Os ativos dos mercados emergentes estiveram afastados do radar dos investidores nos últimos anos, contrariando a tendência registada nos anos anteriores a meados da década passada, em que os BRIC estavam na moda e geraram retornos muito interessantes, compensando o risco de investir em países como o Brasil, Rússia, China e Índia.
Após uma “travessia no deserto”, sobretudo nos anos mais recentes, os mercados emergentes estão a registar um desempenho muito positivo em 2025 e vários analistas consideram que esta tendência pode representar o início de um período muito favorável para estes ativos. São cada vez mais os bancos globais que estão a recomendar o reforço do investimento nos mercados emergentes, contribuindo para o movimento positivo dos ativos.
Michael Hartnett, reputado analista do Bank of America, prevê um “bull market” (fase sustentada de alta) e diz mesmo que “nada vai funcionar melhor do que as ações dos mercados emergentes” nos próximos anos. O JPMorgan subiu a recomendação dos emergentes para “overweight” (exposição acima da referência), citando uma série de desenvolvimentos promissores em vários destes países. O Morgan Stanley também elevou a recomendação recentemente, embora apontando a ganhos mais contidos.
Desempenho mais fraco nos últimos anos
As moedas e obrigações soberanas dos mercados emergentes acumulam valorizações superiores a 5% em 2025, no melhor desempenho anual desde 2017. A evolução das ações é ainda mais favorável, sobretudo comparando com outros mercados.
O MSCI Emerging Markets (EM), índice que agrega a prestação de mais de mil cotadas de 24 países com economias classificadas de emergentes, está a valorizar mais de 13% este ano, o que contrasta com a subida magra do norte-americano S&P500 (2%) e também supera as ações europeias, que estão a registar um ano muito positivo (Stoxx600 ganha 9% em 2025). O MSCI ACWI, que mede o desempenho das ações mundiais, atingiu máximos históricos nas últimas sessões, mas marca ganhos anuais inferiores aos emergentes (8%).
Nos últimos anos, a tendência tem sido a oposta, com os emergentes a sofrerem quedas mais pronunciadas nos períodos negativos, e valorizações mais contidas nas fases de alta nas ações globais. Tendo em conta os últimos 10 anos, as ações dos emergentes geraram uma valorização média anual pouco acima de 4%, enquanto o retorno das ações globais foi ronda os 10%. Neste período, o MSCI EM valorizou 63%, o que fica muito aquém do ganho acumulado pelo MSCI ACWI (166%).
A franca performance dos emergentes tem sido mais acentuada no pós-pandemia, com as ações destes mercados a registarem um desempenho 40% inferior ao registado pelas cotadas das bolsas de economias desenvolvidas.
Motivos para otimismo
São vários os fatores que justificam a atratividade que está a motivar este regresso dos investidores aos mercados emergentes. Desenvolvimentos internos, mas sobretudo o que se está a passar nos Estados Unidos e o impacto da guerra comercial.
“Sell America”
A política comercial agressiva e errática implementada por Donald Trump assim que chegou à Casa Branca está a abalar a confiança dos investidores no mercado norte-americano, dando lugar a uma redução de exposição aos ativos dos Estados Unidos, que estava em níveis muito elevados. Este movimento, que está a marcar a evolução dos mercados em 2025, beneficia outros destinos para onde estão a fluir os capitais que saem dos Estados Unidos. Os ativos europeus estão entre os destinos de eleição, mas os emergentes também tiram partido desta tendência.
Leia ainda: Os números das contas públicas dos EUA que começam a assustar os investidores
Queda do dólar
O movimento “Sell America” está a atingir de forma mais intensa o dólar, que perde terreno contra a generalidade das divisas mundiais perante a incerteza com a evolução e impacto da guerra comercial na economia norte-americana e política comercial da Fed. O índice do dólar desvaloriza mais de 8% este ano, enquanto o índice que mede o desempenho das divisas dos mercados emergentes avança 6%.
A desvalorização da moeda norte-americana é favorável para os mercados emergentes porque reduz o custo da dívida das empresas e países (geralmente emitida em dólares); aumenta a entrada de capitais nos países à procura de retornos mais elevados; pode tornar as exportações mais competitivas se a queda do dólar for mais intensa do que a valorização das moedas locais; facilita o alívio da política monetária dos bancos centrais, pois retira pressão sobre a inflação (importações mais baratas).
Leia ainda: Dólar em queda face ao euro. O que significa para a sua carteira?
Alívio das tensões comerciais
O índice MSCI EM acumula uma valorização superior a 20% desde os mínimos de 8 de abril, num movimento que reflete o alívio das tensões comerciais após o choque com o “Dia da Libertação”. Trump começou por suspender as tarifas recíprocas por 90 dias e depois chegou a acordo com a China para baixar as taxas alfandegárias aplicadas pelos dois países. Os investidores confiam que o presidente dos Estados Unidos vai fechar acordos com a maioria dos parceiros comerciais, alguns deles com economias emergentes.
Avaliações atrativas e posicionamento baixo
A “travessia do deserto” deixou as ações dos mercados emergentes num nível que é considerado atrativo pelos analistas. As cotadas que integram o MSCI EM transacionam a menos de 12 vezes os lucros estimados para os próximos 12 meses, o que compara com o múltiplo (P/E) acima de 17 vezes do MSCI ACWI. O mau desempenho dos últimos anos também deixou o posicionamento dos investidores em níveis muito reduzidos, o que favorece a continuação da valorização. A exposição atual das carteiras de investimento globais a ações dos emergentes está atualmente em redor de 5%, menos de metade do peso destas cotadas nos índices globais (em redor de 12%).
Cinco emergentes em alta
Apesar de integrar cotadas de 24 países, o rumo do MSCI EM é definido sobretudo por um conjunto restrito de mercados. As cotadas de apenas cinco países têm um peso de 80% no índice. A China surge em destaque (29,1%), com os dois lugares do pódio a serem partilhados pela Índia (18,6%) e Taiwan (18,4%). A Coreia do Sul surge com 9,6% e o Brasil fecha o Top5 com 4,3%.
DeepSeek contraria tarifas
Depois de desvalorizações muito pronunciadas nos primeiros anos da pandemia, as ações chinesas registaram uma poderosa valorização em setembro do ano passado após as autoridades em Pequim terem, finalmente, implementado uma série de estímulos orçamentais e monetários. A evolução positiva prossegue em 2025, com o impacto negativo das tarifas a ser compensado pela expetativa de mais estímulos e o sucesso do DeepSeek, rival do ChatGPT que colocou a China no mapa da Inteligência Artificial.
O Hang Seng, índice que agrupa as empresas chinesas cotadas em Hong Kong, marca uma valorização de 21% em 2025, um dos melhores desempenhos a nível mundial. O CSI 300, índice das empresas cotadas em bolsas na China, regista uma prestação bem mais modesta (2%). A economia chinesa enfrenta vários desafios que afastam muitos investidores deste mercado, como a crise no imobiliário, elevado endividamento e a ameaça da guerra comercial com os Estados Unidos.
Economia impulsiona Índia
O mercado indiano foi um dos principais beneficiados com o afastamento dos investidores das ações chinesas, tirando partido do crescimento económico pujante do país e atração de investimento estrangeiro. O PIB da Índia cresceu 6,5% no ano fiscal terminado em março e os economistas confiam que a expansão vai continuar acima de 6% nos próximos trimestres. O Nifty50, um dos principais índices da Bolsa de Mumbai, acumula ganhos de 5% este ano e 10% em 12 meses. Alguns analistas têm alertado para uma bolha na Bolsa da Índia, alimentada sobretudo pelo forte fluxo de poupança doméstica para o mercado.
Turbulência abranda em Taiwan
A bolsa de Taiwan foi das mais castigadas com as tarifas de Trump, evidenciando a elevada dependência da pequena nação asiática das exportações, em particular de produtos tecnológicos. Em reação às taxas alfandegárias de 32%, o índice TWSE sofreu uma queda diária histórica superior a 10% na sessão de 7 de abril. A moeda do país também registou uma valorização recorde (8% em apenas duas sessões) no início de maio. As autoridades ativaram o fundo de emergência e a turbulência abrandou nas últimas sessões. O TWSE já sobe 30% desde os mínimos de abril, embora o índice ainda conserve um saldo anual negativo (-2,5%).
Estabilidade política na Coreia
O mercado da Coreia do Sul tem sido fortemente afetado pelo caos e instabilidade política depois do anterior presidente ter decretado a lei marcial no país. A vitória de Lee Jae-myung nas eleições do início de junho inverteu esta tendência, com os investidores a confiarem que a nova fase de estabilidade política e as promessas do novo presidente (melhorar o corporate governance das empresas e duplicar o retorno do mercado do país) vão colocar as ações sul-coreanas no radar dos investidores internacionais. O índice Kospi já valoriza 8% em junho, alargando a valorização desde o início do ano para 21%.
Brasil recupera
O mercado brasileiro tem sido dos mais recomendado pelos analistas, considerando que as ações e moeda da maior economia da América Latina estão em níveis atrativos depois da derrocada em 2024. Devido sobretudo aos receios com a indisciplina orçamental do Governo de Lula da Silva, o mercado brasileiro foi fortemente penalizado em 2024, com o real a afundar mais de 20% e a bolsa a recuar mais de 10%. A tendência inverteu-se de forma clara este ano, com a moeda brasileira a recuperar 13% em 2025, enquanto o índice acionista Ibovespa ganha 14%.
Leia ainda: O perigo de tentar adivinhar a direção dos mercados
Como investir
O investimento nos mercados emergentes acarreta um risco acrescido, pois os ativos são mais voláteis e estão expostos a desenvolvimentos políticos e económicos a nível local que podem gerar movimentações extremas nas cotações dos ativos. Para determinar um nível de risco mais reduzido, é essencial diversificar por vários mercados emergentes, mitigando assim o impacto de oscilações mais acentuadas nos ativos de um dos países.
Uma das estratégias mais fáceis para alcançar este objetivo passa por selecionar um fundo de investimento que já contemple essa diversificação em diversos mercados emergentes. Se a opção for de um determinado país, também existem fundos que o permitem. Existe uma gama alargada de ofertas nas gestoras de ativos, internacionais e também nacionais.
A escolha de Exchange Traded Fund (ETF) é uma alternativa popular, pois permite reproduzir na íntegra um desempenho de um índice acionista, que pode ser de um mercado ou setor específico. Por exemplo, existem diversos ETF que replicam o desempenho do índice MSCI Emerging Markets.
A opção de investir diretamente numa carteira de ações de mercados emergentes é uma estratégia mais arriscada e que exige um nível de conhecimento e vigilância superior à aplicação num simples fundo. O risco cambial é outro dos fatores a ter em conta, pois a variação da moeda do ativo pode anular o retorno da ação ou fundo.
Leia ainda: O que considerar na hora de escolher um ETF?