Com o crescimento do trabalho remoto, muitos trabalhadores independentes aumentaram a sua carteira de clientes e começaram a prestar serviços a empresas com sede fora de Portugal. No entanto, para quem vai emitir recibos verdes para empresas estrangeiras pela primeira vez, é normal surgirem algumas dúvidas sobre os procedimentos a seguir.
Quando vive em Portugal e trabalha como freelancer para uma ou mais empresas estrangeiras, não deixa de ter de cumprir com as suas obrigações contributivas e declarativas portuguesas (assumindo que é residente fiscal em Portugal). Mas a verdade é que existem alguns cuidados a ter, desde o momento que abre atividade, ao emitir recibos verdes, passando pelo pagamento de impostos (como o IVA e retenção na fonte de IRS), contribuições à Segurança Social e entregas de declarações.
Para não arriscar cometer alguns erros, neste artigo, destacamos os principais cuidados a ter quando emite recibos verdes a empresas estrangeiras.
1 - Informe-se bem antes de abrir atividade ou proceder à sua alteração
Abrir atividade enquanto trabalhador independente nas Finanças é um processo relativamente simples, que pode ser feito online, através do site da Autoridade Tributária e Aduaneira (AT). Quando presta trabalho independente para empresas portuguesas ou estrangeiras, existem informações a que deve estar atento, como:
- O Código de Classificação de Atividades Económicas (CAE) ou Código da tabela de atividades do IRS (CIRS) que vai exercer. Todos os trabalhadores independentes podem ter mais do que um CAE ou CIRS. No entanto, quando abre atividade tem de indicar qual vai ser o seu CAE ou CIRS principal. Ao prestar atividades para empresas no estrangeiro, esta obrigação mantém-se.
- Volume estimado de negócios: quando abre atividade precisa de indicar o valor aproximado que pensa que vai faturar até ao final do ano. Tenha atenção, pois se abrir atividade a meio do ano, o valor indicado corresponde ao número de meses que faltam até o ano chegar ao fim. Logo, a AT faz contas (leia-se, a proporção) com base no volume de negócios que teria se a sua atividade tivesse sido exercida durante os 12 meses. É essencial fazer bem as contas, pois é esse valor final que vai contar para o seu enquadramento de IVA e IRS.
- Enquadramento no Regime Simplificado ou Regime de Contabilidade Organizada: Outro ponto a ter em conta é que, enquanto trabalhador independente, deve pensar bem sobre qual o regime por que quer optar. Em termos legais, quando o valor anual dos rendimentos da categoria B é igual ou inferior a 200.000 euros, fica automaticamente enquadrado no Regime Simplificado. Contudo, pode sempre optar pelo regime de Contabilidade Organizada, caso seja mais vantajoso para si.
- Regime de IVA: Para se beneficiar do regime de isenção de IVA (atribuído segundo certos critérios, entre eles, não ter um volume de negócios anual superior a 14.500 euros), não tem de cobrar IVA. Mas caso não fique isento, a aplicação deste imposto depende do tipo de cliente a quem presta serviços, da respetiva localização geográfica da prestação e da localização geográfica da sede do cliente. Assim, é essencial esclarecer essa questão junto das Finanças ou de um contabilista.
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2 - Saiba se não vai estar sujeito a dupla tributação de IRS
Enquanto trabalhador independente, fazer ou não retenção na fonte levanta sempre muitas dúvidas. Afinal, estamos a falar de uma forma de adiantar um imposto ao Estado. No entanto, não existe obrigação de proceder à retenção na fonte se os seus rendimentos não ultrapassarem os 14.500 euros (ao abrigo do mesmo regime de isenção previsto para o IVA).
Porém, quando emite recibos verdes a empresas estrangeiras, pode não ter que se preocupar em fazer a retenção na fonte. Mas, para tal, os seus rendimentos devem ser provenientes de um país com o qual Portugal tem um acordo para evitar a dupla tributação. Ou seja, em Portugal sabe que está isento, mas tem de confirmar se no país para o qual está a prestar um serviço não cobram impostos.
Caso exista esse acordo, a empresa estrangeira vai solicitar o preenchimento de um modelo semelhante ao Modelo RFI, que afasta a dupla tributação económica.
Contudo, é preciso ter atenção ao preencher os seus recibos verdes, caso queira evitar a retenção na fonte. No campo da base de incidência em IRS, deve optar por o recibo ser emitido "sem retenção" e selecionar posteriormente a opção "não residente sem estabelecimento".
3 - Atenção à isenção de IVA quando emite recibos verdes a empresas estrangeiras
É comum ouvir dizer que está isento do pagamento de IVA quando emite recibos verdes a empresas estrangeiras. Isto acontece porque o artigo 6.º do Código IVA indica que apenas são tributáveis em Portugal os serviços efetuados a um sujeito passivo com sede, estabelecimento ou domicílio em território nacional. Além disso, se estiver isento de cobrar este imposto, não tem obrigação de emitir recibos verdes com IVA no estrangeiro e em Portugal.
Para emitir um recibo a uma empresa estrangeira onde não cobra este imposto, precisa de indicar o motivo para não liquidar o IVA. Assim, no recibo verde, escolha a opção "IVA-autoliquidação", uma vez que esta pode ser usada quando presta serviços a empresas com sede na União Europeia ou fora da UE.
Se a empresa estiver domiciliada na União Europeia, precisa de ter outro aspeto em consideração que é confirmar que o sujeito passivo da empresa está registado na plataforma VIES. Este é um ponto muito importante. Caso o sujeito passivo não esteja na base de dados, vai ter de cobrar o IVA, tendo em conta a taxa em vigor no país do cliente.
Mas esta não é a única exceção onde pode ter de cobrar o Imposto de Valor Acrescentado. Se prestar serviços ou fizer vendas a clientes particulares no estrangeiro como trabalhador independente, deve emitir um recibo verde com o IVA, conforme a taxa do país em causa.
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4 - Não se esqueça das suas obrigações declarativas quando faz transações intracomunitárias/exportações
Ao abrir atividade nas Finanças para fazer transações intracomunitárias/exportações, esta informação deve ser indicada no formulário de início de atividade. Já se tem atividade aberta, mas só agora vai começar a fazer este tipo de transações, deve comunicar à AT esta alteração.
Passando a fazer transações intracomunitárias/exportações, existem algumas obrigações declarativas que deve cumprir. Uma delas é a entrega das declarações periódicas trimestrais (indicando o valor prestado em serviços intracomunitários) e a outra é a declaração recapitulativa.
5 - Como funciona os pagamentos à Segurança Social para quem emite recibos verdes a empresas estrangeiras
Por último, as contribuições à Segurança Social podem levantar algumas dúvidas e levá-lo a cometer erros quando passa a emitir recibos verdes a empresas estrangeiras e portuguesas. Afinal, os seus rendimentos são provenientes de dois ou mais países.
Contudo, sendo residente fiscal em Portugal, terá de pagar as contribuições à Segurança Social referente a todos os rendimentos obtidos. Neste caso, deve proceder à entrega das suas declarações trimestrais e fazer o pagamento mensal das suas contribuições. Esta regra só não se aplica se estiver a usufruir do período de isenção dos 12 primeiros meses, enquanto trabalhador independente.
Caso a maioria dos seus rendimentos seja proveniente de atividades realizadas num país estrangeiro e se não for residente em Portugal, o país responsável pelo sistema de segurança social será onde reside.
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A informação que consta no artigo não é vinculativa e não invalida a leitura integral de documentos que suportem a matéria em causa.
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