De acordo com o artigo 239.º do Código do Trabalho (CT), existem situações específicas que afetam o número de dias de férias a que o trabalhador tem direito. Vamos explicá-las de forma simples:
A. Quando o trabalhador é admitido durante o ano
Quantos dias de férias tem direito nesse ano?
No ano em que começa a trabalhar, o trabalhador tem direito a 2 dias úteis de férias por cada mês completo de trabalho, até um máximo de 20 dias úteis. Pode começar a usufruir das férias após completar 6 meses de contrato.
Exemplos:
- Contrato iniciado a 10/02/2024:
- Em 2024: 20 dias úteis de férias (gozo possível a partir de 10 de agosto)
- Em 2025: 22 dias úteis de férias
- Contrato iniciado a 15/05/2024:
- Em 2024: 14 dias úteis de férias (gozo possível a partir de 15 de dezembro)
- Em 2025: 22 dias úteis de férias
- Contrato iniciado a 01/07/2024:
- Em 2024: 12 dias úteis (gozados a partir de janeiro de 2025)
- Em 2025: 30 dias (22 correspondentes a 2025 + dias relativos ao ano anterior, não podendo gozar mais de 30)
- Em 2026: 26 dias (22 relativos a 2026 + 4 ainda relativos a ano anterior)
Nota: O total de dias de férias a gozar no mesmo ano não pode ultrapassar 30 dias úteis.
- Contrato iniciado a 20/10/2024:
- Em 2024: 4 dias úteis (gozados a partir de 20 de abril de 2025)
- Em 2025: 26 dias (22 relativos a 2025 + 4 de 2024)
- Em 2026: 22 dias úteis
B. Quando o ano termina antes de o trabalhador completar 6 meses de contrato
Nestas situações, o trabalhador só poderá gozar as férias no ano seguinte, desde que já tenha completado os 6 meses de trabalho.
C. Contratos com duração inferior a 6 meses
Mesmo nestes casos, o trabalhador mantém o direito a 2 dias úteis de férias por cada mês completo de trabalho. O gozo pode ser feito antes de perfazer os 6 meses, desde que o contrato termine antes desse período.
D. Quando o trabalhador regressa ao serviço após uma ausência prolongada iniciada noutro ano
Neste caso, o direito a férias é calculado com base na duração efetiva do trabalho após o regresso.
E. No ano em que termina o contrato de trabalho
Aqui, o número de dias de férias (e o respetivo subsídio) é proporcional ao tempo efetivamente trabalhado nesse ano.
Exemplos:
- Contrato de 01/01/2022 a 30/06/2023:
- Se não tivesse cessado: 20 dias em 2022 e 22 dias em 2023
- Como cessou em 2023, o trabalhador tem direito a 33 dias (proporcionais)
Nota: Quando o contrato termina no ano seguinte ao da contratação, o total de férias não pode ultrapassar o valor proporcional à duração do contrato (art.º 245.º, n.º 3 do CT).
- Contrato de 01/01/2022 a 30/06/2024:
- 20 dias em 2022
- 22 dias em 2023
- 11 dias proporcionais em 2024
- Como o contrato não terminou no ano seguinte à contratação, não se aplica a limitação prevista no artigo 245.º, n.º 3.
Perguntas Frequentes
1. Se o trabalhador começar em dezembro, tem direito a 22 dias úteis no ano seguinte?
Sim. Mesmo começando em dezembro, a 1 de janeiro do ano seguinte vencem-se os 22 dias úteis de férias, a que se somam os 2 dias relativos a dezembro. Ou seja, terá direito a 24 dias úteis de férias nesse ano, mas nunca pode gozar mais de 30 dias úteis num só ano civil, salvo exceções previstas por convenções coletivas.
2. E se o trabalhador começar em janeiro e sair em junho do ano seguinte?
Neste caso, mesmo que a 1 de janeiro tenha direito aos 22 dias, como o contrato termina a meio do ano, o total de férias (e respetivo pagamento) será ajustado proporcionalmente ao tempo trabalhado (art.º 245.º, n.º 3).
F. Quando o trabalhador regressa após uma ausência prolongada por doença
Quantos dias de férias tem direito um trabalhador que esteve ausente por doença durante mais de 30 dias?
Sempre que um trabalhador estiver de baixa médica por mais de 30 dias seguidos, considera-se que o contrato de trabalho ficou suspenso, conforme o artigo 296.º do Código do Trabalho.
Se o impedimento começar num ano e terminar no seguinte, o trabalhador não tem direito automaticamente aos habituais 22 dias úteis de férias no início do novo ano. Em vez disso, ao regressar ao trabalho, ganha direito a férias como se estivesse no primeiro ano de contrato: ou seja, dois dias úteis de férias por cada mês completo de trabalho efetivo, até ao máximo de 20 dias (artigo 239.º, n.º 6).
Estes dias só podem ser gozados depois de cumpridos 6 meses completos de trabalho, mas caso esse período se complete depois do final do ano, o gozo pode ser feito até 30 de junho do ano seguinte.
Nota importante: Se o trabalhador já tiver direito a férias vencidas antes da baixa, e ainda não as tiver gozado, deve receber o valor correspondente a esses dias, mais o subsídio de férias.
Exemplo prático 1
Situação: Um trabalhador esteve de baixa de 1 de dezembro de 2023 até 30 de setembro de 2024.
- Férias de 2023: Tem direito aos 22 dias normais.
- Férias de 2024: Tem direito a 6 dias úteis, correspondentes a 3 meses completos (outubro, novembro, dezembro) x 2 dias por mês.
Explicação: Como não estava ao serviço no dia 1 de janeiro de 2024, não se vence o direito automático aos 22 dias de férias. Em vez disso, o direito é calculado com base no tempo efetivamente trabalhado após o regresso.
Exemplo prático 2
Situação: O trabalhador esteve de baixa entre março e agosto de 2024.
- Férias de 2024: Mantém o direito aos 22 dias de férias.
- Férias de 2025: Mantém os 22 dias também.
Justificação: Como a baixa começou e terminou no mesmo ano, e o trabalhador estava ao serviço em 1 de janeiro, não há alteração ao direito anual de férias.
E nas situações de licença parental ou acidente de trabalho?
Nestes casos, não há perda de direitos, nomeadamente o direito aos 22 dias úteis de férias. A diferença está apenas em quem paga os subsídios (férias e Natal):
- Licença parental: A entidade empregadora é responsável por pagar os subsídios.
No entanto, podem ser reduzidos proporcionalmente ao tempo de licença, sendo a diferença compensada pela Segurança Social se forem cumpridas as condições legais. - Acidente de trabalho: O trabalhador tem direito à compensação da perda de rendimento através das regras previstas na Lei dos Acidentes de Trabalho (Lei n.º 98/2009).
A indemnização pode incluir o valor proporcional aos subsídios de férias e Natal, consoante a gravidade e duração da incapacidade.
Exemplo prático 3
Situação: O trabalhador esteve de baixa de março a novembro de 2024.
- Férias de 2024: Mantém direito aos 22 dias, pois estava ao serviço a 1 de janeiro.
- Férias de 2025: Novamente, tem direito aos 22 dias, se estiver ao serviço em janeiro.
- Substituição do subsídio de Natal: A Segurança Social poderá pagar o proporcional ao tempo em que esteve de baixa.
Exemplo prático 4
Situação: O trabalhador esteve de baixa de agosto de 2024 até 30 de junho de 2025.
- Férias de 2024: Tem direito aos 22 dias vencidos a 1 de janeiro de 2024.
- Férias de 2025: Tem direito a 12 dias úteis (2 dias por cada mês de trabalho após o regresso – julho a dezembro).
Importante: Como perdeu parte do subsídio de férias por ter estado doente, a Segurança Social pode pagar uma prestação compensatória relativa aos dias não pagos pela entidade empregadora.
G. Cessação do Contrato de Trabalho
Quais os direitos do trabalhador relativamente às férias quando o contrato termina?
Segundo o artigo 245.º do Código do Trabalho, o trabalhador tem direito a férias proporcionais ao tempo de serviço prestado no ano em que o contrato termina. Em regra, são atribuídos 2 dias de férias por cada mês completo de trabalho nesse ano.
Além disso, o trabalhador tem direito a receber o valor correspondente às férias vencidas e não gozadas – ou seja, aquelas que venceram a 1 de janeiro e que, por algum motivo, não foram usufruídas até à cessação do contrato.
Se o trabalhador tiver gozado férias durante o período de aviso prévio, esse tempo não será pago novamente como compensação por férias não gozadas (conforme previsto no artigo 243.º, n.º 3 do Código do Trabalho).
É obrigatório gozar as férias vencidas durante o aviso prévio?
O empregador pode decidir que as férias vencidas sejam gozadas imediatamente antes da data de saída do trabalhador. No entanto, os dias de férias proporcionais ao tempo trabalhado no ano da saída não devem ser incluídos nesse gozo, a menos que haja acordo entre as partes.
H. Pagamento das Férias – Aspetos específicos
Qual o conceito de retribuição?
Nos termos do artigo 258.º do Código do Trabalho, a retribuição é tudo aquilo a que o trabalhador tem direito como contrapartida pelo seu trabalho. Inclui o salário base e outras prestações regulares e periódicas, pagas em dinheiro ou em espécie. Por norma, qualquer pagamento feito pelo empregador ao trabalhador presume-se como retribuição.
O que está ou não incluído na retribuição?
De acordo com o artigo 260.º do Código do Trabalho:
Não são considerados retribuição:
- Ajudas de custo, abonos de viagem, despesas com transporte ou de instalação, exceto quando essas prestações forem frequentes e façam parte habitual da compensação.
- Gratificações ou prémios pontuais por bons resultados.
- Prémios ligados ao desempenho, mérito ou assiduidade, desde que não estejam contratualmente garantidos.
- Participação nos lucros, desde que o trabalhador tenha uma retribuição fixa ou mista adequada.
São considerados retribuição (e contam para o cálculo de subsídios):
- Gratificações e prémios regulares e permanentes.
- Prestações associadas aos resultados da empresa que sejam pagas de forma habitual.
Cálculo do subsídio de férias
Segundo o artigo 264.º do Código do Trabalho, durante as férias, o trabalhador deve receber o valor que receberia se estivesse a trabalhar. Além disso, tem direito a um subsídio de férias que corresponde à retribuição base e a outras componentes relacionadas com a forma como o trabalho é prestado.
Componentes que entram no cálculo do subsídio de férias:
- Salário base
- Diuturnidades
- Isenção de horário
- Trabalho noturno
- Trabalho por turnos
- Trabalho suplementar (ver condições abaixo)
Componentes que não entram no cálculo:
- Ajudas de custo
- Abonos de viagem
- Subsídio de refeição, transporte ou representação
Fórmula para cálculo da retribuição horária (VRH):
(VR = (Rm x 12) : (52 x n))
Onde:
- Rm = Remuneração mensal bruta
- n = Número de horas semanais de trabalho (média)
Cálculo do subsídio de férias:
VRH x HTD x DF
Onde:
- VRH = Valor da retribuição horária
- HTD = Horário diário de trabalho (normalmente 8h)
- DF = Dias de férias
O trabalho suplementar conta para o subsídio de férias?
Sim, mas apenas se tiver sido prestado em, pelo menos, 11 meses no ano civil anterior à data em que as férias se vencem (1 de janeiro).
Contudo, o valor a incluir no cálculo do subsídio deve corresponder à média dos meses imediatamente anteriores ao momento em que o subsídio é pago (altura do gozo das férias), e não à média do ano anterior. Esta é a posição que tem vindo a ser seguida pela maioria dos tribunais.
Enquadramento fiscal e na Segurança Social
O subsídio de férias está sujeito a IRS e contribuições para a Segurança Social?
Sim.
- IRS: O subsídio de férias está sujeito a retenção na fonte de forma autónoma (art. 2.º do CIRS).
- Segurança Social: Também é sujeito a contribuições, exceto em regimes especiais (ex.: serviço doméstico), conforme o artigo 48.º do Código Contributivo.
Regras de retenção na fonte de IRS sobre o subsídio de férias (art.º 99.º-C do CIRS):
- A retenção é feita separadamente do salário do mês em que o subsídio é pago.
- Se o pagamento for faseado, a retenção deve ser feita proporcionalmente em cada prestação.
- Quando os subsídios pagos dizem respeito a anos anteriores, o apuramento do imposto é feito separadamente para cada ano.
Considerações finais
O regime jurídico das férias em Portugal, consagrado no Código do Trabalho, visa garantir o direito fundamental dos trabalhadores ao descanso, à recuperação física e mental e à conciliação entre a vida profissional e pessoal. No entanto, a aplicação prática deste direito comporta diversas especificidades, sobretudo em situações como admissões durante o ano, contratos de curta duração, ausências prolongadas, cessação do contrato de trabalho ou situações especiais como doença, parentalidade e acidentes de trabalho.
É fundamental que empregadores e trabalhadores estejam devidamente informados sobre os seus direitos e deveres, evitando conflitos e assegurando o cumprimento da legislação laboral. A correta contabilização dos dias de férias, o seu gozo dentro dos prazos legais e o pagamento justo dos respetivos subsídios são aspetos cruciais para a manutenção de relações laborais equilibradas e justas.
Em caso de dúvidas ou de situações complexas, é recomendável o recurso a apoio jurídico ou ao aconselhamento por parte das entidades competentes, como a Autoridade para as Condições do Trabalho (ACT). O conhecimento e a aplicação correta das normas permitem não só proteger os direitos dos trabalhadores, mas também promover uma cultura organizacional mais transparente, responsável e respeitadora da lei.
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