O Estado terminou com a emissão dos Certificados de Aforro da Série E de forma abrupta. Esta decisão gerou alguma polémica que vale a pena desmistificar.
Perceber como funcionam os Certificados e para que é que o Estado os usa é determinante para perceber a decisão.
Qual o objetivo dos Certificados de Aforro?
Ao contrário do que a maior parte das pessoas pensam, os Certificados de Aforro não foram criados para potenciar a poupança. Os Certificados são apenas mais uma forma do Estado se financiar.
Como todos sabemos, o Estado português necessita de receitas para poder fazer frente às despesas que tem e para poder providenciar serviços de qualidade aos seus contribuintes. A fonte de receitas mais comum são os impostos que todos nós pagamos.
Paralelamente e porque as receitas são inferiores às despesas que o Estado tem, existe a necessidade de recorrer a financiamento. Desta forma, o Estado português pode fazê-lo nos mercados financeiros, através da emissão de empréstimos obrigacionistas ou através da emissão de Certificados de Aforro.
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Qual o risco?
Se os Certificados são uma forma de o Estado se financiar, o risco destes produtos financeiros é o risco do Estado português. O que é que isto significa? Se Portugal entrar em default, ou seja, não tiver capacidade de pagar os seus compromissos, os certificados poderão não ser pagos aos seus subscritores.
Este ponto é muito importante, porque uma grande percentagem da população desconhece que os certificados têm um risco associado. Ainda que seja reduzido. Para se concretizar este risco é preciso que o Estado português entre em falência, algo que em Portugal nunca aconteceu.
Quem emite os certificados de aforro?
O IGCP (Agência da Gestão de Tesouraria e da Divida Publica) é a entidade responsável por gerir a dívida do Estado. Assim, o IGCP tem como missão a emissão de novos empréstimos obrigacionistas ou certificados, de forma a garantir que o Estado tem a liquidez necessária para as suas despesas e, em simultâneo, ser responsável por uma gestão eficaz e equilibrada do montante total da dívida emitida.
Desta forma, um dos pontos fundamentais passa pela gestão não só do montante de dívida que o Estado assume, mas sobretudo, dos encargos com o serviço de dívida contratado. Por outras palavras, o IGCP tem de gerir os custos de financiamento dos empréstimos que solicita.
Ora, se analisarmos os mercados financeiros, percebemos a decisão do IGCP em terminar com a Série E. Atualmente, o Estado português consegue financiar-se a um custo mais reduzido do que os 3,5% que estava a pagar nos certificados de aforro.
Até devemos colocar outra questão: Porque motivo o IGCP não terminou com esta série há mais tempo?
Em substituição, o IGCP emitiu uma nova Série F, que terá um retorno máximo de 2,5% ao ano (mais prémios de permanência). Mesmo assim, esta será das melhores alternativas que os aforradores têm.
Outro ponto interessante é que esta nova série só permite a subscrição de 50.000 euros por subscritor, enquanto que a anterior permitia 250.000 euros. Porque é que isto acontece? A minha interpretação é que o IGCP também pretende gerir a exposição dos diferentes investidores ao risco Estado.
Com a enorme adesão à Série E, os Certificados de Aforro representam atualmente uma percentagem elevada da dívida portuguesa, sendo que esse é um risco que deve ser gerido com racionalidade.
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Quem ganha com o fim da Série E
Os beneficiados com o fim da Série E e o início da Série F dos Certificados de Aforro são todos os contribuintes portugueses. Porquê? Porque o Estado vai pagar menos para se financiar e dessa forma os recursos que estava a despender a mais ficarão disponíveis para outros investimentos/despesas que o Estado tenha necessidade.
De uma forma simples, os nossos impostos estão a ser melhor geridos com este passo que o IGCP tomou.
Obviamente que os aforradores ficarão com uma opção de investimento com menor rentabilidade, mas mesmo assim, se analisarmos o risco/retorno, continua a ser das mais interessantes dentro desse segmento.
Os bancos tiveram influência?
Os bancos têm como missão gerirem bem as suas operações e gerarem lucro. Não existe nenhuma influência das instituições financeiras nesta tomada de posição do IGCP, nem nenhuma obrigatoriedade dos bancos terem taxas de depósitos a prazo atrativas.
Simplificando, os bancos “oferecem” taxas de retorno superiores quando precisam de reforçar a liquidez para a sua operação. Não tendo essa necessidade, não o fazem.
A realidade é que com o covid, os bancos conseguiram capitalizar-se a custos muito reduzidos, tendo neste momento os seus balanços fortalecidos e sem necessidade de pagar taxas atrativas para captar liquidez, apesar de o Banco Central Europeu ter subido as taxas de referência.
É verdade que muitos aforradores transferiram montantes elevados dos bancos para os Certificados de Aforro, mas mesmo assim, as instituições financeiras continuam bem capitalizadas, não tendo, para já, necessidade de aumentar o retorno dos depósitos para captar liquidez.
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Apaixonado pelo desporto e economia, foi jogador profissional de Futebol, tendo atuado em clubes como S.L. Benfica, Estoril, entre outros. Conciliou a carreira desportiva com a académica, terminando a licenciatura em Economia pela Faculdade de Economia da Universidade Nova de Lisboa (NOVA SBE). Continua ligado às suas duas paixões profissionais, desempenhando a função de Financial Advisor e colaborando como analista desportivo na CNN Portugal. Foi comentador residente no programa Jogo Económico do JE e Presidente do Conselho Fiscal da Federação Portuguesa de Footgolf. (FPFG). Participa com regularidade em eventos sobre Literacia Financeira.
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