“Se os outros se atirassem de uma ponte, tu também te atiravas?”. Esta frase ou outras semelhantes devem ter ecoado na infância e adolescência de muitos. O objetivo era simples: ilustrar que não se devia fazer algo apenas porque os amigos também faziam.
Mas não temos de guardá-la no passado, naquela altura em que a peer pressure e a vontade de fazer igual aos outros estavam no auge. Podemos trazê-la para a vida adulta, de forma a mantermos sempre uma atitude crítica em relação àquilo que ouvimos e lemos.
Serve para todas as áreas da nossa vida, incluindo o dinheiro. Procurar conselhos financeiros pode ser útil, mas o filtro deve estar sempre ativo.
Cada pessoa tem o seu contexto
Os conselhos podem chegar de qualquer lado. De um familiar, de um amigo ou até da internet. Neste último caso, pode ir desde as redes sociais até a fóruns online.
Em Portugal, existe até uma comunidade no Reddit com quase 120 mil membros a discutir temas de literacia financeira. Neste último caso, as regras da comunidade proíbem mesmo a discussão sobre investimentos especulativos e aconselha-se os participantes a não aceitarem recomendações financeiras.
Seja qual for o meio, esta partilha de informação é, à partida, importante e positiva. No entanto, devemos sempre manter um espírito crítico.
Quando falamos com amigos e familiares, podemos receber conselhos sobre qual o melhor banco para abrir conta, o melhor cartão de crédito, a melhor forma de organizar as finanças no dia a dia ou até aquele investimento que temos mesmo de fazer.
Ainda assim, não devemos aceitá-los acriticamente e fazer o mesmo só porque alguém disse que era bom. Isso seria correr um risco, uma vez que não temos todos o mesmo perfil e contexto financeiro.
Aquela pessoa que nos diz para abrir uma conta bancária com certas características não tem necessariamente as mesmas necessidades que nós. Do mesmo modo, quem nos aconselha a investir num determinado produto financeiro pode te rum perfil de investidor e objetivos diferentes.
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As redes sociais e a emergência dos finfluencers
Atualmente, as redes sociais são uma das principais fontes de informação e muitas pessoas encontram inspiração em redes como o Instagram ou o Tiktok. Essa busca pode incluir destinos de férias, bens de consumo ou restaurantes, por exemplo.
Mas não só. A área do aconselhamento financeiro começa a ganhar cada vez mais peso e expressão nas redes sociais. De acordo com o Relatório Anual de 2024 da CMVM – Comissão do Mercado de Valores Mobiliários, “foram identificados 33 finfluencers, que fornecem informação sobre instrumentos financeiros a investidores nacionais nas redes sociais”.
Mas o que é um finfluencer? É um influencer que promove produtos financeiros. O problema, diz a CMVM no seu Guia do Investidor, é que “nem todos os finfluencers têm os conhecimentos e qualificações necessárias” e podem abordar “de forma superficial e incompleta temas complexos, que requerem uma análise mais profunda”.
Como consequência, alguns seguidores podem acabar por tomar decisões financeiras desadequadas e perder dinheiro.
Outro problema, aponta o regulador dos mercados financeiros, é o facto de alguns destes influencers receberem uma compensação por promoverem investimentos ou instrumentos financeiros, “mas sem divulgar o conflito de interesse subjacente de maneira adequada”.
Não invista no que não percebe
Se andar pelas redes sociais e vir alguém a promover investimentos com retornos rápidos e expressivos, pense duas vezes. No mundo financeiro é improvável que haja grandes retornos (e rápidos) sem risco. E se a promessa for a de enriquecer quase de um mês para o outro, é mesmo caso para desconfiar.
Acima de tudo, não invista no que não percebe. Se o fizer, pode estar apenas a criar uma fonte de stress e ansiedade, além de correr o risco de perder dinheiro por não saber como gerir aquilo em que investiu.
Saiba qual o seu perfil de investidor e defina objetivos. Quer o dinheiro daqui a dois anos ou pode esperar 10 ou 15? Tudo isto é importante para perceber qual o melhor produto para si. Além disso, não se esqueça de diversificar a sua carteira (sobretudo, não ponha todo o dinheiro em produtos de alto risco).
Claro que pode procurar informações em fóruns e nas redes sociais para tentar perceber como foram as experiências de outros investidores. No entanto, deve filtrar bem aquilo que consome e confirmar as informações junto de fontes oficiais.
Se um determinado produto lhe parecer interessante, não invista de forma cega e impulsiva. Leia as fichas informativas disponibilizadas pelas entidades emitentes e faça a sua própria pesquisa.
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CMVM está atenta ao mundo digital
Em 2024, a CMVM analisou mais de 150 conteúdos e 20 horas de vídeo dos 33 influencers que promovem instrumentos financeiros em Portugal. O regulador identificou “32 indícios de incumprimento na publicidade divulgada e 28 indícios de atividade de prospeção de clientes”.
Num outro documento, divulgado em março de 2025, a CVMV alerta que os intermediários financeiros que recorrem a finfluencers “devem estar cientes que os conteúdos produzidos e divulgados através de canais digitais (incluindo redes sociais) podem encontrar-se sujeitos à legislação aplicável ao mercado de capitais e, desse modo, enquadrarem-se enquanto serviços ou atividades reguladas, sujeitas à supervisão da CMVM”.
Além disso, “a obrigatoriedade de autorização e registo para o exercício do serviço de consultoria para investimento aplica-se a qualquer pessoa ou entidade, independentemente de atuar (ou não) através das redes sociais ou ser (ou não) finfluencer“.
