Notas a voarem, empurradas por uma ventoinha vintage

A Day to Remember – “Only Money” (2021)

Neste tema da banda norte-americana de rock A Day to Remember, a morte de uma avó serve de mote para uma letra em que um neto recorda os tempos de infância. Era, então, um homem que se começava a formar, ao lado da avó, a ver filmes como Música no Coração (1965) ou a ouvir contar as histórias de livros infantis, antes de ir para a cama.

Memórias de uma época em que se vivia com pouco e que contrastam com o valor que o protagonista da canção viria a dar ao dinheiro. “Geralmente estou fora no trabalho”, confessa, “mas nada compensa passarmos ao lado de memórias”. O refrão ajuda a perceber qual foi a grande lição deixada pela avó: que o dinheiro é apenas dinheiro.

A avaliar pelos restantes versos, aparentemente, as questões monetárias até causaram divisões familiares. Quem nunca viveu isso, certo? “Era só dinheiro / Custou-me alguma família, custou-me alguns amigos”. Desses desentendimentos, surgiram outras lições. Que uma pessoa não se define pelo dinheiro que tem. E que os cifrões, os números nas contas bancárias, podem provocar ressentimentos, mas também ensinam a perdoar.  “Qualquer que seja o caminho em frente, família é família até ao fim”, ouve-se, na voz masculina do vocalista. Mas bem podia ser a avó a lembrar algo importante ao neto.

Jermaine Dupri & Jay-Z – ‘Money Ain’t a Thang’ (1998)

Neste caso, o Jermaine e o Jay-Z talvez nos tenham trocado as voltas. Se colocarmos o título da música nos tradutores online, eles devolvem-nos um esquisito “o dinheiro não é uma coisa” (ficava melhor “o dinheiro não é uma cena” ou até “o dinheiro não é nada”, que é como quem diz, não vale nada. Talvez a iconografia do vídeo – cheio de carros desportivos, joias de ouro e platina, maços de dólares, notas atiradas ao ar –, associada ao título, tenha levado alguns a verem na canção um hino aos excessos do hip hop. Hum…

É discutível, no mínimo, que estes rapazes, em finais dos anos 1990, estivessem assim tão preocupados em dizer que o dinheiro não é assim tão importante. De facto, o género estava, então, associado à ideia de ostentação. E é difícil chegar ao fim do videoclip marcado pelas corridas de Ferrari e Jaguar e cavalos puro-sangue, mais as raparigas que parecem adorar o estilo de vida luxuoso, a pensar que o dinheiro não é uma cena assim tão importante.

“O preço que se lixe”, dizem eles. Porquê? Porque o título da canção, afinal, talvez queira dizer que “o dinheiro, para nós, não é um problema”. Ou seja, já ganharam tanto, que, de facto, deixou de ser uma coisa importante. Mas só porque eles podem comprar tudo o que querem. “Ando a gastar às centenas desde que os outros eram crianças”, avisam. Sim, dá para ver.

Prince And The New Power Generation – “Money Don’t Matter 2 Night” (1991)

A canção de Prince mostra que há várias formas de perder dinheiro. Uma delas, profusamente ilustrada por imagens em casinos, é perdê-lo no vício do jogo. “Mais uma carta e faz 22, mais uma vez teve azar, sim, é verdade, ele nunca teve respeito pelo dinheiro, por isso é que nunca ganha”.

A referência ao jogo do Blackjack, em que se ganha ao fazer 21, representa o vício do jogo. Aquele homem, que se julga azarado na vida, cavou a sua sepultura. “Ele nunca tem o suficiente para tratar devidamente a sua mulher”. Solução? Afastá-la, num acesso de raiva, e dizer que “esta noite o dinheiro não interessa para nada, ontem também não interessava”. Mas interessa, se olharmos para a família, a jantar outra vez sandes de pão de forma.

O videoclip mostra que esta história de se perder o dinheiro que se tem nem sempre é culpa de um homem. “Quando se pensa que temos mais do que suficiente, é precisamente nessa altura que ele voa todo”, canta Prince, numa toada suave.

Perante nós, alternam-se imagens da Grande Depressão nos Estados Unidos, após o crash da bolsa de 1929, e imagens da pobreza causadas pelo período de recessão económica dos anos 1980. Sem-abrigo, sopa dos pobres, negócios fechados, desemprego crescente. Em contraste, os ares satisfeitos de George Bush Jr. e Donald Trump. Os ricos, costuma-se dizer, nunca passam mal nas crises. Depois, há as imagens dos soldados norte-americanos que partiam para a Guerra do Golfo. “Que interessa termos o controlo de todo o petróleo; vale a pena uma criança morrer por causa disso?” Os efeitos devastadores nas populações dos países em conflito surgem nas imagens das crianças desnutridas, dos refugiados, dos feridos de guerra.

O protagonista da canção bem pode tentar assegurar-nos de que o dinheiro não interessa para nada. Mas importa, sobretudo quando não se tem para o básico da vida. “É nessa altura que descobrimos que ficaremos melhor se nos certificarmos de que a nossa alma está bem”. Ele ainda tem filhos pequenos; não os perdeu na guerra. O mal dele não é assim tão grande como pensa. Talvez seja altura de parar de jogar. Ou de não acreditar em quem lhe diz que “é impossível perder [dinheiro]” num certo “investimento fixe”. No caso dele, a solução talvez passe mesmo por curar a alma. Se guardar algum dinheiro no bolso, em vez de o desbaratar, é provável que os filhos comam frango ao jantar, em vez de terem de repetir as sandes da véspera.

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