Obrigações, ações e dinheiro. Que peso devem ter na sua carteira?

A alocação de ativos deve ter em conta o seu perfil de investidor, o objetivo do investimento e o horizonte temporal. Diversifique a carteira.

Fazer uma boa alocação de ativos é essencial para ter sucesso nos seus investimentos. Aumenta a probabilidade de ter retornos positivos e minimiza o risco de estar exposto em demasia a uma classe de ativos. Permite, por isso, cumprir uma das regras fundamentais para os investidores: diversificar a carteira. Mas uma boa alocação de ativos vai mais além da simples diversificação dos investimentos.

Mas, afinal, o que é isso da alocação de ativos, um “palavrão” muito utilizado nos mercados (asset allocation, na expressão em inglês), sobretudo entre os profissionais da gestão de ativos? Trata-se da divisão de uma carteira de investimentos por diferentes ativos, com uma ponderação específica para cada um deles.

Se quisermos comparar de uma forma simplista, é como preparar uma refeição. Não será boa ideia colocar só arroz no prato, ou apenas um pedaço de carne ou peixe. Será mais saudável juntar outro acompanhamento, como uma salada. Para uma refeição completa que o satisfaça da melhor forma possível, também será conveniente comer uma entrada e/ou uma sobremesa, juntar uma bebida, etc.

Todos estes ingredientes podem ser consumidos nas porções que desejar, sendo certo que se exagerar nalgum deles pode dar mau resultado. Se colocar demasiado sal, pode arruinar o sabor da proteína. Ainda assim, pode ser que a boa sobremesa que escolheu acabe por compensar.

Quanto mais diversificada for a alimentação, maior a probabilidade de ser saudável. Na alocação de ativos a lógica é a mesma. Escolher os ativos que se quer investir e definir a porção de dinheiro que vai colocar em cada um. Se escolher o que vai comer é uma tarefa trivial, fazer uma alocação de ativos ao seu gosto exige primeiro que responda a algumas perguntas essenciais.

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Conhecer o seu nível de risco

Homem com uma calculadora na mão, em frente a um outro homem a discutir estratégias de investimento

A primeira de todas: qual o nível de risco que está disposto a tolerar? É essencial avaliar que tipo de investidor é. Há várias formas de saber se é um investidor conservador, moderado, dinâmico ou arrojado. A melhor opção passa por recorrer à sua instituição financeira, que tem o dever de lhe oferecer as melhores soluções tendo em conta o seu perfil. Existem também muitos conteúdos que o ajudam a perceber em que perfil de risco encaixa, como este do Todos Contam (Plano Nacional de Formação Financeira), ou este do Doutor Finanças.

Apesar de ter descoberto qual o seu perfil de risco, não sabe ainda qual o risco que deve ter a sua carteira. É também fundamental que tenha bem claro qual o objetivo do seu investimento. Vai aplicar as poupanças para comprar uma casa nova, pagar o curso do seu filho, fazer aquelas férias com que sonha há anos, ou para preparar a sua reforma? Os objetivos podem ser bem distintos e têm, por isso, um impacto relevante na sua estratégia de investimento e o risco que pode/deve assumir.

A terceira questão está diretamente ligada à anterior. Qual o horizonte temporal do seu investimento? É para a viagem que quer fazer daqui a 3 anos, para a casa que quer comprar daqui a 10 anos, ou para a reforma que espera atingir dentro de 30 anos?

Quanto mais longo for o prazo do seu investimento, mais risco deve assumir na sua carteira. Se está a investir a 20 anos não terá de se preocupar demasiado com a volatilidade, ou com perdas potenciais na fase inicial da aplicação. Os dados históricos mostram que as ações são a classe de ativos com os retornos mais elevados no longo prazo, pelo que quanto mais longo for o prazo, maior deve ser a parcela da carteira aplicada no mercado acionista.

No que às questões diz respeito, falta ainda responder a uma. Quer optar por uma gestão ativa da sua carteira, investindo diretamente nos ativos que selecionar? Ou prefere que a tarefa seja efetuada pelo seu banco, que lhe vai propor a melhor solução conforme as orientações que fornecer?

A gestão passiva pode ser mais adequada se não tiver conhecimentos, mas num investimento de longo prazo a gestão ativa de uma carteira não lhe roubará muito tempo, sobretudo se a alocação de ativos for efetuada da forma correta no início. Pode também optar pelo meio caminho, investindo em fundos de investimento que reflitam a alocação de ativos que pretende.

Continuando na analogia da alimentação, a escolha está entre fazer a sua comida, ou ir ao restaurante.

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Que ativos escolher

A alocação de ativos clássica divide as opções apenas em três classes: ações de empresas cotadas, obrigações corporativas (emitidas por empresas) ou soberanas (emitidas por países) e títulos de muito curto prazo ou depósitos, que são equiparados a dinheiro. As ações são o ativo mais arriscado, seguindo-se as obrigações e depois os produtos de capital garantido.

O atual momento dos mercados financeiros até parece retirar importância à estratégia da alocação de ativos, pois todas as classes estão nesta altura com desempenhos negativos em termos reais. Porquê diversificar em várias classes se estão todas a gerar perdas? Numa carteira de longo prazo, o investidor não deve atribuir demasiada importância a fatores conjunturais e esta tendência de convergência no retorno das ações e obrigações não vai durar para sempre.

Ainda assim, a elevada inflação está a ameaçar uma das estratégias de alocação de ativos que muitos profissionais dos mercados classificavam de “sagradas” para uma carteira de risco moderado. Há já várias décadas que muitos gestores de ativos atribuem uma ponderação de 60% às ações nos seus portefólios, com os restantes 40% a serem aplicados em obrigações (carteira 60/40).

As ações tendem a registar um melhor desempenho em períodos de crescimento económico robusto e o inverso quando atividade económica enfraquece. Já as obrigações, historicamente, apresentam um comportamento contrário, o que permite mitigar o risco da carteira. Quando as ações descem, as obrigações compensam.

A atual conjuntura de subida acentuada da inflação, conjugada com a expectativa de que vai persistir em níveis elevados, levou já vários analistas a colocar em causa esta estratégia, sobretudo porque representa uma ameaça aos retornos do mercado de obrigações.

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Diversificar dentro das classes

A alocação de ativos e a diversificação de uma carteira vai além da sua ponderação por três classes de ativos. Faz sentido não se ficar por ações, obrigações e cash, procurando ativos que podem apimentar a sua carteira, como matérias-primas, imobiliário e até criptomoedas, desde que na proporção certa e se tiver conhecimentos sobre estas classes.

Num ano em que está a ser difícil encontrar classes de ativos com retornos positivos, as matérias-primas são das poucas exceções. Mas os investidores também conseguem essa maior diversificação dentro das classes de ativos clássicas. Por exemplo, comprar ações de produtoras de energia permite uma exposição ao bom desempenho das matérias-primas.

É, por isso, importante fazer uma boa diversificação nas ações e obrigações, em termos de setores, geografias, tipo de empresas (valor ou crescimento), etc. Regressando ao exemplo da gastronomia, será bem mais agradável ir variando no tipo de proteína que consome, escolhendo diferentes acompanhamentos, sobremesas, bebidas, etc.  

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Três perfis e três classes

mulher em frente a vários ecrãs com gráficos de investimentos e a analisar as mais-valias em investimentos para preencher o anexo E do IRS

Em baixo encontra uma alocação de ativos clássica tendo em conta apenas três classes de ativos e três perfis de risco, com uma breve descrição. As parcelas aplicadas a cada classe podem variar conforme as indicações das instituições financeiras, mas não oscilam muito face aos valores sugeridos em baixo.

Conservador

Dinheiro 30%

Obrigações 50%

Ações 20%

É um investidor que privilegia a preservação do capital e está disposto a assumir apenas um reduzido nível de risco e volatilidade. Não está habituado a investir, precisa do dinheiro no espaço de cinco anos e fica satisfeito se conseguir retornos reais positivos, ou seja, superiores à inflação. Só tolera uma perda de capital mínima e, se for muito conservador, o peso das ações na carteira deverá ser inferior a 20% e as cotadas selecionadas sevem ser defensivas.

Moderado

Dinheiro 10%

Obrigações 40%

Ações 50%

Investidor que procura um equilíbrio entre preservação do capital e valorização da carteira. Aceita um nível moderado de risco e volatilidade e procura uma diversificação abrangente do investimento. Procura um retorno acima dos que são oferecidos pelos produtos de capital garantido e tem um conhecimento razoável de mercados.

Agressivo

Dinheiro 5%

Obrigações 25%

Ações 70%

Habitualmente é um investidor experiente e que procura rendibilidades elevadas, estando, por isso, disponível para assumir maior risco e preparado para aceitar uma maior volatilidade da sua carteira. Está focado no longo prazo e não necessita do dinheiro investido no prazo de 10 a 15 anos. Um investidor muito agressivo dá preferência a ações de mercados emergentes e de empresas de baixa capitalização, que são mais voláteis, mas também oferecem retornos (e perdas) potenciais mais altos.

Esta alocação de ativos deve ser entendida como uma mera referência para o seu perfil de risco, que deverá ajustar tendo em conta as respostas às outras questões que deixamos neste artigo. Pensando sempre que quanto maior for o prazo, maior deve ser o risco assumido.

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Nasceu em 1977, sendo jornalista desde 1999. Iniciou a carreira no Jornal de Negócios, onde esteve mais de 20 anos, ocupando várias funções, sempre com foco no online. Atualmente é jornalista independente, assina a newsletter diária de mercados Morning Call e colabora de forma regular com o ECO. Formado em Gestão no ISEG, tem especial interesse por tudo o que está relacionado com os mercados financeiros.

A informação que consta no artigo não é vinculativa e não invalida a leitura integral de documentos que suportem a matéria em causa.

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