Após mais um desempenho excecional no terceiro trimestre, a generalidade dos ativos cotados está a prolongar o movimento ascendente em outubro, gerando expectativa de um final de ano positivo e um 2025 com variações muito expressivas. Sobretudo no mercado de ações, onde muitos índices estão a negociar em máximos históricos e a acumular valorizações anuais de dois dígitos.

Desafiando o impacto de desenvolvimentos desfavoráveis, como as tarifas comerciais dos Estados Unidos e o agravamento das tensões geopolíticas em várias partes do globo, os investidores estão a reforçar a exposição aos ativos de risco, confiando na evolução favorável da economia global, descidas das taxas de juro, efeito transformador da Inteligência Artificial e trajetória positiva dos resultados das empresas.

Os mercados acionistas são formados por ciclos e depois das fases de alta surge inevitavelmente um período negativo. Utilizando a denominação dos mercados, depois de um bull market (fase em que um ativo valoriza mais de 20% desde o mínimo), vem o bear market (fase em que um ativo desvaloriza mais de 20% desde o máximo).

O que varia é a duração e dimensão de cada uma destas fases nas bolsas, que dependem de um variado conjunto de fatores. É praticamente impossível (e muito arriscado) prever o timing de cada ciclo e quais os acontecimentos que vão provocar as inversões de tendência.

O atual bull market nas ações norte-americanas cumpre três anos neste mês de outubro. Neste período, o índice S&P500 já valoriza mais de 80%, o que atirou as avaliações das ações para níveis que preocupam vários analistas e investidores, que acreditam que o bear market está aí ao virar da esquina. Os alertas de que as ações estão caras também têm sido transmitidos por bancos centrais e banqueiros, vozes habitualmente mais contidas neste tipo de alertas.

Contudo, na prestação das bolsas no terceiro trimestre não é visível qualquer receio, sendo antes evidente uma tendência de alta generalizada em termos de geografias, embora ainda muito centrada em setores específicos: tecnologia nos EUA e banca na Europa.

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Ações portuguesas em destaque

  • O S&P500 acumula cinco meses seguidos de ganhos até ao final de setembro, período em que valoriza mais de 35%. Se mantiver a tendência de alta nos próximos meses, fechará 2025 com o terceiro ano seguido de ganhos anuais acima de 20%. O índice Nasdaq, que agrupa as tecnológicas norte-americanas, avançou 18% no segundo trimestre e mais 11,4% no terceiro trimestre.
  • O índice Stoxx600, que reúne as maiores cotadas europeias, marca três trimestres seguidos de ganhos, fortemente impulsionado pela banca (dispara 53,8% em 2025). Os índices das Bolsas da Alemanha (19,9%), Espanha (37,6%) e Itália (29,8%) registam os ganhos mais expressivos.
  • O índice português PSI está a ter um 2025 perfeito, com saldos positivos em todos os meses do ano. Acumula uma valorização anual de 26,5% e negoceia no nível mais elevado em 15 anos (2010), refletindo variações muito acentuadas em empresas como a Mota-Engil (93%), BCP (64%) e Sonae (47%).
  • As ações asiáticas também marcam ganhos expressivos este ano, com o Hang Seng (Hong Kong) a subir 38% em 2025 após mais um trimestre muito forte (avançou 12,5% entre julho e setembro). O japonês Nikkei negoceia em máximos históricos após uma subida de 11,7% no terceiro trimestre. 

Ouro continua a brilhar

Uma das imagens de marca de 2025 nos mercados está a ser a valorização quase generalizada das várias classes de ativos, o que de acordo com vários analistas representa mais um motivo de preocupação sobre necessidade de uma correção devido à demasiada propensão ao risco.   

  • O ouro é o ativo em destaque nos mercados financeiros, com uma impressionante valorização de 47% até ao final de setembro que reflete o reforço do metal como ativo de refúgio e destino preferencial dos investidores para equilibrarem as carteiras face ao crescente nível de incerteza em várias áreas. Já neste mês de outubro, o ouro atingiu um novo recorde acima dos 4 mil dólares, o que representa uma valorização de 100% em apenas dois anos.
  • O petróleo segue o caminho oposto, refletindo a mudança de estratégia da OPEP+, que está a privilegiar a conquista de quota de mercado dos membros do cartel em detrimento do impulso aos preços. Os sucessivos aumentos da oferta acima do esperado provocaram uma descida superior a 10% nas cotações do Brent este ano.
  • No mercado cambial é a queda do dólar que merece destaque, com a moeda norte-americana a ser penalizada pelo afastamento dos investidores devido à incerteza das políticas de Donald Trump e reinício do ciclo de corte de juros da Fed. O índice da moeda (DXY) perdeu terreno em todos os primeiros seis meses de 2025 e acumula no final de setembro uma queda anual de 9,9%.

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O que pode abrir a porta ao bear market

O próximo ciclo negativo nas bolsas pode estar à porta, ou ainda longínquo. Ter origem num dos eventos listados em baixo, conjugação de vários deles, ou um outro que não está atualmente no radar. Conhecer as ameaças e diversificar as carteiras de investimento é essencial para os investidores enfrentarem os bear markets.

Regresso da guerra comercial EUA-China

As tarifas de Trump foram um tema dominante nos mercados em 2025, mas estiveram adormecidas nos últimos meses. Regressaram em força a 10 de outubro, com Donald Trump a ameaçar a China com a imposição de tarifas adicionais de 100%, o que mereceu uma resposta agressiva de Pequim. Apesar da aparente degradação nas relações entre os dois países e do aumento da turbulência nos mercados nas últimas sessões, os investidores confiam que este é mais um episódio da retórica habitual do presidente dos Estados Unidos, de ameaçar primeiro para recuar depois.

Contudo, se desta vez a escalada da guerra comercial entre as duas maiores economias do mundo se concretizar, será inevitável uma reação adversa das Bolsas globais. Além das tarifas, está em causa a imposição de restrições à exportação de software e chips para a China, o que representa um revés significativo para o setor tecnológico. O tema é atualmente o mais relevante e tem potencial para, só por si, derrubar o atual bull market.

Bolha na Inteligência Artificial

A euforia com o impacto da Inteligência Artificial tem registado um crescendo quase contínuo desde o lançamento do ChatGPT no final de 2022 e representa o principal pilar do atual bull market. Três anos depois, a OpenAI continua no centro deste boom, tendo nas últimas semanas assinado acordos de acesso a capacidade de computação que superam 1 bilião de dólares. O número impressiona e valida os investimentos massivos que estão a ser efetuados nesta área, mas existe uma apreensão crescente sobre a capacidade de as empresas recuperarem este dinheiro com receitas cobradas aos clientes.

Os alertas de que poderá estar a ser formada uma bolha na Inteligência Artificial contrasta com a visão de que esta tecnologia representa uma revolução que está apenas no início e tem potencial transformador na economia mundial. As grandes tecnológicas estão a negociar com avaliações comparáveis às registadas antes de rebentar a bolha das “dotcom” em 2000, mas existe uma enorme diferença entre os dois períodos. As protagonistas de hoje já registam lucros gigantescos, enquanto várias das estrelas da Internet da viragem do século nem receitas tinham. Ainda assim, a margem para surpresas negativas é muito escassa e se as expetativas atuais não forem cumpridas, a correção nas cotações pode ser expressiva.

Resultados desiludem

A evolução robusta dos resultados das empresas é outro dos pilares deste bull market, com os números do segundo trimestre bem acima do esperado a darem confiança aos investidores para debelar a incerteza com as tarifas. Com a época dos resultados à porta, as cotadas terão de repetir a apresentação de lucros acima do esperado e providenciar estimativas otimistas para 2026 para justificar a manutenção dos múltiplos de mercado elevados.

As cotadas do S&P500 transacionam atualmente a 23 vezes os lucros estimados para os próximos 12 meses, o que representa um máximo de cinco anos e compara com a média a 10 anos de 18,7 vezes. Os analistas contam que as empresas do índice norte-americano aumentem os lucros em 8,8%, o que representa um abrandamento face aos aumentos de dois dígitos nos três trimestres anteriores. No Stoxx600 o múltiplo é bem mais contido, com as previsões de lucros a corresponderem a 14,5 vezes a cotação (14,2 vezes de média a 10 anos). Os analistas apontam para uma queda de 0,6% nos lucros das empresas do índice europeu no terceiro trimestre, invertendo as variações positivas dos cinco trimestres anteriores.   

Economia dos EUA em recessão

Apesar do impacto da subida agressiva de juros e da introdução das tarifas de Trump, a economia norte-americana registou uma resiliência notável que também foi fundamental para a evolução positiva das ações. O PIB dos Estados Unidos cresceu 3,8% no segundo trimestre, mas os dados do mercado de trabalho dos últimos meses reacenderam os receios sobre uma recessão na maior economia do mundo. Se este cenário desfavorável se materializar, a atratividade das ações a nível global sofre um rombo considerável. 

Fed não baixa juros

A expectativa de corte de juros da Fed foi outro dos pilares desta fase mais recente do bull market, sendo que o reinício do alívio da política monetária em setembro gerou expetativa de mais descidas de juros nos próximos meses. Contudo, mesmo que a economia norte-americana abrande a um ritmo mais forte, a inflação elevada (2,8% em agosto) pode restringir os próximos movimentos da Fed. Se o banco central não prosseguir com o alívio da política monetária, cai por terra uma das expetativas mais firmes do mercado.    

Economia alemã não arranca

Em recessão/estagnação desde que a Rússia invadiu a Ucrânia, a economia alemã beneficiou com uma inversão acentuada de expetativas, depois do Governo germânico ter quebrado a tradição de anos de férrea disciplina orçamental. O anúncio de estímulos massivos através de fundos para investir em infraestruturas e defesa foi decisivo para reforçar a atratividade das ações europeias, mas as medidas demoram a chegar ao terreno e ter efeitos visíveis na atividade económica. Se 2026 for um novo ano de recessão/estagnação na maior economia alemã, as ações europeias podem sofrer.

Crises políticas

A França está em crise política há mais de dois anos, com os sucessivos governos incapazes de implementar medidas com o apoio do fragmentado parlamento que sejam capazes de inverter a deterioração grave das contas públicas da segunda maior economia europeia. Os custos de financiamento de França já são dos mais elevados da Zona Euro e se a sustentabilidade da dívida do país sofrer um rombo adicional, o impacto nos mercados globais pode ser substancial devido ao potencial de contágio.

Crises políticas noutras geografias também podem gerar turbulência nos mercados. A coligação que governa o Japão há décadas está à beira do colapso. Em Washington persiste um impasse que mantém o governo paralisado há semanas e pode acentuar a trajetória de abrandamento da maior economia do mundo.

Depois de três anos de ganhos quase ininterruptos, a resistência dos mercados a desenvolvimentos desfavoráveis pode estar próxima do limite. Lucros robustos e otimismo no setor tecnológico sustentam a tendência altista, mas também está a aumentar o risco de uma correção acentuada se o cenário económico e político se deteriorar.

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