Foram seis meses que pareceram anos, com alterações abruptas de políticas e um elevado nível de incerteza que provocaram picos de volatilidade e mudanças de direção bruscas e significativas nos mercados. Mas o saldo final foi muito favorável para a generalidade dos ativos e regiões, com destaque para a classe de ativos das ações e a geografia Europa, que conseguiram um desempenho excecional e pouco habitual no primeiro semestre.  

Donald Trump é o denominador comum da turbulência que se viveu nos mercados na primeira metade de 2025. Foram as políticas ditadas a partir da Casa Branca que dominaram a evolução das ações, obrigações e outros ativos cotados. As tarifas comerciais agressivas, posicionamento geopolítico afastado da Europa e política orçamental assente no corte de impostos e despesa pública foram as principais forças que ditaram as flutuações nas cotações dos ativos.

A desconfiança e incerteza com o impacto das políticas de Trump ditou um afastamento pronunciado dos investidores dos ativos norte-americanos, que pôs fim a dois anos de retornos excecionais das ações em Wall Street e colocou as ações europeias de regresso no radar. Este movimento, conhecido nos mercados por “Sell America”, atingiu de forma mais intensa o dólar, com o índice da divisa norte-americana a sofrer uma queda superior a 10%, o que representa o pior desempenho em mais de 50 anos (1973).

Europa em destaque

O Stoxx600, índice que reúne as maiores cotadas europeias, fechou o semestre com um ganho próximo de 10%. Adicionando a valorização substancial do euro (13,8%), as ações europeias geraram um retorno bem superior a 20% aos investidores internacionais (em dólares), reforçando a atratividade da Europa como destino do capital que abandonou os Estados Unidos.

Os índices das bolsas da Alemanha, Espanha e Itália registaram ganhos acima de 20% no primeiro semestre, sendo que a praça portuguesa também ficou perto desta fasquia (PSI ganhou 17,4%). São vários os fatores que justificam este desempenho superior das ações europeias, desde logo as baixas avaliações no seguimento de vários anos com prestação inferior, que levaram os investidores a percecionar as cotadas europeias como “baratas”.

Mas o fator primordial na atratividade das ações europeias está relacionado com a alteração histórica na gestão das contas públicas da Alemanha. A chegada de um novo governo a Berlim ditou uma inesperada inversão da austeridade orçamental que marcou os últimos anos na maior economia europeia. Os avultados estímulos orçamentais direcionados para a defesa e infraestruturas prometem tirar a economia alemã da estagnação em que se encontra há dois anos.

Esta “nova era” na Alemanha está a dar alento para os investidores apostarem nas ações europeias, também porque outros países deverão replicar a “receita” alemã. A evolução resiliente da economia da Zona Euro e o alívio da política monetária também deram uma ajuda preciosa às bolsas europeias. O BCE reduziu os juros em todas as reuniões de 2025, colocando a taxa dos depósitos em 2%, o que aumenta o rendimento disponível das famílias e baixa os custos das empresas.

Leia ainda: Ações portuguesas brilham com subida de 100% desde a pandemia

Coloque o dinheiro a trabalhar por si

Subscreva o PPR Doutor Finanças e prepare a reforma que merece.

Wall Street recupera com força

Nos Estados Unidos, o comportamento das ações foi bem mais fraco. No pico do stress com as tarifas (início de abril), os índices norte-americanos chegaram a marcar perdas de 20% face aos máximos atingidos em fevereiro. Depois de Trump anunciar a suspensão das tarifas por 90 dias, as ações norte-americanas encetaram uma recuperação épica que levou os índices a regressarem a máximos históricos no final do semestre. O S&P500 e o Nasdaq acumularam ganhos em torno de 6% em 2025, um desempenho ainda assim favorável tendo em conta a instabilidade e incerteza que se registou em Wall Street na primeira metade do ano.

As obrigações soberanas também conseguiram um desempenho positivo no primeiro semestre (3,8%), refletindo o abrandamento da economia, alívio da inflação e cortes (ou perspetivas de descida) de juros. A valorização mais ténue dos títulos europeus (0,6%) traduz a expansão orçamental da Alemanha e o retorno dos títulos norte-americanos foi travado pelos receios com a escalada do défice orçamental e da dívida pública dos Estados Unidos devido ao massivo corte de impostos de Donald Trump.

Nas matérias-primas, o ouro destacou-se com uma subida de 26%, beneficiando com a tendência de diversificação do dólar nas reservas dos bancos centrais e reforço do estatuto de ativo de refúgio em momentos de turbulência. Apesar da instabilidade geopolítica, o petróleo registou uma tendência oposta (Brent desceu quase 9%) devido à decisão dos países membros da OPEP+ em reforçarem a oferta da matéria-prima no mercado, invertendo a estratégia que privilegiava a defesa das cotações elevadas.

Com a generalidade dos índices acionistas globais a negociarem em máximos históricos, ou muito perto disso, a evolução no segundo semestre será mais desafiante. Terão de estar reunidos um conjunto de fatores que sustentem a manutenção do apetite dos investidores pelos ativos de risco, que são analisados agora em maior detalhe.

Onde vão parar as tarifas?

A política comercial dos Estados Unidos tem sido o fator primordial na evolução dos mercados e assim deverá continuar nos próximos meses. Os investidores já assimilaram que Donald Trump não prescinde da imposição de tarifas aos seus parceiros comerciais e parecem confortáveis com taxas alfandegárias universais em 10%, ou um pouco acima.

É ainda incerto se vai ser estendida a data de 9 de julho para que as negociações possam ser prolongadas, sendo relevante que o mercado ganhe uma maior visibilidade sobre como vai evoluir o comércio mundial. Se as tarifas deixarem de ser uma ameaça para a economia, inflação e resultados das empresas, há margem para que as ações globais persistam com uma tendência altista. Contudo, os investidores devem contar com forte volatilidade neste tema, com os habituais avanços e recuos que têm caracterizado a política de Trump.

Resultados continuam robustos?

Os resultados favoráveis apresentados pelas empresas europeias e norte-americanas, referentes ao primeiro trimestre, foram determinantes para dar confiança aos investidores, acelerando o “rally” que se observou após os mínimos de abril. As previsões dos analistas para o segundo trimestre e totalidade de 2025 têm sido revistas em baixa nos últimos meses, para refletir o impacto das tarifas e perspetivas mais sombrias para a evolução da economia global.

As expetativas atuais apontam para um aumento de 5,9% nos lucros das empresas do S&P500, bem abaixo do estimado em abril (10,2%) e do registado no primeiro trimestre. Numa altura em que o índice norte-americano já negoceia com um múltiplo bem acima da média histórica (22 vezes os lucros estimados a 12 meses), só resultados bem acima do esperado abrem espaço para valorizações adicionais das ações em Wall Street.

As expectativas para as cotadas europeias estão ainda contidas, com os analistas a apontarem para um aumento de 1,2% nos lucros do segundo trimestre (2,2% no primeiro trimestre). Contudo, as cotadas europeias também negoceiam com avaliações bem mais confortáveis (14 vezes os lucros estimados a 12 meses) do que as pares norte-americanas e alinhadas com a média histórica.

Fed vai baixar os juros?

Ao contrário do BCE, que baixou os juros por oito vezes desde o ano passado, a Fed ainda não mexeu nas taxas de juro em 2025. Apesar das pressões de Trump, o líder do banco central dos Estados Unidos tem repetido que o a política monetária está no patamar ideal e, tendo em conta a resiliência da economia, será necessário aguardar pelo impacto das tarifas na inflação para avaliar se há espaço para baixar os juros.

Os mercados estão atualmente a antecipar duas descidas da Fed até ao final do ano (setembro e dezembro), sendo que um ajuste significativo nestas expectativas vai certamente influenciar o rumo das ações, obrigações, dólar e outros ativos. Se a Fed não baixar os juros devido à subida da inflação, a reação nas bolsas será negativa. Mas se o banco central mantiver a política monetária devido à evolução robusta da economia, então a variação pode ser positiva.  

Economia evita recessão?

Devido ao alívio das tensões comerciais, os cenários mais sombrios de recessão na economia norte-americana e global têm atualmente uma probabilidade mais reduzida. Contudo, a maior economia do mundo não está “livre de perigo”, pelo que se acentuarem os sinais de travagem mais profunda da atividade económica nos Estados Unidos, a reação dos mercados será negativa. Mesmo que tal implique um corte de juros mais célere e acentuado dos juros da Fed.

Os últimos indicadores económicos não apontam nesse sentido, com o mercado de trabalho a permanecer robusto (mais de 100 mil empregos por mês) e as estimativas a apontarem para uma forte recuperação da economia no segundo trimestre. O PIB recuou 0,5% no primeiro trimestre, penalizado pelo forte aumento das importações devido à antecipação de compras para escapar às tarifas. A reversão deste efeito vai contribuir para uma taxa de crescimento superior a 3% no segundo trimestre.   

Geopolítica continua a ser ignorada?

O primeiro semestre também foi marcado por um agravamento dos eventos geopolíticos, que criaram turbulência e forte volatilidade nos mercados. A troca de bombardeamentos entre Israel e o Irão foi o episódio de maior stress, sobretudo porque provocou uma escalada súbita nos preços do petróleo. Mas o impacto acabou por ser totalmente revertido depois de ter sido alcançado um rápido cessar-fogo. Os dados históricos mostram que os eventos geopolíticos acabaram por ter um efeito quase sempre passageiro nos mercados. Mas a geopolítica é sempre um risco presente nas decisões dos investidores, que podem sempre optar por ficar longe dos ativos de risco.

A informação que consta no artigo não é vinculativa e não invalida a leitura integral de documentos que suportem a matéria em causa.

Autores ConvidadosInvestimentos