos termos do artigo 1083.º n.º 3 do código civil, só poderá ocorrer quando se verifique a mora igual ou superior a três meses no pagamento da renda. Por fim, o contrato de arrendamento pode ainda cessar os seus efeitos através da (iii) denúncia ou seja, nas circunstâncias permitidas por lei em que uma das partes, através de formalismo próprio (regra geral, carta registada com aviso de receção) comunique à outra que pretende colocar termo ao contrato para o final do prazo convencionado ou até, podendo e sujeito às condições e avisos prévios previstos na lei, para momento anterior ao fim do prazo que havia sido estabelecido no contrato.
O regime da Denúncia difere bastante consoante a mesma seja exercida pelo Senhorio ou pelo Arrendatário, sendo essa possibilidade bastante mais limitada para o Senhorio que, basicamente apenas poderá denunciar o contrato para momento anterior ao final do prazo contratado em circunstâncias extraordinárias que estejam previstas na lei como, por exemplo e entre outras, a necessidade de utilizar o locado para sua habitação própria ou quando pretenda realizar obras profundas no imóvel arrendado. Já ao Arrendatário, a lei confere o direito de resolver o contrato (até antecipadamente) desde que sejam cumpridos alguns prazos: O arrendatário pode impedir a renovação automática do contrato mediante comunicação ao senhorio com a antecedência mínima de 120, 90 ou 60 dias consoante o prazo de duração inicial do contrato ou da sua renovação for igual ou superior a um ano e inferior a seis anos, for igual ou superior a seis meses e inferior a um ano ou, ainda, tratando-se de prazo inferior a seis meses. Por outro lado, e caso pretenda fazer cessar o contrato ainda antes do final do prazo estipulado, o arrendatário poderá fazê-lo, decorrido um terço do prazo de duração inicial do contrato ou da sua renovação, mediante comunicação ao senhorio remetida a antecedência mínima de 120 dias do termo pretendido do contrato, se o prazo deste for igual ou superior a um ano ou de 60 dias do termo pretendido do contrato, se o prazo deste for inferior a um ano.
Transmissão do arrendamento por morte de uma das partes contratantes
Verificando-se a morte do Senhorio, o contrato de arrendamento que estiver em vigor, transmite-se nos precisos termos em que se encontra a vigorar para a(s) pessoa(a) ou entidade(s) a quem o imóvel objeto do arrendamento vier a ser transmitido por via sucessória.
Ocorrendo a morte do Arrendatário, nos termos previstos nos artigos 1106.º e 1107.º do código civil, o contrato poderá ser transmitido, por regra, para (a) o cônjuge com residência no locado; (b) para a pessoa que vivesse com o arrendatário em união de facto há mais de um ano ou ainda para a pessoa que vivesse com o arrendatário em economia comum há mais de um ano.
Sabia que… o arrendatário tem direito de preferência na compra e venda ou dação em cumprimento do local arrendado há mais de dois anos (artigo 1051.º n.º 1 a) do Código Civil).
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Miguel Ramos Ascensão, Of Counsel na Antas da Cunha ECIJA & Associados SP RL., com mais de 20 anos de experiência na área Imobiliária onde foi reconhecido, em 2015, pela WWL como um dos advogados de referência em Portugal no direito Imobiliário e na assessoria em transações imobiliárias.
A informação que consta no artigo não é vinculativa e não invalida a leitura integral de documentos que suportem a matéria em causa.
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