Vida e família

Ano novo, vida nova? Nem 8 nem 80…

Há adágios portugueses que se encaixam perfeitamente nesta altura de renovação, que é a chegada do novo ano.

Sempre que mudamos de ano, chovem títulos com a expressão: “Ano novo, vida nova”. É a vontade de mudança a falar bem alto, mas existem outros adágios portugueses que encaixam com perfeição nesta altura de renovação.

Dos vários dicionários e coleções de provérbios portugueses consultados, apenas os mais recentes assinalam a presença do adágio Ano novo, vida nova. O certo é que a sentença rapidamente se tornou de conhecimento generalizado, sendo bastante utilizada tanto pelos meios de comunicação como pelas pessoas em geral quando definem os seus desejos para o ano a iniciar-se.

Mais do que um desejo, a frase implica um compromisso: mudar de vida ou, pelo menos, mudar algum aspeto específico da nossa vida. Quem recorre à frase, provavelmente, julgou-se aquém do esperado quando fez o seu balanço anual. O rifão parece conter um certo sentimento de culpa – por uma expectativa gorada, uma tentativa falhada –, que provoca uma vontade de mudança radical. Sim, no novo ano, tudo será diferente; vamos lá virar a vida do avesso! Ginásio três vezes por semana, cuidados com a alimentação, gastar menos em coisas supérfluas…

Não esquecer aquilo que se fez bem

Existem, porém, outros adágios que podemos chamar a uso nesta fase do calendário e que talvez até soem um pouco menos totalitários. Afinal, terá sido assim tudo tão mau, para termos de começar uma vida nova? Nos balanços, também será conveniente relembrar o que se fez bem. O reforço positivo é capaz de fazer maravilhas. Portanto, “Nem 8, nem 80”.

Há sempre coisas em que podemos melhorar, mas convém não esquecer as bases sólidas que já tenhamos construído. Depositar todas as esperanças num futuro ainda por cumprir pode facilmente gerar alguma frustração, quando não se atingem as metas estipuladas; felizmente, o presente está cheio de oportunidades de continuar a fazer bem ou de fazer ainda melhor. E neste olhar o horizonte, convém não esquecer que o passado pode conter lições importantes.

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Um passado sofrido equivale a uma vitória

Na coleção de "Adágios Portugueses reduzidos a Lugares Comuns", compilada em 1651 pelo prior António Delicado, a análise do passado ganha importância em dois adágios: “Queres ver o por vir, olha o passado” e “Pello fio tirarás o novello e pello passado o que está por vir”. Ou seja, o tempo que passou gera a experiência de vida. O ano foi particularmente difícil? Pois bem, o próprio facto de se estar a efetuar um balanço consiste, em si mesmo, numa espécie de vitória. “Quem sofreo, vençeo" (ou, se quisermos colocar no presente: “quem sofre, vence”). E nesse vencer a vida, ganham-se memórias e experiências valiosas: “O que é duro de passar, é doce de alembrar”.

Para quem tiver feito votos de vida nova, relembremos uma receita com vários séculos: "A perseverança toda a cousa alcança". E, ainda do mesmo livro, recupere-se essa ideia de que devagar se chega ao longe: “Nem com toda a fome ao cesto nem com toda a sede ao pote”. Calma, portanto. Moderadamente. Passo a passo. Com regularidade. Até porque “Com tempo e pachorra muito se consegue”, diz-se também na "Collecção de Provérbios, Adágios, Rifãos, Anexins, Sentenças Morais e Idiotismos da Lingoa Portugueza".

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Os belos provérbios jamais envelhecem

Nesta compilação de Provérbios e afins, feita por Paulo Perestrello da Câmara e editada em 1848, apresentam-se belas justificações para continuarmos a recorrer às expressões populares, sem receios de cairmos em idiotices. Primeiro, porque “As máximas são como os algarismos, que compreendem grandes valores em poucas letras”. Depois, porque “Não há rifão velho, se é dito a propósito”.

Independentemente da sabedoria popular, o certo é que um ano passou e outro começou. Será tudo diferente? Ou tudo igual? “O tempo é relógio da vida, ou mestre de tudo”. Ao chegar dezembro, não escaparemos à tentação de avaliar os meses passados e traçar objetivos para os meses futuros. Até lá, apetece ficarmos entregues à leitura que Perestrello da Câmara faz de um dos mais belos adágios da sua coleção; neste novo ano, que “não haja medo, toca para a frente, ânimo e fortuna”. Qual o provérbio que tanto sugere ao autor?

Vogue a galé, venha o que vier.

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Paulo M. Morais cresceu a jogar futebol de rua e a ouvir provérbios ditos pelas avós. Licenciou-se em Comunicação Social e especializou-se nas áreas do cinema, dos videojogos e da gastronomia. É autor de romances e livros de não ficção. Coleciona jogos de tabuleiro e continua a ver muitos filmes. Gosta de cozinhar, olhar o mar, ler.

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