Apesar de a lei portuguesa já prever expressamente a possibilidade de instalação de pontos de carregamento nos lugares de garagem, continuam a surgir dúvidas práticas, sobretudo em condomínios mais antigos.

Vamos analisar o regime legal aplicável e os principais passos, requisitos e obstáculos associados à instalação de carregadores de veículos elétricos em prédios em regime de propriedade horizontal.

Qual é o enquadramento legal?

O tema encontra-se regulado pelo Regime Jurídico da Mobilidade Elétrica (RJME). Nos termos do artigo 29.º do Decreto-Lei nº 90/2014 de 11-06-2014 – ANEXO II – (a que se refere o artigo 7.º) – Republicação do Decreto-Lei n.º 39/2010, de 26 de abril, que trata da instalação de pontos de carregamento em edifícios existentes, é nos dito o seguinte:

“É admitida a instalação, por qualquer condómino, arrendatário ou ocupante legal, a expensas do próprio, de pontos de carregamento de baterias de veículos elétricos […] nos locais de estacionamento dos edifícios já existentes, de acordo com os termos definidos por portaria.”

Assim, qualquer condómino tem o direito de instalar um carregador no seu lugar de garagem, mesmo que o edifício não tenha infraestrutura prévia. A lei também abrange arrendatários ou ocupantes legais.

Leia ainda: Novo regime de mobilidade elétrica corta contratos e baixa custos

Quais são os passos para instalar um carregador?

Quando a instalação envolve partes comuns do edifício, como tetos, paredes ou corredores, aplicam-se formalidades adicionais. O interessado deve:

  • Enviar comunicação escrita prévia à administração do condomínio (e ao proprietário, se aplicável), com pelo menos 30 dias de antecedência;
  • A administração pode opor-se no prazo de 90 dias, mas apenas em três situações legalmente previstas:
    • Se instalar, no mesmo prazo, um ponto de carregamento partilhado com as mesmas funcionalidades;
    • Se já existir infraestrutura partilhada adequada;
    • Se a instalação colocar em risco a segurança ou prejudicar a linha arquitetónica do edifício.

Caso não haja oposição ou esta não cumpra os requisitos legais, considera-se que a instalação está autorizada.

A decisão do condomínio deve ser tomada no prazo máximo de 60 dias após a comunicação e, se negativa, comunicada por escrito no prazo de 15 dias, com devida fundamentação.

E nos edifícios antigos?

Nos prédios construídos antes de 2010, a instalação elétrica não foi dimensionada para suportar consumos elevados como os associados ao carregamento de veículos.

Nestes casos:

A instalação individual com wallbox (carregador ligado à parede) pode ser possível;

Intervenções mais profundas na rede elétrica comum exigem deliberação da assembleia, com maioria qualificada de dois terços do valor total do prédio, nos termos do artigo 1425.º do Código Civil.

Quem suporta os custos de instalação?

A instalação é da responsabilidade do interessado, exceto se houver acordo em contrário deliberado em assembleia.

Quanto ao consumo de eletricidade, a lei não impõe um modelo único. Existem duas soluções práticas:

  • Instalar um contador individual ligado ao quadro da fração, com faturação autónoma;
  • Celebrar um acordo com o condomínio, para cobrança proporcional ao consumo estimado ou medido, através das quotas mensais ou uma quota extra.

Quais são os obstáculos mais comuns?

Capacidade da rede elétrica

Nos edifícios antigos, a infraestrutura elétrica foi pensada apenas para iluminação e serviços comuns (como elevadores). A instalação de vários carregadores pode exigir:

  • Reforço da potência contratada;
  • Intervenções na cablagem e nos quadros elétricos;
  • Aprovação de obras em assembleia de condóminos.

Instalações improvisadas

É proibido utilizar extensões elétricas por janelas, escadas ou corredores. A instalação deve:

  • Ser executada por técnico certificado;
  • Cumprir as normas da DGEG (Direção-Geral de Energia e Geologia);
  • Garantir segurança e compatibilidade elétrica.

Leia ainda: Apoios à compra de um carro elétrico disponíveis desde 31 de março

Existem incentivos e apoios públicos?

Sim. O Fundo Ambiental disponibiliza apoios para a instalação de carregadores em edifícios em propriedade horizontal.

Em 2025, a dotação global é de 6,1 milhões de euros, com candidaturas abertas a:

  • Condóminos individuais;
  • Administração do condomínio (para projetos coletivos).
  • Para serem elegíveis, os projetos devem:
    • Ser realizados por instaladores certificados;
    • Estar ligados à rede Mobi.E;
    • Privilegiar soluções partilhadas ou coletivas.

Exemplo prático: O que esperar?

Num prédio com 30 frações, se todos pretenderem instalar carregadores de 7 kW, será necessário garantir uma potência total próxima dos 200 kW. A este valor somam-se os consumos comuns, exigindo:

  • Reforço da infraestrutura elétrica;
  • Obras estruturais;
  • Custos que podem atingir 5.000 € por fração, incluindo o wallbox e a infraestrutura partilhada.

Boas práticas e recomendações

Avalie antes de comprar um carro elétrico:

  • Qual a capacidade da garagem e da rede elétrica;
  • Consulte um técnico especializado antes de iniciar qualquer instalação;
  • Formalize acordos por escrito com o condomínio;
  • Evite práticas ilegais, como extensões improvisadas.

Conclusão

A instalação de pontos de carregamento em condomínios é juridicamente possível, mas tecnicamente desafiante. O artigo 29.º do Decreto-Lei n.º 20/2020 estabelece um direito claro dos condóminos à instalação de carregadores, sujeito a regras específicas e salvaguardas para os restantes condóminos.

A chave para o sucesso está na informação, no diálogo com a administração do condomínio e na escolha de soluções técnicas seguras e certificadas.

À medida que Portugal avança na transição energética, adaptar os edifícios existentes será essencial. E tudo começa com o conhecimento e com o cumprimento da lei.

Leia ainda: Como escolher o melhor carregador para o seu carro elétrico

A informação que consta no artigo não é vinculativa e não invalida a leitura integral de documentos que suportem a matéria em causa.

EnergiaMobilidadeVida e família