A venda de um imóvel pode representar um bom ganho, mas normalmente implica também a obrigação de pagamento de impostos ao Estado. Os ganhos obtidos por pessoas singulares, através da venda de imóveis, estão sujeitos a IRS através da tributação das mais-valias imobiliárias, cujo funcionamento e regime explicaremos neste artigo.
Em que consistem as mais-valias imobiliárias?
Em termos muito sucintos, a mais-valia imobiliária é o valor positivo que resulta da venda de um bem imóvel por um valor superior àquele pelo qual foi adquirido, ou seja, trata-se do lucro obtido entre o valor de aquisição de um imóvel (ainda que atualizado e ponderando despesas e custos elegíveis) e o valor de venda do mesmo imóvel. Esta diferença positiva, chamada mais-valia, pode ter um impacto fiscal importante, razão pela qual é aconselhável fazer o necessário planeamento fiscal até para saber de antemão o valor do imposto a pagar na eventualidade de não se reinvestir essa mais-valia ou quando esse reinvestimento não seja atendível do ponto de vista fiscal.
Antes do mais, convém referir que as mais-valias imobiliárias, do ponto de vista fiscal, só são consideradas, à partida, e salvo algumas exceções, em relação a bens imóveis adquiridos a partir de 1989, data em que entrou em vigor o Código de IRS. As mais-valias resultantes da venda de bens imóveis adquiridos antes de 1989 – à exceção dos terrenos para construção adquiridos depois de 1965 -, não são tributadas.
No caso dos particulares residentes, sujeitos de IRS, para efeitos de tributação da mais-valia, o ganho obtido é, na grande maioria dos casos, considerado apenas em 50%, sendo englobado com os restantes rendimentos das demais categorias.
O ganho poderá ser considerado na totalidade em certos casos em que o imóvel foi adquirido com apoio não reembolsável concedido pelo Estado.
Essa mais-valia é calculada, não apenas através da diferença entre o valor de aquisição e do posterior valor de venda, mas também considerando o coeficiente de desvalorização monetária aplicável ao valor de aquisição, assim como os gastos tidos com escrituras e registos, mediação imobiliária e ainda as obras de conservação realizadas nos 12 anos anteriores à venda que sejam fiscalmente atendíveis e que tenham sido objeto de faturação e pagas efetivamente através de transferência bancária ou com o uso de cartão bancário.
Como se calculam as mais-valias?
O cálculo da mais-valia predial segue a fórmula:
Mais-valia = Valor de venda – (Valor de aquisição x Coeficiente de desvalorização) – Encargos dedutíveis
Explicando cada elemento:
- Valor de venda: preço pelo qual vendeu o imóvel, conforme consta da escritura (incluí apenas o imóvel, e não outros bens que possam ter sido vendidos simultaneamente, como o recheio da casa).
- Valor de aquisição: preço pelo qual comprou o imóvel, também conforme consta da escritura.
- Coeficiente de desvalorização monetária: corrige o valor de aquisição tendo em conta a inflação – é um coeficiente publicado em portaria do governo, que atribui um coeficiente a cada ano de aquisição dos imóveis.
- Encargos dedutíveis:
- Obras de valorização nos últimos 12 anos (com fatura e pagas com transferência ou cartão bancário).
- Impostos e taxas pagos na compra do imóvel.
- Comissão paga à agência imobiliária.
- Despesas efetuadas com a certificação energética do imóvel.
A forma mais usual de mitigar o impacto do imposto de mais-valias prediais é através do recurso ao reinvestimento da mais-valia obtida.
Há que ter presente, no entanto, que reinvestimento apenas é fiscalmente relevante quando esteja em causa a Habitação Própria e Permanente (“HPP”) do sujeito passivo, devendo o valor de venda ser aplicado na sua totalidade na aquisição de nova Habitação Própria e Permanente nos 36 meses seguintes à venda o imóvel que gera a mais-valia ou, em casos justificados, nos 24 meses anteriores à venda do referido imóvel.
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Resumidamente, como funciona?
Se vendeu a sua habitação própria e permanente, pode beneficiar de isenção total ou parcial do imposto sobre mais-valias, se reinvestir o valor da venda na compra de outra habitação própria e permanente.
Prazos:
- Reinvestimento pode ser feito até 36 meses depois ou 24 meses antes da venda, em casos justificados.
Condições:
- O imóvel vendido e o novo devem ser destinados a habitação própria e permanente do vendedor (ou do seu agregado familiar).
- O reinvestimento tem de ser do valor total de realização (venda), não apenas do lucro, deduzido da amortização de eventual empréstimo contraído para a aquisição do imóvel.
Notas importantes:
- Se reinvestir apenas parte do valor, a isenção aplica-se na mesma proporção.
- Por exemplo: vende por 300.000 €, mas só reinveste 200.000 € → fica isento de imposto sobre 2/3 da mais-valia.
- Exemplo:
- Valor de venda: €300.000
- Valor de aquisição + encargos: €150.000
- Mais-valia: €150.000
- Valor reinvestido em nova HPP: €200.000
Como não reinvestiu os 300.000 euros da venda, mas apenas 200.000 euros, o benefício aplica-se a 66,7% da mais-valia (150.000 euros) que estará isenta de IRS, e os restantes 33,3% estarão sujeitos a tributação.
- No caso de não reinvestir a mais-valia no ano da alienação, atendendo ao prazo de que se dispõe, tem ainda assim de manifestar a intenção de as reinvestir no Anexo G, Quadro 5A, na declaração relativa a esse ano, para evitar a tributação. Caso manifeste a intenção de reinvestir a totalidade do valor da venda, e no ano seguinte, por exemplo, apenas reinvista parte desse valor, a AT irá proceder à reliquidação do imposto, acrescida dos juros compensatórios que se mostrem devidos.
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O que é e quais os critérios definidores da Habitação Própria Permanente?
Embora a lei não especifique detalhadamente todos os documentos exigidos para que se possa qualificar uma morada como HPP, a prática administrativa da AT exige prova efetiva do uso como habitação própria e permanente, através de elementos como:
- Morada fiscal atualizada no Portal das Finanças – elemento obrigatório (a lei obriga a que o imóvel transmitido tenha sido destinado a habitação própria e permanente do sujeito passivo ou do seu agregado familiar, comprovada através do respetivo domicílio fiscal, nos 12 meses anteriores à data da transmissão, ou no caso do reinvestimento anterior à alienação, nos 12 meses anteriores à data deste reinvestimento. No entanto, se o período de 12 meses não for observado, ainda assim é possível evitar a tributação, se a inobservância deste período se tenha devido a circunstâncias excecionais comprovadas (por exemplo, as alterações da composição do respetivo agregado familiar por motivo de casamento ou união de facto, dissolução do casamento ou união de facto, ou aumento do número de dependentes).
- Faturas de serviços públicos (água, luz, comunicações) – que demonstrem ocupação.
- Registos na Segurança Social e AT – como trabalhador ou residente com morada ligada ao imóvel.
- Contratos de fornecimento ou comunicações com entidades oficiais – que comprovem residência habitual.
Estes documentos podem ser considerados como indícios fortes da efetiva afetação do imóvel a HPP pelo sujeito passivo, que poderão ser relevantes no caso de o sujeito passivo não ter o seu domicílio fiscal nos imóveis em causa, nestes períodos relevantes.
Para além do reinvestimento da mais-valia em nova HPP, a tributação também poderá ser excluída ou reduzida, no caso de o reinvestimento ser feito não em nova HPP, mas em contrato de seguro financeiro do ramo vida, adesão individual a um fundo de pensões aberto, contribuição para o regime público de capitalização, produto Individual de Poupança Pan-Europeu, verificando-se outros pressupostos.
A venda de um imóvel pode implicar o pagamento de imposto sobre mais-valias, mas com planeamento é possível reduzir ou evitar esse imposto, especialmente se se tratar de habitação própria e permanente.
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