Cada vez mais, ouvimos falar de Sustentabilidade, dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável das Nações Unidas (ODS) e do ESG (Enviroment, Social and Governance). No entanto, nem sempre é fácil relacionarmos os temas e perceber as interligações. É nesta lógica de sinergia que acredito que, para haver um mundo sustentável, o papel da inclusão financeira é fundamental.
Gosto de olhar para os ODS como um caminho de esforço conjunto, que envolve entidades públicas, mas, também, todos os sectores da economia e cada um de nós. Um caminho que pretende quebrar ciclos para que exista uma maior acessibilidade de todas as pessoas a serviços e produtos, e para que o crescimento económico caminhe de mãos dadas com uma produção, gestão de recursos e consumo sustentável, promovendo um olhar global e holístico.
E, não tenhamos dúvidas: para alcançar os ODS é essencial a inclusão financeira. É necessário trazer as pessoas para o sistema financeiro, esse que é visto sempre com um olhar desconfiado (algo que é importante ajudarmos a mudar).
Mas o que é a inclusão financeira?
De um modo simples, a inclusão financeira significa que os serviços financeiros são acessíveis, eficazes e seguros para todas as pessoas e empresas.
Apesar de importante, não é só acesso a uma conta bancária. Inclui acesso a uma variedade de serviços e produtos formais como poupança, crédito, seguros e serviços de pagamento, a preços acessíveis e num sistema ético e sustentável.
Mas podemos (e devemos!) ir mais além. Inclusão financeira implica literacia financeira. O que requer a tomada de decisões conscientes. Para isso é necessário darmos acesso à informação e conseguirmos descomplicar conceitos sobre finanças e seguros.
O poder da transformação e a quebra de ciclos
A inclusão financeira, alinhada com a informação e conhecimento, que gera atitudes, hábitos e decisões financeiras responsáveis, pode contribuir para um poderoso empoderamento das pessoas levando a um maior bem-estar financeiro.
Vamos a exemplos concretos:
- Cerca de 100 milhões de pessoas, em todo o mundo, são levadas à pobreza extrema todos os anos devido a despesas de saúde diretas, segundo o relatório de 2021 do Banco Mundial (Workd Bank). Como é que este contexto é um “bom” exemplo? Os serviços financeiros, tal como a poupança e os seguros, ajudam as famílias a prepararem-se para fazer face a despesas inesperadas de saúde, evitando, por exemplo, o endividamento para fazer face a estas despesas que, como sabemos, são vitais e inadiáveis.
- Já em Portugal, segundo o estudo “Bem-Estar Financeiro em Portugal: Uma perspetiva Comportamental” do Doutor Finanças (maio de 2024), podemos constatar que quase metade dos portugueses não têm um fundo de emergência, o que leva a desafios adicionais em caso de perda de rendimentos. Aliado a esta conclusão: 64% dos portugueses têm um baixo conhecimento financeiro.
Os serviços financeiros, acompanhados de informação e conhecimento, potenciam o aumento das poupanças e de fundos de emergência, tornando as pessoas mais preparadas e capacitadas para lidarem com desafios económicos inesperados, o que contribui para quebrarmos ciclos de vulnerabilidade financeira.
Temos de ser mais audazes e criativos
Não podemos falar de inclusão financeira sem falarmos do papel das Fintech, que estimulam a inovação e a inclusão financeira digital responsável. Vários estudos mostram que estas são poderosas agentes de transformação, permitindo o acesso a produtos e serviços financeiros a uma grande parte da população e potenciando um maior conhecimento sobre o tema.
Simultaneamente, a inclusão financeira deve ser acompanhada por programas de literacia financeira. A informação de qualidade e conhecimento sobre temas financeiros, fomenta a realização de orçamentos familiares, a escolhas mais acertadas e responsáveis dos gastos e à tomada de decisões financeiras conscientes e consistentes.
Temos de ser mais audazes e criativos. Olhando pela lente positiva, há muitas histórias de sucesso onde respostas para produtos e serviços financeiros mais acessíveis provocam um impacto social significativo na vida de milhares de pessoas e famílias. Esta realidade mostra que, com as condições certas, é possível quebrar ciclos de vulnerabilidade financeira e garantir liquidez para um maior empoderamento e gastos responsáveis. São histórias de impacto também ambiental, potenciando uma maior disponibilidade para investimentos na transição energética e ambiental.
Portugal foi o primeiro país do mundo a comemorar o Dia Nacional da Sustentabilidade, hoje. Há uns meses, em junho, a ONU alertava para o risco de não cumprimento dos ODS, salientando que apenas 17% das suas metas estão na direção correta para serem cumpridas.
A inclusão financeira não só impulsiona o crescimento económico, como também permite um progresso mais rápido em direção ao alcance de muitos ODS, e isto, se me permitem, é da responsabilidade de cada um de nós.
Paulo Velho Cabral estudou Gestão no ISEG, com uma especialização em finanças na University of Chicago Booth School of Business. Realizou ainda o programa de Strategic Management da Universidade Católica, com passagem pela Northwestern University – Kellogg School of Management. Iniciou a sua experiência profissional há mais de 25 anos, na corretora de mercados financeiros Fincor e juntou-se ao Grupo Jerónimo Martins em 1999, onde consolidou a sua carreira nas áreas de Recursos Humanos e Financeira. É co-fundador do Doutor Finanças e desempenha funções enquanto Partner e Chief Financial Officer, tendo a seu cargo as áreas Financeira e de Compliance.
A informação que consta no artigo não é vinculativa e não invalida a leitura integral de documentos que suportem a matéria em causa.
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