Comprar casa é um processo que vem acompanhado de dúvidas naturais. Há papéis e documentos, impostos e comissões. Há taxas fixas, mistas e variáveis e há seguros de vida e multirriscos.
Agora, para os jovens até aos 35 anos há também isenção de IMT, emolumentos e imposto do selo. Mas não de todo o imposto do selo. Só daquele que incide sobre o valor da aquisição. Isto porque ele volta a aparecer no crédito e nas comissões. E aí tem de se pagar tudo. Há ainda a possibilidade de conseguir um financiamento até 100% do valor do imóvel, com a ajuda da garantia pública no crédito.
Comprar casa pode ser um caminho um tanto ou quanto desafiante de percorrer (e compreender). Por isso, preparámos um guia para ajudar a perceber os apoios (e não só) para os jovens até aos 35 anos.
- Ouvi que preciso de 10% para a entrada. É mesmo assim?
- O que aconteceu ao IMT e imposto do selo?
- A isenção dos emolumentos de registo
- Mas continua a haver custos a pagar ao comprar casa: Quais?
- Pontos a ter em conta ao comprar uma casa
Ouvi que preciso de 10% para a entrada. É mesmo assim?
O rácio Loan-to-Value (LTV) representa a relação entre o montante financiado e o valor do imóvel. Dizem as regras do Banco de Portugal que o LTV na compra de habitação própria e permanente não pode ser superior a 90%. Assim, de forma simplificada, podemos dizer que sim, é verdade que é preciso ter, no mínimo, 10% para dar de entrada.
No entanto, é preciso trazer outras variáveis para cima da mesa. A primeira é que cada banco tem as suas regras, o que significa que as instituições têm liberdade para impor um LTV inferior e, com isso, fazer subir a percentagem necessária para a entrada.
A outra tem a ver com o próprio cálculo do rácio. É que as contas são feitas tendo em conta o menor valor entre a aquisição e a avaliação do imóvel. Ou seja, se comprar uma casa por 250 mil euros e o valor de avaliação for 220 mil euros, o banco só pode emprestar até 198 mil euros (90% de 220 mil).
Por outro lado, se para o mesmo valor de aquisição, a avaliação do imóvel fosse de 270 mil euros, o empréstimo poderia chegar aos 225 mil euros (90% de 250 mil). Contas feitas, são 27 mil euros de diferença entre um caso e outro.
Leia ainda: Qual o limite de financiamento no crédito habitação?
A garantia pública para comprar casa até aos 35 anos
Um dos apoios aprovado pelo Governo, em 2024, foi a garantia pública no crédito aos jovens. O objetivo é precisamente cobrir o valor não financiado pelos bancos na compra da primeira habitação própria e permanente. A garantia pode chegar a 15% do valor do imóvel e, na prática, permite que os jovens tenham financiamento a 100%.
Para comprar casa com recurso à garantia do Estado é preciso cumprir as seguintes condições:
- Ter entre 18 e 35 anos de idade e domicílio fiscal em Portugal;
- Os rendimentos não podem ultrapassar o 8.º escalão do IRS;
- Não se pode ser proprietário de prédio urbano ou de fração autónoma de prédio urbano habitacional;
- Não pode haver dívidas às Finanças e à Segurança Social;
- Não se pode já ter usufruído da garantia pessoal do Estado;
- O valor da transação não pode exceder os 450 mil euros;
Para ajudar a explicar a medida, deixamos algumas perguntas e respostas.
A garantia é de até 15%. Quer dizer que não preciso de pagar esse valor?
Não. A garantia não significa que o Estado paga 15% do valor do imóvel, mas apenas que serve como fiador caso o jovem falhe com as prestações ao banco. O montante máximo que o Estado garante é de 15% do capital em dívida contratado inicialmente.
Mas então tenho a certeza de que o crédito vai ser aprovado?
Não. Como sempre, a concessão de crédito está dependente da análise que o banco vai fazer em relação ao cliente. Ou seja, mantém-se a regra de as prestações com todos os créditos não poderem ultrapassar 50% do rendimento mensal. A este propósito, é importante ter em conta que o financiamento a 100% significa prestações mais altas e, consequentemente, uma taxa de esforço mais elevada.
Vamos ver isso em dois exemplo de compra de uma casa de 200 mil euros, a pagar em 35 anos, e com uma taxa de juro de 4%.
No primeiro caso, o jovem dá 10% de entrada e pede o restante emprestado, ou seja, 180 mil euros. Assim, a prestação será de 797 euros. Por outro lado, se tiver financiamento a 100%, o valor a pagar todos os meses sobe para 886 euros.
Durante quanto tempo é que a garantia é válida?
O Estado mantém-se como fiador durante 10 anos.
O que acontece se entrar em incumprimento?
O banco aciona a garantia e o Estado paga a dívida. Depois, o cliente terá de resolver a situação diretamente com a instituição, como se não tivesse qualquer garantia pública. No fim, o banco devolve o dinheiro ao Estado.
Os bancos são obrigados a aderir?
Não. Quem quiser beneficiar da garantia do Estado deve confirmar se o banco aderiu ao protocolo.
Posso renegociar um contrato coberto pela garantia?
Sim. Tal como acontece com os outros contratos de crédito habitação, também aqueles celebrados no âmbito da garantia pública podem ser renegociados junto do banco.
Se transferir o crédito, perco a garantia?
Não. No entanto, é preciso ter dois pontos em consideração. Um deles é confirmar se a nova instituição de crédito aderiu ao protocolo. A outra é que a garantia não renova no momento da transferência. Ou seja, se já usufruiu dela durante seis anos antes da transferência, a cobertura mantém-se por mais quatro.
Posso perder o direito à garantia?
Sim, quem vender ou alterar a finalidade do imóvel perde o direito à garantia. Um exemplo disso é comprar a casa para habitação própria e permanente e, no período de vigência da garantia, colocar o imóvel para arrendar.
A partir de quando posso aderir?
A legislação sobre a garantia pública foi publicada no dia 27 de setembro e entrou em vigor no dia seguinte. Os bancos têm agora 30 dias para poderem aderir ao protocolo e outros 60 para implementarem os procedimentos necessários para que seja possível financiar operações de crédito nestas condições.
Ou seja, no limite, os jovens começam a ter acesso à medida em janeiro de 2025.
Até quando se pode aderir?
A garantia pública é válida para contratos de crédito celebrados até ao dia 31 de dezembro de 2026.
Leia ainda: Garantia pública no crédito habitação para jovens: Perguntas e respostas
O que aconteceu ao IMT e imposto do selo?
Regra geral, é preciso pagar dois impostos ao comprar uma casa: o Imposto Municipal Sobre as Transmissões Onerosas de Imóveis (IMT) e o imposto do selo. Tanto um como o outro incidem sobre o maior entre o valor de compra do imóvel e o Valor Patrimonial Tributário (VPT).
Se no caso do IMT a taxa depende do valor da casa, no imposto do selo é sempre de 0,8%. Mas também aqui os jovens até aos 35 anos podem aproveitar as medidas que foram aprovadas e que dão isenção total ou parcial nos dois impostos.
Quem pode aproveitar a isenção?
Não basta ter até 35 anos para ficar isento de pagar os dois impostos. Outros critérios para beneficiar da isenção são:
- Ser independente para efeitos de IRS;
- Comprar a primeira casa, que deve ter como finalidade a habitação própria permanente;
- Não pode ser proprietário ou coproprietário de um segundo imóvel ou parcela de imóvel;
- Não pode ter sido proprietário ou coproprietário nos últimos três anos.
Leia ainda: Isenção de IMT para jovens: Perguntas e respostas
Posso comprar uma casa de qualquer valor?
Não. A isenção está limitada à compra de casas cujo valor não supere o quarto escalão do IMT. Em 2024, este valor é de 316.772 euros. Ainda assim, os imóveis que estejam no quinto escalão (entre 316.773 e 633.455 euros) têm isenção parcial.
Quanto se paga numa casa de 320 mil euros?
Num caso destes, os jovens pagam apenas o excedente. De forma mais simples, podemos dizer que, em 2024, o desconto é de 14.685,80 euros, uma vez que este é o montante que seria devido num imóvel de 316.772 euros (o teto do patamar de isenção) caso tivesse de pagar os dois impostos.
Em condições normais, um imóvel de 320 mil euros situado em Portugal Continental paga 14.969,86 euros de impostos. Dentro das condições previstas na nova medida, vai pagar 284,06 euros (14.969,86 – 14.685,80).