Fachada de edifício de apartamentos

Viver em condomínio é uma experiência comum para muitas pessoas, mas, ao mesmo tempo, pode ser um desafio, tanto prático, quanto jurídico. As relações entre vizinhos, as decisões tomadas nas assembleias e as obrigações legais são frequentemente fontes de mal-entendidos. Muitos condóminos deparam-se com dúvidas que, embora comuns, nem sempre têm respostas simples.    

Vamos esclarecer algumas das questões mais frequentes em relação à vida em condomínio, desmistificando conceitos e proporcionando uma visão clara da legislação.

1 – “Não uso o elevador, tenho de pagar na mesma?”

Situação: O Pedro nunca utiliza o elevador do prédio, preferindo subir pelas escadas. Ele questiona-se: “Porque devo pagar pelas despesas de manutenção do elevador se nunca o uso?”

Questão: É justo que um condómino que não utiliza o elevador, tenha de pagar pela sua manutenção?    

Enquadramento legal:  A legislação portuguesa, no Artigo 1424.º, n.º 4 do Código Civil, refere expressamente: “Nas despesas dos ascensores só participam os condóminos cujas frações por eles possam ser servidas”. Isto significa que não é o uso efetivo que determina a obrigação de pagamento, mas sim a possibilidade de utilização. A norma não exige que o condómino utilize o elevador ou que dele necessite, apenas que a sua fração, em abstrato, possa aceder a este meio.   

Resolução:  Assim, uma fração situada no rés-do-chão pode estar isenta destas despesas, mas apenas se for comprovado que não tem qualquer acesso, direto ou indireto, a zonas comuns servidas pelo elevador, como garagens ou arrecadações. Caso exista essa ligação, ainda que o elevador não seja usado, o condómino pode ter de comparticipar nos encargos — pela simples potencialidade de utilização.

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2 – “O meu apartamento está desocupado. Tenho de pagar o condomínio na mesma?”

SituaçãoA Ana tem o apartamento desocupado há vários meses e pergunta-se se, por não o utilizar, ainda está obrigada a pagar as quotas de condomínio.    

Questão:  Se não estou a usar o meu apartamento, posso deixar de pagar as despesas do condomínio?   

Enquadramento legal:  Nos termos do Artigo 1424.º do Código Civil, todos os condóminos são responsáveis pelas despesas de conservação e fruição das partes comuns, bem como pelos serviços de interesse comum (como limpeza, luz das escadas, manutenção, etc.), independentemente da ocupação ou utilização efetiva da fração. O valor a pagar é, por regra, proporcional ao valor da fração no prédio, salvo disposição contrária no regulamento do condomínio devidamente aprovado.    

Resolução:  Sim, a Ana tem de continuar a pagar as quotas do condomínio. A desocupação do imóvel não isenta do pagamento, porque os encargos mantêm-se para garantir o funcionamento e conservação das áreas comuns, que beneficiam todos os condóminos, estejam ou não a residir no prédio.    

Nota:  Em alguns casos, o regulamento de condomínio pode prever critérios diferenciados para certas despesas, mas isso requer aprovação unânime ou por maioria qualificada, conforme previsto no próprio artigo.

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3 – “Posso fazer obras na minha fração sem pedir autorização?”

Situação: O João decidiu fazer obras no interior do seu apartamento, incluindo a substituição das instalações elétricas e a remoção de uma parede interna. Não informou a administração nem consultou a assembleia de condóminos.    

Questão: É necessário pedir autorização para obras dentro da fração ou pode o condómino agir livremente?    

Enquadramento legal:  Por princípio, cada condómino é livre para realizar obras no interior da sua fração, desde que estas não prejudiquem a estrutura do edifício, nem afetem a segurança, a linha arquitetónica, a estética ou a utilização dos bens comuns. Esta liberdade decorre da titularidade plena sobre a fração autónoma. Contudo, obras que impliquem alterações na fachada, em partes comuns ou na estrutura do edifício, como a remoção de paredes estruturais ou a modificação de canalizações ou instalações elétricas comuns, exigem autorização prévia da assembleia de condóminos. Além disso, em certos casos, pode também ser necessário licenciamento camarário e posterior alteração do título constitutivo da propriedade horizontal.   

Resolução: O João deve pedir autorização para obras que afetem elementos estruturais ou bens comuns, como paredes mestras, canalizações partilhadas, ou instalações técnicas do prédio. A realização de obras sem essa autorização pode implicar responsabilidade civil por danos causados e a obrigação de repor a situação anterior, caso as intervenções sejam consideradas ilegais. Mesmo que as obras não exijam formalmente autorização, existem boas práticas que todos os condóminos devem respeitar.

É recomendável: informar previamente a administração do condomínio; afixar no prédio um aviso visível com a indicação da duração prevista da obra e horários de maior ruído; assegurar que as obras decorrem apenas em dias úteis, entre as 8h00 e as 20h00, minimizando o incómodo aos vizinhos (respeitando ao Regulamento Geral do Ruído).

4 – “Tenho de pagar obras mesmo não tendo concordado?”

Situação: A Maria é condómina num prédio onde foi aprovada, em assembleia, uma obra de melhoria nas partes comuns. Como votou contra, questiona se é obrigada a pagar a sua parte nas despesas, apesar de não concordar com a decisão.    

Questão:  Se não concordo com as obras decididas em assembleia, sou obrigado(a) a pagar?    

Enquadramento legal:  Nos termos do Artigo 1424.º do Código Civil, todos os condóminos são responsáveis pelo pagamento das despesas relativas à conservação e fruição das partes comuns do edifício, em proporção ao valor das suas frações, mesmo que tenham votado contra a deliberação. A única exceção ocorre quando a decisão não cumpre os requisitos legais ou não respeita o quórum necessário.    

Adicionalmente, o Artigo 1427.º permite que, em casos de reparações urgentes e indispensáveis, qualquer condómino possa avançar com a intervenção necessária, devendo depois ser feita a regularização da despesa entre todos os beneficiários.    

Resolução:  Sim, a Maria está legalmente obrigada a pagar a sua parte nas obras, desde que a deliberação da assembleia tenha sido tomada de forma válida, respeitando as regras de quórum e votação previstas na lei. A sua discordância não a isenta do dever de contribuir para as despesas comuns, pois o condomínio funciona com base em decisões coletivas.    

Nota:  Se a Maria entender que a obra não respeita os requisitos legais ou foi aprovada de forma irregular, poderá impugnar a deliberação judicialmente, no prazo de 60 dias a contar da data em que teve conhecimento da decisão (Artigo 1433.º do Código Civil).

Em suma, viver em condomínio exige, acima de tudo, conhecimento das obrigações legais e dos direitos que cada condómino tem. A legislação é clara em muitos pontos, mas a sua aplicação nem sempre é intuitiva. Evitar mal-entendidos e tomar decisões informadas nas assembleias é essencial para garantir a boa convivência e evitar litígios dispendiosos.    

Lembre-se de que a informação é a melhor forma de se proteger juridicamente. Conhecer os seus direitos e deveres ajudará a viver em harmonia no seu condomínio e a tomar decisões mais acertadas.

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A informação que consta no artigo não é vinculativa e não invalida a leitura integral de documentos que suportem a matéria em causa.

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