Embora algumas famílias portuguesas ajudem os filhos a gerir a sua mesada, outras continuam a enfrentar grandes desafios na educação financeira infantil.
Segundo o Barómetro de Hábitos Financeiros do Doutor Finanças, realizado pela Universidade Católica Portuguesa, cerca de um terço dos inquiridos admite que, em casa, não se fala ou apenas se fala muito esporadicamente sobre dinheiro. Este silêncio é mais comum entre os inquiridos com mais de 65 anos, seguidos pelas faixas dos 45 aos 55 anos e dos 55 aos 65 anos – precisamente grupos que tendem a ter filhos em idade juvenil.
Outro dado importante revela que a maioria dos pais não dá semanada ou mesada aos filhos. Entre os que têm crianças até aos 6 anos, 77% nunca lhes dá dinheiro. Este valor diminui progressivamente com a idade: 30% entre os 6 e os 10 anos, 10% entre os 10 e os 15 anos, e apenas 3% entre os 15 e os 18 anos.
Quando existe periodicidade no dinheiro dado, a mesada é mais comum entre os 6 e os 10 anos (17%) e entre os 15 e os 18 anos (27%). Já entre os 10 e os 15 anos, a semanada prevalece (17%).
Apesar da relutância em falar de dinheiro, 31% dos pais com filhos até aos 6 anos já abordam o tema com os mais novos, seja para ensinar a gerir dinheiro (27%), para resolver um problema (3%) ou para envolvê-los em decisões financeiras (1%).
Porém, o desafio é claro: é preciso mudar a relação entre pais e filhos no que toca ao dinheiro, e a mesada pode ser uma ferramenta essencial nesse processo.
Neste artigo, saiba como ajudar os mais novos a gerir as suas finanças.
Mesada: Sim ou não?
Dar mesada aos filhos é uma forma eficaz de ensinar responsabilidade financeira desde cedo. Ao receberem um valor fixo com regularidade, os filhos aprendem a planear, decidir e lidar com consequências. Esta experiência é essencial para desenvolver hábitos financeiros saudáveis.
Muitos pais temem que dar dinheiro aos filhos os torne consumistas. Mas é o contrário que costuma acontecer. Ao lidarem com um orçamento limitado, as crianças aprendem o valor do dinheiro e a importância de fazer escolhas. A mesada funciona como uma espécie de “simulação” da vida adulta.
Além disso, a mesada abre espaço para conversas sobre finanças, que ainda são escassas em muitas famílias portuguesas. Ao definir regras e objetivos para o uso do dinheiro, os pais envolvem os filhos num diálogo que contribui para a sua autonomia e literacia financeira.
Por isso, de acordo com os especialistas, atribuir uma mesada ou semanada aos filhos, traz inúmeras vantagens na educação financeira infantil e juvenil.
Quando devo começar a dar mesada?
O momento ideal para começar a dar mesada varia, mas há um fator essencial: a criança deve ter alguma noção de números e valor das coisas. Quando começa a pedir brinquedos ou lanches, ou quando compreende que o dinheiro “acaba”, pode ser altura de introduzir o conceito.
Geralmente, isso acontece entre os 5 e os 7 anos. No entanto, perante a necessidade de gerir uma quantia maior ao longo de um mês, até aos 10 ou 12 anos, esta tarefa pode ser um pouco mais complexa. Se optar por dar uma mesada desde os 6 anos, o valor deve ser simbólico, e o foco deve estar mais no hábito e na explicação do que no valor em si. O objetivo é essencialmente ensinar.
É também importante envolver a criança na decisão. Explicar o que é uma mesada, para que serve e que responsabilidade ela implica ajuda a criar um compromisso. Assim, a criança começa a perceber que gerir dinheiro faz parte da vida.
Qual a idade recomendada para dar mesada aos meus filhos?
A mesada pode ser introduzida por volta dos 6 anos. Como já foi referido, a mesada deve evoluir com a idade e maturidade da criança. Nos primeiros anos, o valor deve ser simbólico e a supervisão constante. A partir dos 10 anos, pode começar a ter mais autonomia na gestão do dinheiro.
Na adolescência, entre os 13 e os 18 anos, a mesada ganha outra dimensão. Os jovens já têm mais gastos – com transportes, refeições ou saídas com amigos – e devem aprender a controlar um orçamento mensal. Esta fase é ideal para discutir conceitos como poupança, consumo consciente e objetivos financeiros.
É importante adaptar o valor e a frequência da mesada ao perfil da criança, ao rendimento da família e aos objetivos educativos. Não há uma fórmula única, mas sim uma estratégia ajustada a cada realidade.
Quando se deve dar semanada?
A semanada pode ser uma alternativa eficaz para crianças mais novas. Por serem ainda impulsivas, lidar com uma quantia semanal permite uma aprendizagem mais rápida e com menos margem para erros graves. No fundo, é mais fácil de gerir e os resultados são mais rápidos.
Entre os 6 e os 10 anos, a semanada ajuda a criar rotinas e hábitos. A criança percebe que, se gastar tudo num dia, terá de esperar até à próxima semana. Com o tempo, aprende a adiar recompensas e a fazer escolhas mais ponderadas.
Já entre os 10 e os 15 anos, a semanada pode continuar a ser eficaz, desde que os valores comecem a aumentar ligeiramente. Quando a criança mostra capacidade de planear e guardar parte do dinheiro, pode ser altura de transitar para a mesada.
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Quanto devo dar de mesada?
Não existe um valor fixo ideal, mas sim um que faça sentido para cada família. O mais importante é que o valor seja suficiente para cobrir pequenas despesas – como um lanche, uma revista ou um brinquedo simples – e que esteja alinhado com os rendimentos dos pais.
Para os mais novos, um valor entre 2 e 5 euros por semana pode ser suficiente. A partir dos 10 anos, pode passar a 15 ou 30 euros por mês, sempre com explicações claras sobre o que deve ser feito com esse dinheiro. Na adolescência, o valor pode aumentar, mas sempre com regras.
Também é importante não usar a mesada como chantagem ou punição. A consistência ajuda a criar hábitos. O dinheiro deve vir acompanhado de conversa, limites e, sobretudo, educação.
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O que deve conseguir pagar?
A mesada deve cobrir despesas adequadas à idade e ao nível de autonomia da criança. Para os mais pequenos, pode servir para comprar guloseimas, cromos ou pequenos brinquedos. A ideia é que aprendam a decidir, a poupar e até a negociar.
Com o crescimento, o dinheiro deve servir para almoços, bilhetes de transportes, presentes para amigos ou até para roupa, se os pais assim entenderem. Importa que a mesada vá acompanhando as necessidades e os desafios de cada etapa.
É fundamental que a criança perceba que o dinheiro tem um fim. Se quiser algo mais caro, terá de poupar. Assim, aprende que tudo tem um preço. E que o esforço e a espera fazem parte do processo.
Como posso ensinar os meus filhos a gerir a mesada?
Ensinar a gerir a mesada é tão importante quanto dar o dinheiro. Os pais devem acompanhar, dar exemplos e mostrar interesse pela forma como os filhos usam o valor. Perguntar o que fizeram, como pouparam ou se têm objetivos ajuda a manter o diálogo vivo.
Criar objetivos concretos pode ser motivador. Por exemplo, guardar dinheiro para um jogo novo, uma saída ou um presente. Isto desenvolve o sentido de planeamento e ajuda a distinguir entre necessidades e desejos.
Também é importante deixar espaço para erros. Gastar tudo num dia pode ser frustrante, mas é uma lição valiosa. O apoio dos pais deve ser orientador, não controlador. O erro é parte do crescimento.
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Técnica dos três mealheiros (gastar, poupar, ajudar)
Uma das estratégias mais simples e eficazes para ensinar educação financeira aos filhos é a técnica dos três mealheiros. Cada um tem uma função: um para gastar, outro para poupar e um terceiro para ajudar os outros.
O mealheiro para gastar é para despesas do dia a dia. O objetivo é dar liberdade com responsabilidade. Porém, é aqui que os mais novos devem aplicar 50% do seu dinheiro.
Já o mealheiro para poupar serve para objetivos maiores, como um jogo caro ou uma viagem. Neste mealheiro, a criança deve aplicar 40% do valor que tem disponível.
O terceiro mealheiro, dedicado a ajudar, incentiva valores como solidariedade e empatia. Pode ser usado para contribuir numa causa, comprar algo para quem precisa ou participar em ações comunitárias. Logo, no mínimo, a criança deve aplicar 10% daquilo que recebe.
Esta divisão ensina equilíbrio, planeamento e valores.
Como deve evoluir a mesada ao longo dos anos?
A mesada deve acompanhar o crescimento e a maturidade da criança. Nos primeiros anos, o foco está em introduzir o conceito. Depois, à medida que surgem novas despesas, o valor e a responsabilidade devem aumentar.
A adolescência é uma fase chave. O jovem deve ser envolvido em decisões financeiras mais amplas, como o uso de multibanco, a criação de uma conta bancária e a definição de um orçamento mensal. Isto prepara o terreno para a vida adulta.
A revisão do valor da mesada deve ser feita com diálogo. Avaliar comportamentos, necessidades e capacidades permite ajustar o montante e reforçar a confiança entre pais e filhos. A evolução deve ser gradual, consciente e partilhada.
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Devo dar mais dinheiro se a mesada acabar antes do suposto?
Esta é uma das grandes dúvidas dos pais. A resposta mais recomendada é: não. Se a mesada acabar antes do tempo, é uma oportunidade para ensinar consequências e autocontrolo. Dar mais dinheiro pode passar a mensagem errada.
Claro que há exceções. Um gasto imprevisto, como um transporte de emergência ou um material escolar, pode justificar apoio adicional. Mas isso deve ser sempre justificado e separado da mesada habitual.
Além disso, é essencial equilibrar firmeza com compreensão. A criança deve aprender que, se não gerir bem o dinheiro, terá de esperar. É assim que se desenvolve o verdadeiro sentido de responsabilidade.
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