Cultura e Lazer

As causas e consequências da guerra (nos provérbios)

A guerra tornou-se um assunto do quotidiano para os europeus. No nosso inesgotável rifoneiro, porém, o tema nunca esteve fora de moda.

As consequências humanas (e económicas) de uma guerra são quase imensuráveis para os países envolvidos; cada dia que passa sem a resolução de um conflito aumenta a fatura a pagar. A um nível diferente, à distância de milhares de quilómetros da frente de batalha, Portugal também sofre o impacto da subida dos preços, seja na gasolina, nos bens alimentares ou nas taxas de juro dos créditos habitação.

Mas este não é um texto para avaliar essas perdas, nem sequer um texto que esquece os inúmeros conflitos noutras partes do mundo. A guerra não é um fenómeno desta década do século XXI, e o nosso rifoneiro prova-o: «Por teu Rey pelejaste, tua casa guardaste», relembra-se em Adágios Portugueses reduzidos a Lugares Comuns, obra de 1651, compilada por António Delicado, num ditado que alude à génese de uma nação.

Quem se lixa é o mexilhão

Infelizmente, não tem sido preciso muito para começar uma guerra. «A guerra e a ceia, começando se ateia», diz o povo. Aceso o rastilho, vivem-se anos de trevas. «Guerra, peste e carestia andam sempre em companhia.» E quem padece mais? «Quando os elefantes lutam, quem sofre é o capim.» Diz-se que «da guerra, o dano vem cedo e tarde o proveito». No durante, sabe-se que «tempo de guerra, mentira na terra» e faz-se uma comparação com outras ditas batalhas: «Guerra, caça e amores, por um prazer cem dores.» Fica por explicar o prazer da guerra… Ou quanto ela durará, já que «guerra começada, só Deus sabe quando acabada».

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Um rol de reis, heróis, cobardes…

Sobre este tema, talvez o provérbio que se provou mais resistente seja aquele a alertar-nos de que «quem vai à guerra, dá e leva». E, como seria de esperar, os homens que vão a combate são vistos sob vários prismas. Tanto temos o «homem casado, nem bom marido nem bom soldado», como o «nem todos que vão à guerra são soldados». Há espaço para cobardes, mártires e espertalhões, seja em «depois da batalha, aparecem os valentes» ou num «mais vale um cobarde vivo que um herói morto». O major Hespanha, no seu Dicionário de Máximas, Adágios e Provérbios, lista que «quem tem medo, não veste armadura». E quais serão os homens de armas que hão de ficar na história? «Os soldados combatem, mas os heróis serão os reis.»

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… e invejas, ambições, pestes e ruína

Se fosse pelos nossos rifões, não haveria discussão sobre culpas no cartório: «A guerra ofensiva é de tirano; o que se defende, é um homem justo». E, se quisermos sentenças diferentes das mais comuns, basta recorrer à Collecçao de Pensamentos, Máximas e Proverbios. Nesta obra de 1847, o conselheiro José Joaquim Rodrigues de Bastos oferece-nos três leituras sobre as causas e as consequências dos conflitos bélicos:

«O ambicioso esquece as inconstâncias da fortuna, e as vicissitudes da guerra.»

«A inveja arrasta atrás de si a magreza da fome, o veneno da peste, e a raiva da guerra.»

«A guerra é um processo, que arruína mesmo aqueles que o ganham.»

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À espera da abundância da paz

Seja por ambições, invejas ou raivas, mesmo que seja verdade o «bem parece a guerra, a quem está longe dela», é desejo comum ver o conflito acabado. Bem queríamos que a escalada tivesse ficado só pelas palavras, já que «quem ameaça sua ira gasta.» Desta vez, contudo, a ira não se gastou pelo palavreado e agora anseia-se por «chegar ao atar das feridas» que, como explica Paulo Perestrello da Câmara na sua Collecçao de Provérbios, Adágios, Rifãos, Anexins, Sentenças Morais e Idiotismos da Lingoa Portugueza, significa o tempo em que o perigo já passou. Acreditemos que «temporal e guerra não duram sempre» e, por isso, um dia chegará a altura de curar mazelas.

Como e quando acabará a guerra? No mundo real, não sabemos. Nos provérbios, «toda a guerra acaba por onde devia começar: a paz.» E, então, talvez possamos olhar para a nossa vida com outros olhos. «Tenhamos saúde e paz, e teremos assaz.»

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Paulo M. Morais cresceu a jogar futebol de rua e a ouvir provérbios ditos pelas avós. Licenciou-se em Comunicação Social e especializou-se nas áreas do cinema, dos videojogos e da gastronomia. É autor de romances e livros de não ficção. Coleciona jogos de tabuleiro e continua a ver muitos filmes. Gosta de cozinhar, olhar o mar, ler.

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