Poupança

Para os antigos, o ganho está mesmo no poupar

Não faltam provérbios a ensinarem-nos a técnica da poupança. E se quisermos saber como se ganha o dinheiro que depois se põe de lado?

Segundo o Dicionário da Língua Portuguesa Contemporânea, a palavra “poupar” deriva do latim palpare, “tocar suavemente”, e pode assumir vários sentidos. Para o caso, centremo-nos numa só definição: “Gastar ou usar de forma moderada e com parcimónia, para fazer durar mais tempo”. Estamos, portanto, perante o ato de “não gastar todo o dinheiro que se recebe, amealhando a diferença”. Ou, mais simples ainda, o ato de economizar.

Assim, alguém que seja poupado é alguém económico, o oposto dos esbanjadores, dos gastadores. Será graças a essa característica de gastar moderadamente que, eventualmente, uma pessoa consegue gerar uma “poupança”, termo que o mesmo volume da Academia das Ciências de Lisboa define assim: “Proveito que resulta de gastar com parcimónia; dinheiro acumulado e posto de reserva”. À partida, poderíamos pensar que ser poupado corresponde a traço humano positivo. Porém, o mesmo verbete diz-nos que esse pecúlio amealhado também pode ser sinal de estarmos perante uma pessoa avara ou mesquinha: alguém que, simplesmente, tem aversão a gastar dinheiro.

O famoso grão a grão…

Para juntar os dois conceitos numa só frase, nada como a sabedoria popular: “A economia, propriamente tal, ocupa o meio entre a avareza e a prodigalidade”. Ou seja, nem forreta, nem perdulário. Mas, sem darmos conta, saltámos um passo importante. É que, antes de gastar as economias, é preciso tê-las. Como se pode, então, conseguir esse pé-de-meia? Atualmente, talvez a máxima mais ouvida seja a do “grão a grão, enche a galinha o papo”. Cada cêntimo pode contar, mas talvez seja preciso mais do que uns tostões para chegar a outra versão deste provérbio: “Grão a grão, também se chega a um milhão”. Demasiado ambicioso? Encontrámos uma hipótese mais comedida: “De pequenos grãos, se ajunta grande monte”.

“Forrar dinheiro” é coisa que tem séculos

Saiamos das metáforas envolvendo capoeiras e celeiros para vermos exemplos mais diretos ao assunto. Trocado por miúdos, o provérbio anterior significa que “as pequenas economias fazem as grandes fortunas”, se bem que talvez estejamos outra vez a tentar alcançar as estrelas em vez de nos concentrarmos antes nas nuvens. Perestrello da Camara, em 1848, já nos relembrava na sua Collecçao de Proverbios, Adagios, Rifãos, Anexins, Sentenças Morais e Idiotismos da Lingoa Portugueza que «forrar dinheiro» era economizá-lo. “No poupar é que está o ganho” ainda se usa bastante, mas já caiu em desuso o provérbio que recorria à antiga moeda da monarquia: “Um real poupado, é um real ganhado”.

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O segredo da poupança? Ora, ora, é poupar!

Se poupar é um desafio, ganhar uns trocos também o é. Para tudo é necessário engenho e suor. “Ganhai o que souberdes e poupai o que puderdes”, relembra o major Hespanha, no seu Dicionário de Máximas, Adágios e Provérbios, edição de 1936. No entanto, será de notar que nos ditados associados à poupança não abundam as receitas específicas sobre como antes gerar dinheiro. O esforço concentra-se na arte de poupar. Eis quatro exemplos de rajada, retirados de vários dicionários:   

“Não há lucros mais seguros, que os lucros da economia”

“O melhor meio de ganhar é poupar”

“Quem não poupa, não tem”

“Do poupar vem o ter”

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Três formas de obter capital

Mesmo que sejam bons conselhos, talvez precisássemos de diretrizes concretas para obtermos o que poupar, não? Eis algumas orientações possíveis neste campo da poupança. Primeiro: “Paga o que deves e poupa o que fica”. Segundo: “De onde se tira e não se põe, falta faz”. Terceiro: “Quem, na despesa, é frugal, logo aumenta o capital”. O que o povo diz… as taxas de juro podem contrariar, já se sabe. Ah, se tudo fosse tão cristalino como num ditado!... “Para se ser rico é menos necessário aprender como se ganha, que como se economisa”, lê-se na Collecçao de Pensamentos, Máximas e Provérbios (1847), obra do conselheiro José Joaquim Rodrigues de Bastos.

Quando se poupavam bestas e escravos

Em tempos, o poupar estava associado a assuntos mais bélicos e melindrosos. “Quem ao inimigo poupa, nas suas mãos morre”, defendia-se, que é outra forma de dizer, como compilava António Delicado em 1651, “despreza teu inimigo, serás logo vencido”. E nisto de escavar o passado, pois bem, tenhamos em conta o adágio que não deixa margem para dúvidas: “O escravo e a besta muar se ha de poupar”. Um mulo e um homem vistos pelo mesmo prisma; ambos animais de trabalho, que era preciso usar com contenção.

Dá vontade de acabar o texto assim, mas talvez seja preferível voltar ao início, como se o segredo da poupança, na sabedoria popular, estivesse resumido a um pensamento geral: “Poupa o teu vintém, serás um dia alguém”. Do mal, o menos; que se aforre o obtido honestamente, mesmo que seja tostão a tostão.

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Paulo M. Morais cresceu a jogar futebol de rua e a ouvir provérbios ditos pelas avós. Licenciou-se em Comunicação Social e especializou-se nas áreas do cinema, dos videojogos e da gastronomia. É autor de romances e livros de não ficção. Coleciona jogos de tabuleiro e continua a ver muitos filmes. Gosta de cozinhar, olhar o mar, ler.

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