A carência de capital no crédito habitação

Perante a subida dos juros, muitas famílias procuram formas de baixar a prestação. Será a carência de capital uma boa alternativa?

As taxas de juro no crédito habitação têm subido bastante nos últimos meses. A prestação do crédito tem por isso aumentado, bem mais do que alguns esperariam e para o qual estariam preparados.

Perante isto, muitos serão aqueles que começam já a pensar em formas de reduzir o valor da prestação que pagam ao banco e, assim, reduzir o impacto da subida dos juros no seu orçamento familiar.

A carência de capital é uma forma de baixar consideravelmente o valor da prestação mensal. Mas será uma boa alternativa?

O que é a carência de capital?

Carência de capital não é mais do que deixar de se amortizar o crédito, ficando o mutuário a pagar apenas a componente dos juros.

Procurando uma negociação com o seu banco, no sentido de baixar o valor da prestação do crédito habitação, o mutuário pode procurar pedir a carência do capital durante um período de tempo.

Durante esse tempo, o mutuário pagará apenas os juros do crédito, deixando de pagar a componente do capital. Lembre-se, o valor da prestação mensal do seu crédito comporta duas componentes: amortização de capital e juro.

A amortização de capital refere-se ao valor que é periodicamente amortizado do montante do empréstimo. Já o juro não é mais do que a remuneração do banco; é o custo (ou uma parte dele) que tem de pagar pelo financiamento pedido.

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Veja o seguinte exemplo

Imaginemos o caso de um financiamento de 200.000 euros, a 30 anos. Simulando para taxas de juro a 3%, 4% e 5%, temos os seguintes montantes de prestação, capital e juros:

Financiamento

200 mil euros

Prazo (meses)

360

Taxa de juro

3%

4%

5%

Prestação

843,21€

954,83€

1.073,64€

Capital

343,21€

288,16€

240,31€

Juro

500€

666,67€

833,33€

O montante da prestação mensal correspondente iria variar entre 843,21 e 1.073,64 euros, em função do nível da taxa de juro. Já o valor correspondente à amortização de capital varia entre 343,21 e 240,31 euros.

Na hipótese de pedido de carência de capital durante 24 meses, o montante mensal a pagar iria cingir-se ao valor do juro. No caso de uma taxa de juro de 3%, por exemplo, em vez de pagar 843,21 euros por mês, pagaria apenas 500 euros, o que seria uma excelente folga no orçamento familiar.

Ao fim de 24 meses de carência de capital, o mutuário conseguiria uma “poupança” entre
8.237 e 5.767 euros.

Quais os custos de pedir uma carência de capital?

A verdade é que uma carência de capital não se resume ao valor que se deixa de pagar durante o período negociado. É que, no final desse período, o montante em dívida terá de ser pago ao longo do restante prazo de financiamento.

Refazendo as contas, mas para um prazo remanescente de 336 meses (após terminado o período de carência de capital de 24 meses), concluímos que o valor mensal da prestação subiria a partir desse momento.

Financiamento

200 mil euros

Prazo (meses)

336

Taxa de juro

3%

4%

5%

Prestação

880,53€

990,42€

1.107,15€

Capital

380,53€

323,76€

273,81€

Juro

500€

666,67€

833,33€

Diferença na prestação

37,33€

35,59€

33,50€

A diferença mensal situar-se-ia entre 37,33 e 33,50 euros. É pouco, é certo, ainda mais comparando com aquilo que se deixaria de pagar durante os primeiros 24 meses. Mas aquilo que se deixa de pagar durante o período de carência, paga-se com juros no restante prazo do empréstimo.

O leitor deve procurar entender que, estando um período sem amortizar capital, está também a pagar mais juros, já que o montante de juro periodicamente pago é calculado sobre o capital em dívida.

O montante pago a mais de juros, no caso de pedir uma carência de capital situa-se entre 4.305 e 5.490 euros, conforme quadro abaixo:

S/ Carência

C/ Carência

Diferencial

S/ Carência

C/ Carência

Diferencial

S/ Carência

C/ Carência

Diferencial

Taxa de juro: 3%

Taxa de juro: 4%

Taxa de juro: 5%

Juros pagos

103.555€

107.860€

4.305€

143.739€

148.783€

5.044€

186.512€

192.002€

5.490€

Assim sendo, com uma carência de capital, paga menos durante o respectivo período de carência, mas pagará sempre mais juros até ao final do prazo do empréstimo.

Que riscos corro ao pedir carência de capital?

Se, porventura, no fim do prazo da carência, ainda não conseguir fazer face ao pagamento das suas prestações, poderá ver-se forçado a vender a sua casa. Só que nesse momento, estará perante um financiamento que, entretanto, não foi amortizado (deve mais dinheiro ao banco) e talvez perante um mercado que valerá menos do que vale hoje (no caso de os preços das casas descerem nos próximos tempos).

No futuro, o valor da venda da sua casa pode não chegar para cobrir o valor em dívida. Com uma carência de capital, poupa hoje, mas corre riscos e tem maiores encargos no futuro.

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O que devo fazer, então?

Antes de mais, deve procurar avaliar muito bem a sua situação pessoal e verificar se o orçamento familiar comporta mais subidas na taxa de juro. Se achar que vai entrar nalguma situação mais complicada, deve agir por antecipação.

Vender hoje a sua casa e comprar outra de menor valor e com menos dívida, pode ser uma solução. A carência de capital pode também ser uma alternativa, mas esteja certo de que representa um encargo acrescido até ao final do prazo do empréstimo e comporta riscos de não conseguir vender a casa no futuro por um preço que talvez lhe paguem hoje.

Bons negócios (imobiliários)!

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Gonçalo Nascimento Rodrigues é Consultor em Finanças Imobiliárias, tendo trabalhado em empresas como Ernst & Young, Colliers International e Essentia. É Coordenador e Docente numa Pós-Graduação em Investimentos Imobiliários no ISCTE Executive Education. Adicionalmente, exerce atividade de consultoria, prestando serviços de assessoria ao investimento imobiliário. Detém um master em Gestão e Finanças Imobiliárias e um master em Finanças, ambos pelo ISCTE Business School, além de uma licenciatura em Gestão de Empresas na Universidade Católica Portuguesa. É autor do blogue Out of the Box.

A informação que consta no artigo não é vinculativa e não invalida a leitura integral de documentos que suportem a matéria em causa.

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