Num mercado lento, com excesso de oferta e poucos compradores, todos os profissionais da mediação imobiliária precisam uns dos outros.

Os profissionais de mediação imobiliária sentem esta dificuldade no seu dia a dia, e é por isso que sabem que a partilha se torna cada vez mais fundamental, principalmente para quem trabalha com o comprador.

Os agentes imobiliários angariadores (ou seja, os profissionais dedicados à angariação de imóveis) que trabalham em regime de exclusividade partilham a sua angariação de forma natural. Até porque é um serviço que prestam ao seu cliente vendedor para serem capazes de cumprir o propósito de resolver a necessidade de venda ao seu cliente de forma mais rápida. Isto devido à capacidade de ampliar a abrangência de divulgação e captação de interesse que vai garantir mais procura para assegurar o melhor valor de mercado.

Foi precisamente num ciclo de mercado anterior que surgiu a célebre frase. “Mais vale 50% de alguma coisa, do que 100% de nada”. Convém, contudo, referir que o contexto do mercado era inverso ao atual, ou seja mais oferta de imóveis e menos procura.

O pleno, ou seja, a operação de transação sem partilha levada a cabo apenas pelo único agente imobiliário ou mediador que detém e trata do negócio – e que lhe garante o recebimento total da comissão -, nesta fase de mercado começa a ter alguma relevância, bem como a transação de imóveis em off-market (imóvel ou carteira de imóveis em venda, sem estarem a ser divulgados diretamente ao mercado nos canais habituais e mais visíveis). Esta prática é mais visível sobretudo no mercado premium ou de luxo, onde os canais de transação sempre exigiram confidencialidade e uma exposição muito especifica e controlada.

Hoje, a procura é maior do que a oferta disponível, e é por isso que as transações são muito mais rápidas e especulativas ao nível do preço.

Com alguma naturalidade, a angariação tornou-se cada vez mais desafiante, para não dizer mesmo difícil, e a prospeção, totalmente imprescindível, para alimentar compradores que surgem em maior número estimulados por taxas de juro (Euribor) que têm vindo a baixar, ou medidas governamentais que têm estimulado o acesso à compra para quem está ávido para o fazer. Um cliente fácil para o valor que o serviço de mediação imobiliária pode aportar, pois é este o cliente que vai necessitar de mais ajuda para resolver o seu problema: encontrar um imóvel para comprar.

Por isso, os profissionais que angariam bem também têm uma boa carteira de clientes compradores qualificados e começam, na minha opinião legitimamente, a dar prioridade à sua carteira de clientes compradores quando a sua angariação é assinada e entra em comercialização.

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Estratégias de partilha: O que está a mudar?

É natural que nesta fase as estratégias de partilha mudem. As vendas em off-market são um bom exemplo, e nada melhor do que citar a frase de Pedro Botelho, responsável da Gestora de Fundos Imobiliários Square AM: “Hoje um imóvel para venda, se estiver a preço, não chega sequer a estar no mercado”.

Também se assiste a uma sistematização em relação à partilha, ou seja, o sistema mudou e a informação do imóvel angariado para venda vai primeiro para os clientes em carteira desse angariador, depois para a agência onde ele trabalha, depois para a rede, e só em último para os profissionais de outras marcas ou empresas.

Se o negócio das agências imobiliárias é a transação, e se o mercado está numa fase de escoamento de produto mais rápida, a preço e até por vezes em overpricing, apetece dizer que hoje a realidade nua e crua é que: “100% de alguma coisa, é melhor do que 50%”.

Posso ir ainda mais longe, sempre em relação à partilha, e confirmar que se verifica que cada vez mais empresas de mediação e agentes não partilham, outros mudam política de partilha para repartição de comissão para 60%-40% ou 70%-30%, em vez dos tradicionais 50%-50% que acabam por ser uma percentagem muito típica e associada a mercados do comprador ou de equilíbrio, também denominados de mercados de reajustamento.

Todas as práticas aqui referidas fazem sentido quando contextualizadas no ciclo de mercado, mas todas têm, indubitavelmente, de ter uma coisa em comum para serem legitimas: a angariação terá de ser forçosamente em regime de exclusividade. Caso contrário, o agente imobiliário que não detém a angariação, sabendo que o imóvel existe e está em aberto, vai inevitavelmente direto à fonte e contratar com o proprietário, não podendo ser depois acusado de alguma falta de ética profissional, pois o proprietário está de facto disponível para contratar com qualquer agência e em número indeterminado. Afinal, é uma angariação em aberto.

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Responsabilidade de agentes e agências

Por fim, um último tema pouco falado sobre partilha: a responsabilidade de cada agente ou agência em relação ao cliente que representa.

No mercado quente como o de hoje, assiste-se muito à deslocação de profissionais daquele que é o seu mercado natural para conseguirem angariar ou trabalharem compradores, mesmo sem qualquer tipo de conhecimento ou experiência.

O propósito é o de ajudar o seu cliente, mas sobretudo é a possibilidade de conseguir uma comissão de maior valor que mais estimula.

Na minha opinião, é uma estratégia de risco, mas é legitima, principalmente para quem trabalha compradores, pois o comprador pode ter várias opções de compra em bairros e zonas diferentes, e até cidades.

O desafio é que, quando isto acontece, deve haver um verdadeiro e adaptado acompanhamento desse profissional ao seu cliente, não só em visitas físicas, como em todo o processo até a transação estar realmente concluída, ou seja, normalmente até ao dia da escritura. Mandar o cliente para o colega que detém a angariação na expectativa que ele trate de tudo não é uma prática correta, e ser pago na proporção de 50%-50% também não.

Foi por isso que os norte-americanos criaram os sistemas de referenciação em que a proporção da divisão de comissão é de 75%-25%, sendo os 25% para a empresa ou agente referenciador, o qual só tem de se preocupar na obtenção do cliente, na sua qualificação e no seguimento do restante serviço que terá de ser efetuado pelo colega que detém a angariação em parceria com ele.

Apesar de tudo, a mediação imobiliária em Portugal é das mais evoluídas da Europa e muito se deve às marcas norte-americanas que implementaram uma grande evolução e que, por isso, dominam o setor há mais de 25 anos em Portugal. Contudo, no que diz respeito aos sistemas de partilha e profissionalização reconhecida, ainda temos um caminho longo a percorrer, um caminho que passa essencialmente pelo entendimento prático do que se entende por conceitos de parcerias sempre com o propósito de prestar um melhor e mais relevante serviço ao cliente, sejam eles compradores ou vendedores.

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