Com a aproximação do verão, muitos portugueses começam a gozar as merecidas férias. Este é um direito dos trabalhadores, consagrado na Constituição portuguesa e regulamentado pelo Código do Trabalho.
Conheça as regras e tire todas as suas dúvidas sobre o direito às férias.
1 – Quais são os instrumentos que regulam o regime das férias?
As relações de trabalho no setor privado são reguladas, principalmente, pelo Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro. Desde então, este diploma legal tem sido alvo de várias alterações, sendo uma das mais recentes e relevantes a introduzida pela Lei n.º 13/2023, de 3 de abril.
No que diz respeito ao tema das férias, é importante destacar o artigo 237.º do Código do Trabalho, especialmente o n.º 4, que estabelece que o direito a férias deve permitir ao trabalhador recuperar física e psicologicamente, bem como garantir tempo para a vida pessoal, familiar e social.
Além da lei laboral, o direito a férias está igualmente consagrado na Constituição da República Portuguesa, mais concretamente na alínea d) do n.º 1 do artigo 59.º. Este artigo assegura que todos os trabalhadores têm direito ao descanso, ao lazer, a um limite máximo da jornada de trabalho, ao descanso semanal e a férias pagas e periódicas, sem qualquer discriminação.
Além do Código do Trabalho e da Constituição, há outros instrumentos que também regulam o direito a férias. São eles:
- A Constituição da República Portuguesa, que consagra este direito fundamental;
- O Código do Trabalho, que define regras concretas sobre o gozo e a duração das férias;
- Os Instrumentos de Regulamentação Coletiva de Trabalho, como convenções coletivas aplicáveis a determinados setores ou empresas, desde que tragam condições mais favoráveis para os trabalhadores;
- O Contrato de Trabalho, que pode prever condições específicas, desde que respeite o que está estabelecido na legislação e nos acordos coletivos.
Resumidamente, estes quatro instrumentos – Constituição, Código do Trabalho, instrumentos coletivos e contrato individual – articulam-se para garantir que o direito a férias seja cumprido, respeitando os interesses dos trabalhadores e a legalidade.
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2 – Quando é que o trabalhador ganha direito a férias?
De forma geral, o trabalhador adquire o direito a férias no dia 1 de janeiro de cada ano, com base no trabalho realizado no ano civil anterior. Este direito não depende da presença regular no trabalho ou da assiduidade (art.º 237.º, n.º 1 do Código do Trabalho).
3 – Quantos dias de férias tem um trabalhador por ano?
A duração mínima anual das férias é de 22 dias úteis (art.º 238.º, n.º 1).
Para este efeito, dias úteis são de segunda a sexta-feira, excluindo os feriados (n.º 2 do mesmo artigo).
Se o trabalhador folgar em dias úteis, podem ser contados como dias de férias os sábados ou domingos que não sejam feriados.
4 – É possível trocar os dias de férias por dinheiro?
Não. O direito a férias é obrigatório e não pode ser substituído por pagamento.
Segundo o art.º 237.º, n.º 3, o trabalhador não pode abdicar das férias, mesmo que haja acordo com a entidade patronal.
Exceção: O trabalhador pode prescindir de dias de férias que ultrapassem os 20 dias úteis, nos casos em que as férias dizem respeito ao ano de admissão, mantendo o pagamento relativo a esse período (art.º 238.º, n.º 5).
5 – E se o trabalhador não gozar as férias?
Se o empregador impedir, com culpa, o trabalhador de tirar férias, este tem direito:
- A receber três vezes o valor da retribuição correspondente ao período de férias não gozado, além do pagamento normal das férias e respetivo subsídio.
- A gozar essas férias até ao dia 30 de abril do ano seguinte.
Esta compensação está isenta de descontos para a Segurança Social (art.º 48.º do Código Contributivo).
6 – Como é feita a marcação das férias?
As férias devem ser marcadas por acordo entre o trabalhador e a entidade empregadora (art.º 241.º, n.º 1).
Se não houver acordo, o empregador pode defini-las sozinho, com as seguintes regras:
- Só entre 1 de maio e 31 de outubro;
- Não podem começar num dia de descanso semanal;
- Pode haver exceções previstas em acordos coletivos ou com parecer favorável dos representantes dos trabalhadores (art.º 241.º, n.º 2).
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7 – O que é o mapa de férias e quando deve ser feito?
O mapa de férias deve indicar o início e o fim das férias de cada trabalhador.
Tem de ser afixado até 15 de abril e mantido no local de trabalho até 31 de outubro (art.º 241.º, n.º 9).
A sua afixação deve ser feita em local visível e acessível, e a omissão pode resultar numa coima entre 204 e 1.530 euros.
8 – É possível acumular férias para o ano seguinte?
Sim, de forma excecional:
- É possível gozar todas as férias até 30 de abril do ano seguinte, com ou sem acumulação com as do novo ano;
- Também é possível, por acordo, gozar metade das férias em qualquer altura do ano seguinte, acumulando com o novo período de férias (art.º 240.º).
Se o trabalhador quiser tirar férias com familiares que vivem no estrangeiro, pode decidir sozinho acumular férias nesses moldes.
9 – E se a empresa encerrar para férias?
A empresa pode fechar para férias nos seguintes casos (art.º 242.º):
- Até 15 dias consecutivos entre 1 de maio e 31 de outubro;
- Por mais tempo, se estiver previsto num acordo coletivo ou com parecer da comissão de trabalhadores;
- Durante 5 dias úteis no Natal (férias escolares);
- Em pontes (por exemplo, entre feriado e fim de semana), uma vez por ano.
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10 – Os trabalhadores do setor do turismo têm regras especiais?
Sim. Nestas empresas, só 25% das férias têm de ser gozadas entre maio e outubro. Os restantes 75% podem ser marcados noutro período do ano (art.º 241.º, n.º 3).
11 – Trabalhadores casados ou que vivam juntos e trabalham no mesmo local podem tirar férias ao mesmo tempo?
Sim, desde que isso não cause prejuízos ao funcionamento da empresa (art.º 241.º, n.º 7).
12 – É obrigatório gozar férias de forma seguida?
É obrigatório gozar pelo menos 10 dias úteis seguidos (art.º 241.º, n.º 8).
Exceção: trabalhadores-estudantes, que podem dividir os dias de férias conforme o seu calendário escolar (art.º 92.º).
13 – Se o trabalhador adoecer durante as férias, o que acontece?
O trabalhador deve comunicar a situação de doença para poder remarcar os dias de férias não gozados.
Se a doença se prolongar por mais de 30 dias, o contrato de trabalho considera-se suspenso (art.º 296.º). Quando regressar, se a suspensão tiver atravessado o final do ano, o direito a férias renova-se como se estivesse no primeiro ano de contrato: 2 dias úteis por cada mês completo de trabalho (art.º 239.º, n.º 6).
14 – Pode o trabalhador ou o empregador alterar as férias já marcadas?
Sim, ambos podem alterar:
- O trabalhador pode pedir alteração (art.º 244.º);
- O empregador só pode fazê-lo por razões muito importantes para a empresa, e deve compensar o trabalhador pelos prejuízos causados (art.º 243.º).
Mesmo em caso de interrupção, o trabalhador tem direito a gozar pelo menos metade do período total de férias de forma seguida.
Considerações finais
As férias são um direito fundamental dos trabalhadores que visa assegurar o bem-estar físico, psicológico e social de quem trabalha. O seu cálculo e pagamento do respetivo subsídio devem respeitar regras claras, que se encontram bem definidas no Código do Trabalho, na Constituição da República Portuguesa, e, em certos casos, em instrumentos de regulamentação coletiva e no próprio contrato de trabalho.
Este direito está sujeito a diversas particularidades, especialmente em situações como cessação do contrato, gozo interpolado ou existência de trabalho suplementar. É, por isso, essencial que empregadores e trabalhadores estejam devidamente informados sobre as normas aplicáveis, a fim de evitar conflitos e assegurar o cumprimento da lei.
Em suma, o gozo de férias e o respetivo subsídio não são meros privilégios, mas sim componentes essenciais da dignidade no trabalho. Cabe a todos – empresas, profissionais de contabilidade, recursos humanos e trabalhadores – garantir que estes direitos sejam exercidos com responsabilidade, justiça e clareza.
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